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Saúde 5m de leitura

Brasil tem 'explosão' de internações infantis por Covid

Levantamento com dados do Ministério da Saúde aponta que número de crianças menores de 12 anos hospitalizadas saltou de 284 para 2.232

ATUALIZAÇÃO
20 de fevereiro de 2022

Cristiano Martins e Diana Yukari - Folhapress
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São Paulo -  A recente explosão das internações infantis por Covid supera em muito a curva geral de aumento durante a onda associada à variante ômicron no Brasil. Levantamento da Folha com dados do Ministério da Saúde revela que o número de crianças menores de 12 anos hospitalizadas com complicações da doença saltou de 284 em dezembro para 2.232 em janeiro. Uma escalada de 686%.

Desde o início da pandemia, o Brasil ainda não havia visto tantas internações pediátricas por Covid em um só mês. Foram 70% a mais em relação a janeiro do ano passado e 11% acima de março, pico dos atendimentos no país em todas as faixas etárias.

Entre as demais idades, que concentram a maioria da população, a alta de dezembro para janeiro foi proporcionalmente menor, de 395%.

As hospitalizações de adolescentes e adultos subiram de 7.399 para 36,6 mil, puxadas especialmente pelos idosos.

Apesar do aumento expressivo, essa quantidade é bem inferior aos 95,8 mil atendimentos em janeiro do ano passado e aos 228,3 mil registrados em março, no auge da pandemia.

Praticamente uma em cada dez internações por Covid na faixa de 0 a 11 anos no Brasil ocorreu em janeiro de 2022.

FALTA DE COBERTURA VACINAL

Segundo especialistas, a principal explicação é a falta de cobertura vacinal nesse público.

Autorizada em 16 de dezembro pela Anvisa para as crianças de cinco anos ou mais e iniciada oficialmente em 14 de janeiro, a campanha de imunização começou em ritmo lento.

Até segunda-feira (14), data da última atualização dos registros de internações, 28% das crianças elegíveis tinham recebido a primeira dose, de acordo com dados das secretarias estaduais de Saúde coletados pelo consórcio dos veículos de imprensa formado por Folha, UOL, O Globo, G1, O Estado de S. Paulo e Extra.

Entre os brasileiros adultos, 94% estavam protegidos com o primeiro ciclo completo (duas doses ou o imunizante de aplicação única).

"Observamos um aumento impressionante, seguramente relacionado à dinâmica de transmissão. É como uma batalha, em que o vírus quer sobreviver e procura os lugares onde será menos atacado. Hoje, o nicho mais vulnerável são justamente as crianças", explica Raphael Guimarães, pesquisador do Observatório Covid-19 da Fiocruz.

A análise da Folha mostra que a proporção de crianças hospitalizadas cresceu em relação à média geral.

Elas representavam cerca de 1,5% da curva de internações até novembro do ano passado. No fim de janeiro, eram 6%.

O rejuvenescimento da pandemia já havia sido observado pelos cientistas em outras ocasiões. Tampouco é exclusivo do Brasil.

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NOS EUA

Nos Estados Unidos, crianças de nove anos ou menos correspondiam a 5% da média de internações na primeira semana de janeiro. Até maio de 2021, esse índice não havia passado de 2%.

Por lá, a cobertura também era baixa. Um quarto dos menores de 12 anos tinha recebido uma dose, e menos de um quinto, o primeiro ciclo completo. Os dados são do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças).

À medida que a imunidade avança entre os mais velhos, a média de idade dos infectados tende a diminuir, resume Guimarães.

No Brasil, esse movimento ficou bem claro entre maio e julho, após a vacinação dos idosos. A faixa dos 20 aos 59 anos chegou a responder por mais da metade das mortes ao longo de seis semanas consecutivas e por mais de 60% das hospitalizações em UTI (unidade de terapia intensiva) durante dois meses seguidos, conforme relatório da Fiocruz.

O levantamento da Folha aponta queda acentuada na presença dos grupos mais longevos, a partir da vacinação, em relação à média de casos hospitalizados.

Os septuagenários representavam 20% dos internados em janeiro do ano passado, mas somente 7,5% em junho. Entre os sexagenários, a proporção caiu de 24% em maio para 12% em julho, na contramão dos novos picos de atendimentos entre os mais jovens.

Mais recentemente, após a expansão da cobertura vacinal dos adultos, o percentual de idosos voltou a aumentar em relação ao total.

GIGANTESCA MAIORIA

O infectologista pediátrico Marcio Nehab ressalta que a baixa vigilância genômica e o esgotamento dos testes diagnósticos durante a explosão de casos em janeiro limitam análises mais aprofundadas sobre o real impacto da ômicron nesse cenário.

"Hoje, as pessoas não adequadamente vacinadas, sem duas doses ou o reforço, são a gigantesca maioria das que nós internamos. E as crianças fazem parte do grupo de não vacinados. Esse é o principal fator para o aumento absoluto. É um mar de suscetíveis", diz o especialista do IFF (Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira).

Segundo o IBGE, há cerca de 20,5 milhões de brasileiros menores de 12 anos na população.

Antes do início da vacinação infantil, o presidente Jair Bolsonaro (PL) disse que o número de crianças afetadas pela Covid era "insignificante" e criticou a decisão da Anvisa.

O ministro Marcelo Queiroga recorreu ao jargão "a pressão é inimiga da perfeição" ao ser questionado sobre o tema em dezembro.

Até a última atualização dos dados oficiais, a Covid havia provocado ao menos 1.536 óbitos e 25.295 hospitalizações por síndrome respiratória aguda grave (Srag) entre crianças.

Do total das mortes, 125 foram registradas em janeiro deste ano (8%).

Houve também 63 óbitos e 1.160 hospitalizações por síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (SIM-P) apenas no público infantil de 0 a 9 anos.

Os números podem parecer pequenos se comparados às 638,9 mil vidas tiradas pelo coronavírus no Brasil até o momento da análise.

No entanto, segundo nota do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e balanço do próprio Ministério, nenhuma outra doença imunoprevenível causou tantas mortes de crianças no país em 2021 quanto a Covid.

O levantamento da Folha considerou somente as internações por Srag com diagnóstico confirmado para o coronavírus e dadas como encerradas, seja por alta ou óbito.

Foram excluídos registros com evidente erro de preenchimento das idades ou datas de nascimento, bem como das datas de internação, notificação e encerramento.

Por fim, foram desconsideradas as duas semanas mais recentes, a partir da última notificação, para evitar distorções geradas por atrasos na digitalização das fichas –em média, 16 dias.

* Foto: iStock

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