| |

Opinião 5m de leitura

ESPAÇO ABERTO: Laudate Deum a nova encíclica do papa

“O mundo que nos acolhe está desmoronando e pode estar se aproximando de um ponto de ruptura”!

ATUALIZAÇÃO
18 de outubro de 2023

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos
AUTOR

Escrevo este artigo no dia de S. Francisco de Assis, o santo medievo que ficou conhecido pela sua harmonia com o meio ambiente e com a criação em geral. Alguém que de forma claramente precoce defendeu que o ser humano não veio ao mundo como “estranho à criação” para destruí-la a seu belo prazer! Pois bem. Foi exatamente a data escolhida pelo Papa Francisco para lançar a segunda parte da sua encíclica Laudate Si, desta vez com o título de Laudate Deum (Deus seja louvado).

Um documento lançado a apenas alguns dias da COP 28 em Dubai e isso, evidentemente, não é por acaso! O papa apela, clama, exige dos líderes mundiais que o escutem sobre uma dilacerante realidade: “O mundo que nos acolhe está desmoronando e pode estar se aproximando de um ponto de ruptura”! Não se trata mais de “negar”, “esconder”, “ocultar” ou “relativizar” os sinais da mudança climática: eles estão aí, cada vez mais evidentes!

O documento é repleto de dados científicos para combater o negacionismo, que segundo Francisco também existe lamentavelmente dentro da Igreja. Em seis capítulos e setenta e três parágrafos, o papa de quase 87 anos emite um grito de alerta que “poderá ser o último” sobre este assunto! Por dois motivos óbvios: a sua idade e o estágio avançado da destruição do planeta com a mudança climática em curso! Ao afirmar que a mudança nas temperaturas médias da superfície não pode ser explicada sem o efeito do aumento dos gases de efeito estufa, o autor da encíclica é perentório em combater os que ainda se escusam a aceitar a dilacerante realidade.

Mas Francisco vai mais longe! Muito mais! Com sua autoridade existencial, que lhe advém de uma vida de opção pelos mais fracos, ele fala: “A culpa não é dos pobres! uma reduzida percentagem mais rica do planeta polui mais do que o 50% mais pobre"! A questão, segundo o papa, não é os mais pobres terem em geral muitos filhos! Essa é uma visão perversa e equivocada, que tem levado à mutilação de mulheres nos países menos desenvolvidos. Também não é verídica a tese de que a diminuição do uso dos combustíveis fósseis geraria uma terrível onda de desemprego! Com certa ironia, o ppa diz que milhões perdem, sim, o emprego, devido à mudança climática!

E mais! A mudança para o uso de energias renováveis geraria muitos postos de trabalho! O profetismo costumeiro de Francisco também não se faz esperar: “Infelizmente, a crise climática não é propriamente uma questão que interesse às grandes potências econômicas, preocupadas em obter o maior lucro ao menor custo e no mais curto espaço de tempo possíveis”, dispara ele!

A encíclica é riquíssima ao abordar as causas desta “tragédia humana” e ao apontar caminhos. O homem não é um fim em si mesmo. Não é o “rei da criação” e não pode confiar no desenvolvimento tecnológico como único parâmetro de “bem”! O papa explica o que consistiria esse paradigma tecnocrata: “consiste, substancialmente, em pensar como se a realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da tecnologia e da economia”! De fato, Francisco lembra que nunca a humanidade teve tanto poder sobre si mesma, mas parece que não o está usando para o bem!

Ao denunciar a decadência ética do poder, o Santo Padre afirma: “ela é disfarçada pelo marketing e pela informação falsa, mecanismos úteis nas mãos de quem tem maiores recursos para influenciar a opinião pública através deles". E o pior! Segundo o papa, podemos notar como às vezes os próprios pobres, confundidos e encantados perante as promessas de tantos falsos profetas, caem no engano de um mundo que não é construído para eles! Nenhuma novidade, haja vista como projetos de extrema direita grassando pelo mundo tornam os pobres apoiadores de ideias que em última análise conspiram contra eles! Francisco é enérgico ao denunciar no número 32: “Há um domínio daqueles que nasceram com melhores condições de progresso"!

Este espaço é pequeno para um documento desta densidade! Recomendo a leitura.

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese de Londrina

Os artigos, cartas e comentários publicados não refletem, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina, que os reproduz em exercício da sua atividade jornalística e diante da liberdade de expressão e comunicação que lhes são inerentes.

COMO PARTICIPAR| Os artigos devem conter dados do autor e ter no máximo 3.800 caracteres e no mínimo 1.500 caracteres. As cartas devem ter no máximo 700 caracteres e vir acompanhadas de nome completo, RG, endereço, cidade, telefone e profissão ou ocupação.| As opiniões poderão ser resumidas pelo jornal. | ENVIE PARA opiniao@folhadelondrina.com.br        

Esse conteúdo é restrito para assinantes...
Faça seu login clicando aqui.
Assine clicando aqui.

PUBLICAÇÕES RELACIONADAS