| |

AOS DOMINGOS PELLEGRINI 5m de leitura

Beatles para sempre ou, como dizem, “Beatles four ever”

Os Beatles entraram na minha vida com terninhos e cabelos curtos, e se transformaram num quádruplo símbolo de transformação

ATUALIZAÇÃO
11 de fevereiro de 2022

Domingos Pellegrini
AUTOR

Eu estava na minha escrivaninha, metralhando meu presente de quinze anos, uma máquina de escrever Olivetti, quando o rádio anunciou a música dos Beatles em primeiro lugar nas paradas em todo o mundo, "I Wanna Hold Your Hand", e pela primeira vez ouvi as vozes de John e Paul, a guitarra de George e a bateria de Ringo.

Eu já ouvia Elvis na vitrola, onde meus discos de rock, samba e baião, misturavam-se com discos de bolero de minha mãe. Amava Little Richard e seus rocks sempre nas alturas, que ouvia dançando na sala fechada, mas agora, no rádio do quarto, era a primeira vez que parava de escrever para dançar.

Os Beatles entraram na minha vida com terninhos e cabelos curtos, e se transformaram num quádruplo símbolo de transformação, as roupas e os cabelos sempre mudando conforme as mudanças de ideias e atitudes. Depois, quando os egos desfizeram o conjunto, continuaram mudando com carreiras extraordinárias.

A polêmica sobre se Yoko causou ou não a separação do conjunto sempre me pareceu uma bobagem, como se John fosse um menino aliciável e dirigível. Transformado em mito, ele deixou muitas preciosidades, como o disco Double Fantasy, em parceria com Yoko, cada um cantando uma faixa, já no título Dupla Fantasia anunciando, em 1980, a meta de homens e mulheres serem companheiros de cama, de casa, de vida e de crenças. Como Sartre e Simone foram antes para os intelectuais, John e Yoko foram símbolos de ação e transformação para casais.

Paul continuou lançando discos primorosos, e, pelo jeito, pode chegar aos noventa ainda dando shows pelo mundo. George foi o que mais se transformou e, além de nos deixar músicas notáveis, foi elegante até na morte. E o baterista Ringo transformou-se em homem show!

.
 

Os Beatles simbolizam também a transformação tecnológica do mundo, que já vinha se desenvolvendo com o rádio, a tevê e os satélites, pois foram os primeiros a ter canções conhecidas em todo o mundo.

Os beatlemaníacos aguardavam cada novo disco deles para ouvir incontáveis vezes, traduzindo as letras e curtindo as novidades, já que os Beatles estavam sempre se transformando com arranjos dos mais brejeiros aos mais monumentais.

Cada disco era assim um convite para ousar e inovar, e talvez por isso também o conjunto tenha se dissolvido: ficava difícil melhorar.

“Quando eu ficar velho, perdendo os cabelos” cantavam eles, e nesse meio tempo nós todos envelhecemos, a música deles não.

Mas podemos viajar no tempo a qualquer momento, clicando Beatles para tocar, com a facilidade de hoje, e botando a velha carcaça para dançar. Não com aquele corpo de meio século atrás, mas com a alma de novo jovem e deslumbrada com a capacidade humana de produzir arte, alegria e emoção.

Como dizia um amigo pessimista com quem eu ia ouvir discos na garagem de casa:

- Vou ouvir os Beatles até morrer.

Ao que outro amigo otimista replicava:

- Eu vou ouvir enquanto estiver vivo.

Ou, conforme o surrado trocadilho “Beatles four ever”, os Beatles são para sempre. E obrigado, mãe, por aquela vitrola.

...

A opinião do colunista não reflete, necessariamente, a da Folha de Londrina

...

Receba nossas notícias direto no seu celular! Envie também suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link wa.me/message/6WMTNSJARGMLL1.

PUBLICAÇÕES RELACIONADAS