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Sylvio do Amaral Schreiner - Mundo Vivo 5m de leitura

Sabedoria para amaciar o que nos dói

Cultivar a mente é uma das melhores formas de ficarmos sempre mais fortes e preparados perante os percalços da vida

ATUALIZAÇÃO
19 de agosto de 2019

Sylvio do Amaral Schreiner
AUTOR

“Um mestre, próximo de se aposentar, precisava de um sucessor. Entre seus discípulos, dois haviam dado mostras de que eram aptos, mas para escolher entre eles o mestre lançou um desafio para colocar a sabedoria dos dois à prova. Ambos receberam alguns grãos de feijão que deveriam colocar dentro dos sapatos, para então empreenderem a subida de uma grande montanha. Dia e hora marcados, começa a prova. Nos primeiros quilômetros, um dos discípulos começou a mancar. No meio da subida, parou e tirou os sapatos. As bolhas em seus pés sangravam, causando dor. Ficou para trás, observando seu oponente sumir de vista. Prova encerrada, todos voltam ao pé da montanha para festejar. O derrotado aproxima-se e pergunta ao vencedor como é que ele havia conseguido subir e descer com os feijões nos sapatos:

- Antes de colocá-los no sapato, eu os cozinhei - foi a resposta.”

Este conto popular, cuja autoria desconheço, carrega uma verdade importante para compreendermos melhor a nossa natureza. Com ele aprendemos como temos uma grande responsabilidade pela nossa vida. Muitas pessoas se eximem dessa responsabilidade e projetam sua felicidade ou infelicidade nos acontecimentos do mundo externo e se esquecem de dar valor ao modo como vivem. Problemas todos nós temos, mas é preciso que possamos lidar com eles de uma forma mais sábia, a fim de não ficarmos machucados.

Como lidamos com nossos problemas? Queremos de todas as formas nos livrar deles o quanto antes. Querer se livrar dos problemas é humano e compreensível, mas, infelizmente, as coisas não funcionam assim. Não se livra de um problema, mas há a chance de conseguir “cozinhá-los”, ou seja, pensar sobre eles, elaborá-los e dar a eles um fim mais realista. Isto é assumir a responsabilidade pela própria vida e se tornar mais forte que os problemas. Assim, você poderá “pisar” sobre eles problemas sem se machucar.

Por isso cultivar a mente é uma das melhores formas de ficarmos sempre mais fortes e preparados perante os percalços da vida. Aliás, a cura na psicanálise tem a ver com isso. O verbo curar vem do latim curare que quer dizer “cuidar, dar atenção”. Então, a cura se realiza quando damos atenção a algo e passamos a cuidar desse algo. A cura não é milagrosa. Não vem do nada, de repente, mas é um processo que se dá ao passarmos a olhar com mais atenção para aquilo que nos dói. Tal como um curador de um museu. Ele é um cuidador das obras de artes. Se a gente olhar para nossa mente como um grande bem a ser cuidado podemos então a passar a ser curadores de nossos recursos internos.

Que possamos todos aprender a cuidar de nossos problemas com mais acolhimento e discernimento, sem sentir a necessidade de jogá-los longe o mais depressa possível. O mais importante é aprender a lidar com eles para que fiquem “amaciados”. Realizando este processo nos tornamos maduros e sempre estaremos mais preparados para vivenciar a vida com muito mais qualidade e prazer.

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