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O CINÉFILO FIEL 5m de leitura

O bom cinema da Coreia não é só 'Parasita'

País do diretor Bong Joon-Ho tem uma poderosa força industrial e artisticamente criativa que se reflete em seus filmes

ATUALIZAÇÃO
19 de fevereiro de 2020

Carlos Eduardo Lourenço Jorge
AUTOR

A Criada, de Park Chan-wook (2016) é um fascinante jogo erótico, na Coreia ocupada pelos japoneses
 

O mundo todo – e isto é literal – continua a ver e falar de “Parasita”, a exemplar e salutar sátira social de Bong Joon-ho, hoje um fenômeno global. Mas “Parasita” não é um oásis e nem uma aparição divina, mas o filme que surge de uma cinematografia de larga tradição histórica, dotada de poderosa força industrial e artisticamente criativa. Nos últimos tempos (e em bem menos tempo que Hollywood levou para forjar sua escrita e suas imagens), os diretores coreanos conseguiram transformar os códigos dos gêneros – o suspense, a ação, o melodrama, o terror – para oferecer um cinema cheio de descobertas visuais e narrativas. Cinema arriscado, estilizado, violento, severo, às vezes estranho, quase sempre feroz em suas críticas sociais. Cinema representado nesta seleção de itens essenciais, nesta amostra com 10 títulos de filmes que precisam ser conhecidos por quem curtiu “Parasita”.

 1 – A Criada, de Kim Ki-young (1960). Influência direta de Bong Joon-ho no momento de elaborar “Parasita” e obra seminal do cinema coreano antes deste século. Professor de meia idade contrata jovem para ajudar sua mulher grávida, e termina por se envolver com ela. Thriller claustrofóbico e asfixiante, considerado por Martin Scorsese como um dos melhores filmes da história do cinema.

2 – Oldboy*, de Park Chan-wook (2003). Talvez a maior influência na renovação ultrassofisticada do thriller de ação, nos últimos tempos. Violenta, insana (às vezes poética), recheada de achados formais e recursos estilísticos de fato impressionantes. Alguns planos-sequência se tornam míticos. Segunda parte da chamada “trilogia da vingança”.

3 – Memórias de um Assassino*, de Bong Joon-ho (2003). Nos anos hediondos da ditadura coreana, um serial killer é caçado por dois policiais antiéticos. Joon-ho foge das convenções do thriller e se mostra com rara personalidade criativa.

4 – Duas Irmãs, de Kim Jee-woon (2003). Brilhante reação do horror coreano no momento em que o cinema japonês parecia monopolizar o gênero, à frente com “Kairo”, “O Chamado”, “Água Negra”. História de fantasmas como reflexão sobre o passado e a culpa filtrados por elementos de fábula macabra.

5 – Primavera, Verão, Outono, Inverno*, de Kim Ki-duk (2003). Durante muito tempo Ki-duk foi o único coreano a ter visibilidade e prestígio no Brasil. Lírico e belo, o filme contava o ciclo da vida através das quatro estações preciosistas e exóticas. Espiritualidade envolvida por delicado cromatismo.

6 – O Hospedeiro*, de Bong Joon-ho (2006). Bem antes de “Parasita”, o diretor já havia combinado com muito talento o melodrama familiar, humor negro e sátira sociopolítica. Um terrível peixe mutante semeia pânico em Seul. Subversão das regras do cinema de gênero, mescla de comédia e horror contra a inepta burocracia do governo coreano e a presença imperial dos EUA.

7 – Os Invencíveis, de Kim Jee-woon (2008). O diretor de “Duas Irmãs” viaja até a Manchuria dos anos 1930 para oferecer sua homenagem ao western-spaguetti de Sergio Leone.Um recital hiperativo, pura pirotecnia visual.

8 – Certo Agora, Errado Antes, de Hong Sang-Soo (2015). É difícil eleger um entre tantos bons filmes do diretor. Sua técnica de narração é sempre a mesma, brilhante : o relato de uma mesma história em duas partes antagônicas mas complementares. Tudo sempre muito puro, delicado e melancólico.

9 – Invasão Zumbi*, de Yeon Sang-ho (2016). O apocalipse zumbi, viajando em velocidade máxima no trem-bala coreano. Frenético por sua inventiva visual, um blockbuster com vários vagões carregados de crítica social. Há uma prequela animada, “Seul Station”, do mesmo Sang-ho.

10 – Eu Vi o Diabo, de Kim Jee-Woon (2010). Mais uma vez a sublimação do cinema de vingança à coreana. Serial killer feroz frente a um policial ensandecido pela morte violenta da esposa grávida. Viagem ao inferno da desumanização. Não aconselhável para estômagos sensíveis (ou insensíveis).

11 – A Criada*, de Park Chan-wook (2016). Nada ver com o clássico homônimo que encabeça esta lista. É um fascinante jogo erótico, na Coreia ocupada pelos japoneses. Um quebra-cabeças sexual, uma trama de traições e enganos. A mesma história de dois pontos de vista, opostos. Sensual e elegante e perturbadora , filme com autêntica marca autoral.

Em Chamas, de Lee Chang-dong (2018): baseado em conto de Haruki Murakami, é um monumental afresco social temperado por reflexão sobre a natureza humana 
 

12 – Em Chamas*, de Lee Chang-dong (2018). Baseado em conto de Haruki Murakami, é um monumental afresco social contado à maneira de thriller magnético temperado por melancólica reflexão sobre a natureza humana. Cenas de grande intensidade dramática e belas composições cromáticas.

(Os títulos assinalados com asterisco foram lançados comercialmente em Londrina pelo Cine Com-Tour/UEL)

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