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AOS DOMINGOS PELLEGRINI 5m de leitura

Tostão por tostão

ATUALIZAÇÃO
16 de janeiro de 2022

Domingos Pellegrini
AUTOR

Com quinze anos, encarei meu primeiro trabalho remunerado na vida, em pastelaria numa feira comercial e industrial, entre desde móveis a tratores. A pastelaria era num box com divisória, na frente o balcão e no fundo a cozinha, e, quando a feira encheu de gente, conheci meu primeiro suor de trabalho. Depois de semana vendendo pastéis e refris, peguei meu primeiro dinheiro suado, a maior bolada até então nas minhas mãos, e gastei tudo rapidinho numa barraca de roleta. Comecei ganhando algumas rodadas e, quando comecei a perder, continuei a jogar crendo que ia voltar a ganhar, ainda desconhecendo que jogos de azar são chamados assim porque a maioria das chances de ganhar são sempre a favor da banca.

No dia seguinte, meu pai perguntou o que eu ia fazer com meu primeiro dinheiro, contei o que já tinha feito e ele riu dizendo que, se eu aprendesse com aquilo, já estaria bem pago. Eu já tinha a altura de hoje, mas então cresci por dentro, descobrindo que não basta ganhar dinheiro, há que cuidar do que se ganha.

Eu já começara a ser educado financeiramente por Vó Tiana, que tinha um pé-de-meia, uma meia solteira onde enfiava moedas e escondia no seu quarto. Quando, com o vô ausente, era preciso um dinheirinho de repente, ela entrava no quarto fechando a porta, voltava com o pequeno pé-de-meia que porém mostrava então toda sua importância.

Mas Vó Tiana foi para aquele país sem dinheiro, e aos doze anos passei a ser deseducado por mesada dada pela mãe. A primeira mesada gastei em doces e sorvetes em dois dias, e depois continuaria a tratar dinheiro como coisa que passa pelas mãos para conseguir as coisas do momento. Ganhava fácil, gastava fácil. Só fui sentir a dorzinha pelo dinheiro saindo de mim quando na pastelaria trabalhei para ganhar.

Quando meu romance juvenil A Árvore Que Dava Dinheiro, foi publicado em 1981, ninguém falava e quase nada se lia sobre educação financeira, que hoje é disciplina escolar. Na net muita gente diz o que fazer com nosso dinheiro, há mestres aos montes e muita gente gastando tempo a apreender tanto e nada colocar em prática. Gastam tempo porque, sem praticar, nada perdem mas sempre também nada ganham (embora mantendo assim uma relação com educação financeira, como os tantos que se dedicam à jardinagem e floricultura virtualmente, caçando e repostando fotos e informações de um imenso jardim inexistente. Ecologistas então, há milhões que não se perguntam sobre o que fazer com o próprio lixo mas assinam abaixo-assinados pelo mundo e se acham militantes.)

Se só a prática nos faz crescer por dentro, para assim fazermos sempre melhor, é evidência de que os humanos vivem evolução constante, basta ver que os castores fazem sua casa do mesmo jeito há milhões de anos e nós temos desde casebres e palafitas até edifícios como os de Dubai, enquanto adolescentes podem investir e gerir seu dinheirinho pela internet. O porquinho das moedas vai virar bitcoins na evolução financeira, tostão por tostão.

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Os artigos publicados não refletem, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina. 

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