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Não posso receber essa deputada?, diz Bolsonaro sobre encontro com neta de ministro de Hitler

ATUALIZAÇÃO
29 de julho de 2021

MATEUS VARGAS
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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro minimizou nesta quinta-feira (29) as críticas que recebeu por ter se reunido no Palácio do Planalto, fora da agenda, com a deputada ultradireitista alemã Beatrix von Storch, vice-líder do partido populista AfD (Alternativa para Alemanha) e neta de Lutz Graf Schwerin von Krosigk, ministro das Finanças na Alemanha nazista.

"Não posso receber essa deputada? Foi eleita democraticamente na Alemanha", disse. Ele sugeriu a apoiadores que não sabia do parentesco da deputada e disse que é errado julgar uma pessoa por erros de seus antepassados.

"Semana passada tinha um deputado chileno e uma deputada alemã visitando lá a Presidência. Poxa, tratei, conversei, bati um papo. Vai que a deputada alemã é neta de um ex-ministro do Hitler. Pô, me arrebentaram na imprensa. A gente não pode ligar um pai a um filho. Muitas vezes, né, um fez uma coisa errada, ligar ao outro", disse ele.

As declarações foram divulgadas por uma página bolsonarista no YouTube.

A ultradireitista esteve com Bolsonaro no último dia 22. A reunião com ele não constou na agenda oficial da Presidência, mas Beatrix publicou uma foto do encontro na segunda-feira (26). Na imagem, também aparece o marido da alemã, Sven Von Storch.

"Agora, se eu for ver a ficha de cada um que for atendido, primeiro que vai demorar horas para atender. Igual recebi aqui o deputado Luis Miranda (DEM-DF)", disse Bolsonaro.

Miranda e seu irmão, o servidor do Ministério da Saúde, tiveram reunião com Bolsonaro em 20 de março, quando alertaram o presidente sobre possíveis irregularidades na compra da Covaxin.

Ao publicar a imagem com Bolsonaro, Beatrix afirmou, em um texto, que ficou impressionada com a "clara compreensão" do mandatário brasileiro dos "problemas na Europa e dos desafios políticos" atuais.

"Numa época em que a esquerda está empurrando sua ideologia em nível global através de suas redes e organizações internacionais, nós, conservadores, também precisamos trabalhar mais juntos e defender nossos valores conservadores em nível internacional", disse.

A congressista esteve em Brasília na semana passada. Na ocasião, ela manteve encontros com os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Bia Kicis (PSL-DF), que compartilharam fotos das agendas em suas redes sociais -e foram criticados pelo histórico xenófobo e anti-imigração de Beatrix, que já foi investigada por incitação ao ódio contra muçulmanos.

No mesmo dia do encontro com Bolsonaro, a deputada este com o ministro Marcos Pontes (Ciência, Tecnologia e Inovações). A reunião foi registrada na agenda oficial do ministro e em imagens publicadas no perfil da pasta no Flickr.

O encontro da vice-líder do partido AfD com Bolsonaro foi intermediado pelo deputado estadual por São Paulo Gil Diniz (sem partido), como mostrou a coluna Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo.

Em 2018, a polícia alemã pediu que Beatrix fosse investigada após postagens suas em redes sociais. À época, ela questionou a decisão da polícia da cidade de Colônia de publicar mensagens em árabe, como parte de uma campanha multilíngue.

A parlamentar disse: "O que diabos está acontecendo de errado neste país? (...) Estão querendo agradar os bárbaros, os muçulmanos e essa horda de homens estupradores?". O Twitter e o Facebook removeram as postagens, classificadas de discurso de ódio.

O parentesco e as bandeiras xenofóbicas que ela propõe foram ressaltados nas redes sociais após as publicações de Eduardo Bolsonaro e Kicis.

Em resposta a uma das publicações de Bia Kicis sobre a visita de Beatrix, o Museu do Holocausto relembrou a trajetória da deputada alemã.

"É evidente a preocupação e a inquietude que esta aproximação entre tal figura parlamentar brasileira e Beatrix von Storch representam para os esforços de construção de uma memória coletiva do Holocausto no Brasil e para nossa própria democracia".

O Instituto Brasil-Israel (IBI) emitiu uma nota em repúdio sobre encontro de Bolsonaro com a alemã. "Ao contrário de uma união dos conservadores do mundo para defender os valores cristãos e a família, como sugeriu Bia Kicis, esses encontros estão mais para união de políticos de extrema-direita irrelevantes no cenário global. Um abraço de náufragos", afirma o Instituto Brasil-Israel em nota, que é assinada pelo coordenador-executivo do IBI, Rafael Kruchin.

Abertamente anti-imigração e com um histórico de posturas xenófobas, o partido AfD é o primeiro com representação no Parlamento a ser colocado sob investigação do Escritório Federal de Proteção à Constituição (BfV, na sigla alemã), por suspeita de extremismo e, em último caso, risco à democracia.

O conjunto dos posicionamentos da legenda faz com que a AfD não seja bem vista por grande parte da comunidade internacional. Foram poucos os encontros internacionais da sigla -líderes da legenda já se reuniram com o ditador de Belarus, Aleksandr Lukachenko; com o presidente russo, Vladimir Putin; e com o ditador sírio, Bashar al-Assad, segundo informações do canal alemão Deutsche Welle.

A American Jewish Comittee, organização tida como expoente da comunidade judaica nos Estados Unidos, manifestou preocupação após o encontro. Em suas redes sociais, a AJC escreveu que se junta à Conib (Confederação Israelita do Brasil) ao expressar preocupação com a visita de Beatrix e que a plataforma racista e xenofóbica do AfD não tem lugar no Brasil.

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