Quando voltei para Londrina, depois de viver seis anos entre Campinas e São Paulo, andava pelas ruas da cidade como se a tomasse de novo.

Londrina, na verdade, nunca esteve fora de mim, levei-a para onde fui, muitas vezes sentindo-me estrangeira onde estava.

Um das coisas que me deu a sensação de pertencimento quando voltei foi o cheiro da cidade, uma sensação que me tomou quando estava na

rua Pará e notei que alguém estava assando um bolo. Continuei andando e, quando cheguei à rua Pernambuco, senti também o cheiro

de feijão refogado no alho e foi como se o almoço de muitas gerações entrasse pelo meu nariz, me levando também à infância.

Gosto de pensar na cidade nos seus primeiros anos. Fico imaginando os homens e mulheres - entre eles meus pais - que chegaram aqui

carregando sonhos que se ergueram aos poucos em construções que hoje vejo da janela do sexto andar. É neste espaço que a saudade

também toma forma quando olho a peroba do Bosque que abriga ninhos, como se as décadas nunca tivessem passado. Mas, olhando para

baixo, percebo que muita coisa passou, com a velocidade dos carros nos quais os passageiros, preocupados com o dia a dia, não pensam em

ninhos, perobas ou urubus.

Já escrevi sobre os cheiros de Londrina. Da mistura das floradas das árvores em estações distintas às ruas que cheiram à comida. Cada lugar

tem uma memória sensorial que nunca esquecemos quando nele passamos dias de felicidade.

Foi por isso que guardei de São Paulo o cheiro da Casa das Rosas, espaço cultural que tem sim um jardim de rosas, mas com a qual me

liguei pelo cheiro de umidade do velho casarão combinado com perfume de sabonete.

Descobri que a saudade é mais que um sentimento difícil de descrever. O que dizemos nunca se equipara ao que sentimos quando uma coisa

acontece subitamente, nos remetendo de volta ao que faz parte da nossa trajetória no mundo. Coisas tão intensas que flagramos

sensorialmente, pelo olhar, tato, cheiro ou som.

Da minha cidade natal, Cornélio Procópio, aqui mesmo no norte do Paraná, guardo o som dos vendedores que passavam em camionetes

vendendo frutas, chamando as pessoas para comprar mexericas ou abacates. É também da rua da minha infância que vem a voz de um

espanhol que vendia ovos de porta em porta, gritando para que todos comprassem “los huevos”. Lembro-me também do barulho constante

de serra que vinha da casa da família Ranciaro, que cortava e aplainava tábuas para a construção de móveis.

Saudade também é um sentimento que nos faz olhar para uma direção e sentir de novo seus cheiros, ouvir seus sons, penso que se um dia me

mudar daqui continuarei olhando para Londrina. A saudade é um horizonte no qual passado e presente se encontram.

*Texto publicado originalmente em 25 de julho de 2020.