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Opinião 5m de leitura

ESPAÇO ABERTO - O Brasil e a Índia!

ATUALIZAÇÃO
14 de maio de 2021

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos
AUTOR

A Índia vive hoje o mesmo inferno astral que há meses tomou posse do Brasil. No dia em que escrevo, ela foi responsável por 27% das mortes de Covid no mundo. Vinte milhões de casos confirmados no país. Em nossas terras, são mais de 15 milhões contagiados. Haverá alguma relação entre estes dois países do BRICs?

Pessoalmente, não creio em meras coincidências. O atual líder indiano Narendra Modi, merece, ainda que singela, uma apresentação. Segundo o escritor e jornalista Kapil Komireddi, não haverá culto de personalidade no mundo democrático que rivalize com o deste senhor!

Auto intitula-se o pai da “nova índia”, mudando inclusive nomes de estádios, e atribuindo-lhe o seu próprio. Apresentando-se como o líder que salvaria a Índia da burocracia e de um Estado que sufocava a iniciativa privada e o desenvolvimento econômico, Narendra Modi preparou a sua eleição para chefe do Governo, em 2014, com uma década de governança no Estado de Gujarat, no Noroeste do país junto à fronteira com o Paquistão.

Logo no seu primeiro ano de mandato, ficou marcado pela forma como sufocou os motins de 2002, que fizeram mais de mil mortos em três dias, a esmagadora maioria era muçulmana. Entre esse episódio e os anos que antecederam a sua primeira eleição como primeiro-ministro, Modi foi alvo de condenação internacional, sendo proibido de entrar nos EUA, no Reino Unido e na União Europeia.

No ano em que comemora o seu sétimo aniversário no poder, recebeu uma péssima notícia. Aliás, duas! No ranking do instituto sueco V-Dem, a Índia deixava a companhia das democracias liberais e deslizava para o grupo das autocracias eleitorais — em grande parte, segundo a organização sueca, graças ao culto da personalidade à volta de Modi e à centralização do poder na sua figura em menos de uma década.

Nos EUA, a Freedom House tirou a Índia da coluna das “democracias livres” e passou-a para a das “democracias parcialmente livres, deixando o país numa posição entre o Equador e a Albânia. O país é o campeão dos paradoxos. Cerca de 200 milhões não têm acesso à energia elétrica e, contudo, há 30 startups valorizadas em um bilhão de dólares, número superado apenas pelos EUA e a China.

Do lado de cá, um presidente alçado ao poder com um discurso análogo. Vinte e sete anos de parlamento numa atuação nula, vendendo a falácia agora exposta de “um novo país, livre da velha política”. Hoje, é acusado internacionalmente de ataques à democracia, aos direitos humanos, ao meio ambiente e portador de um negacionismo científico que o torna perigoso à humanidade.

Organismos internacionais são unanimes em classificar a nossa democracia em estado de decadência. Brasil e Índia detêm, hoje, não somente o recorde de mortes diárias e casos de covid ativos, mas o troféu ignóbil de nações comandadas pela extrema direita, gerando apreensão mundial.

Bolsonaro acabou de elogiar a matança na favela do Jacarezinho. Os dois países erraram feio na condução da pandemia. Faltou oxigênio em Manaus e faltou em Dehli. Lá como cá, médicos tiveram que decidir quem viveria ou morreria! O que teria afinal acontecido? A resposta é clara: um relaxamento nas medidas de prevenção, surgimento de novas variantes do vírus e erros na estratégia de vacinação. Quem está no comando deve assumir as responsabilidades.

Não existem coincidências. Dois homens, duas performances administrativas similares, duas tragédias idênticas. A pandemia nos ensinará muita coisa no futuro, mas no presente, já nos vai mostrando como existem maneiras inteligentes e adequadas de lidar com o vírus e outras que se encaixam no mórbido conceito da necropolítica.

O Brasil e a Índia serão casos de estudo de negligência, omissão, prepotência, falta de liderança e equívocos vários. O Butantan e a Fiocruz nos configuram no grupo seleto de nações desenvolvidas. Porém, a dependência de insumos chineses e as agressões constantes do presidente e de seus filhos a esse país nos impedem de demonstrar o esmero e a classe do nosso Plano Nacional de Imunização. Eis nossas contradições!

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese de Londrina

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