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CÉLIA MUSILLI 5m de leitura

A imprensa como mediadora de conflitos

ATUALIZAÇÃO
28 de março de 2021

Celia Musilli - Grupo Folha
AUTOR

Vivemos num mundo conflituoso. Causas, grupos, partidos entram em conflito somando as divergências relacionadas a questões raciais, de gênero, de religião, de minorias, de grupos identitários, de costumes. Na realidade há um arco de  ideias e impulsos que vão desde sérias questões de justiça social  à reivindicação de quem quer abolir o cafezinho. Para quem observa esses movimentos, incluindo jornalistas pautados para o debate, como os colunistas, a realidade está longe de ser um jardim florido.

Numa mesma edição, podemos encontrar progressistas e conservadores, feministas e machistas, bolsonaristas e lulistas, veganos e carnívoros,  católicos e presbiterianos, céticos e espíritas, atletas e ociosos sem que nenhuma dessas partes represente a totalidade editorial. Embora os leitores consumam nacos de notícias de acordo com seus interesses, a pauta é ampla. Quando um tema  causa polêmicas - até pelo equivocado ou o politicamente incorreto -  fatalmente haverá críticas. Mas nada é permanente ou absoluto  numa atividade que se pauta pela diversidade da própria realidade. Não fosse assim, todos usaríamos os mesmo argumentos e os mesmos uniformes. A questão que se coloca é o quanto da diversidade que quase todos pregam - até mesmo os segregacionistas - está presente nas práticas? Ou seria o respeito à  diversidade de ideias e também o direto à crítica apenas teoria e não um exercício duro, inclusive de discordância ou tolerância? O debate sempre é melhor que a indiferença.

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Todos os dias, na mesma velocidade com que produzimos notícias, somos cobertos pela próxima onda da crise política, social, cultural ou existencial. Se hoje o grupo A reclama da injustiça cometida em relação a suas propostas, amanhã o grupo B tomará a mesma atitude, às vezes sem que se abra a porta da razão que também se tornou "líquida" num mundo tomado por embates culturais de gênero, raça ou religião  que precisamos compreender sem formar credos nem seitas.

Na imprensa, o direito de cada colunista ou jornalista expressar seu pensamento é tão necessário quanto o direito do leitor se manifestar sobre aquela pauta, desde que os argumentos, de ambas as partes, não sejam guiados pela agressão pessoal, mas pelo debate de ideias. Por princípio, nenhum jornalista deve sofrer censura prévia como às vezes quer quem traz a questão: "mas por que vocês publicaram isso?"  Publicamos para manter a pluralidade de opinião, com a possibilidade, inclusive, de criar conflitos que façam o mundo  girar e a sociedade evoluir, nem que seja aos trancos, para não nos transformamos em amebas  resguardadas por medo da exposição. Ou ainda, nos tornarmos sujeitos que só podem escrever sobre carneirinhos e flores. 

O jornalismo nunca será uma atividade morna a menos que já esteja morto. É sua premissa aquecer o pensamento com a possibilidade de incendiar o debate porque a imprensa é também uma mediadora de ideias e conflitos.  A sociedade só se transforma quando encara suas feridas, por mais feias que sejam. É isso ou acabaremos todos anestesiados "lendo" emojis nas redes sociais.

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Os artigos publicados não refletem necessariamente a opinião da Folha de Londrina que os reproduz no exercício de sua atividade jornalística e diante da liberdade de expressão que lhes são inerentes.

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