Desde o início da pandemia de Covid-19 os idosos sempre fizeram parte do grupo de risco da doença. Cuidados redobrados e, principalmente, isolamento tiveram que ser adotados para evitar contaminações. Longe do convívio social e com a rotina restrita, a saúde mental de parte deste público foi afetada. “Ficamos meio depressivos, ansiosos. Queríamos sair e não podíamos”, comenta Angela Sciscioli Cabral, que mora em Londrina com o esposo, Vicente Janeiro Cabral, 84.

Um estudo conduzido por pesquisadores da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná) - câmpus Londrina buscou entender a saúde mental da terceira idade na pandemia a partir de relatos como o da dona Angela. Participaram da pesquisa – que fez parte de trabalho de conclusão de curso de duas alunas de medicina – 50 idosos entre 60 e 89 anos que frequentam o ambulatório de geriatria da instituição e a Policlínica Municipal.

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Os participantes responderam a um questionário contando o grau de receio com a Covid, o medo de perder a vida pelo vírus e o nível de ansiedade ao ver notícias envolvendo a pandemia. “Usamos duas escalas: de depressão geriátrica e índice geriátrico de ansiedade. São escalas de triagem e não exames diagnósticos. Elas dão indícios de que a pessoa, a partir daí, precisa de uma investigação maior”, explica a médica geriatra Lindsey Mitie Nakakogue, que comandou o estudo com o professor Carlos Eduardo Coral de Oliveira e as estudantes de graduação Maria Victoria Barbetta Itimura e Gabriela Nagem de Aragão.

O levantamento apontou que 36% dos idosos tiveram escalas de depressão e ansiedade alteradas, sendo que 24% atribuíram a piora ou aparecimento dos sintomas depressivos e ansiosos com o isolamento social. “Esperávamos muito mais levando em conta outros estudos”, indica Nakakogue. “Apesar de o grupo ter sido pequeno, os idosos, em sua maioria, tem no máximo o ensino primário completo, renda de até um salário mínimo e entre 70 e 79 anos. Ou seja, uma característica da população idosa do Brasil”, completa.

Para a geriatra, a própria experiência de vida pode ajudar a explicar esse número. “Essa geração de idosos sofreu com período de pós-guerra, trabalhou em situações exaustivas, passava fome. Teve uma série de situações que os deixaram resilientes”, reflete.

TECNOLOGIA

O estudo também apontou que 26% dos idosos entrevistados perceberam aumento no uso de tecnologia e 66% diminuíram contato com amigos e familiares. “Os idosos poucos se beneficiaram da tecnologia e isso mostra que precisamos incluí-los digitalmente.” Os resultados da pesquisa foram publicados recentemente na revista científica Research, Society and Development.

No caso da dona Angela, a tecnologia e o telefone foram aliados para conseguir fazer compras e manter o contato com os familiares. “Nos cuidamos e fizemos tudo certinho. Pedimos as compras pelo celular e ligação. Teve aniversário do meu bisneto, que minha neta fez chamada de vídeo e cada um na sua casa. Mas hoje está melhor. Estou recebendo a família em casa, estamos voltando ao normal. Mas quem quer me ver tem que vir aqui”, brinca.

A LONGO PRAZO

Apesar de a pesquisa sinalizar um percentual considerado baixo de idosos com a saúde mental fragilizada na pandemia de Covid-19, a médica Lindsey Mitie Nakakogue acredita que os problemas podem aparecer a médio e longo prazos. “Este período que vivemos vai alterar a memória dos idosos, aumentar os riscos de depressão, estresse e outros sintomas psiquiátricos. Nosso trabalho foi uma fotografia do momento”, ressalta.

A geriatra também chama atenção para os sinais que podem demonstrar quadros depressivos e de ansiedade e que os familiares e cuidadores precisam ficar de olho. “Se o idoso não tiver vontade de fazer as atividades que fazia antes, se está se isolando muito, caso se queixe de tudo, muitas dores. Tudo isso não faz parte do envelhecimento normal.”

Uma qualidade de vida ruim pode fazer com que a pessoa idosa tenha sua expectativa reduzida. “Cada vez mais esperamos viver mais. Então é um desafio dar assistência à saúde e qualidade de vida ao mesmo tempo”, frisa.

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