Por séculos, os animais ajudaram o homem, servindo de montaria, carregando cargas no lombo ou em carroças e charretes ou tracionando implementos agrícolas. No Norte do Paraná, o uso do transporte por tração animal constituiu um elemento importante para o desenvolvimento dos municípios da região em um tempo em que não havia estradas asfaltadas e a sua grande versatilidade permitia a adaptação a qualquer tipo de terreno, independentemente de sua topografia e condição do solo. A reportagem da Folha resgata esse período das carroças e charretes e o seu papel para o desenvolvimento da região.

Movimento de charretes na inauguração da Concha Acústica, no centro, em 1957
Movimento de charretes na inauguração da Concha Acústica, no centro, em 1957 | Foto: Osvaldo Leite/Acervo/Museu Histórico de Londrina

Inicialmente, além dos indígenas, o Norte do Paraná era ocupado por caboclos seminômades que utilizavam montarias para o transporte e para a carga, já que não havia estradas carroçáveis. Logo vieram pessoas de Minas Gerais ou de São Paulo, e se estabeleceram onde hoje fica Cambará (Norte Pioneiro), entre 1904 e 1908.

Na região do Patrimônio Três Bocas, os pioneiros a utilizarem carroças e charretes foram as famílias Godoy, Palhano, Durães, Menezes, Bule e Correia, que se estabeleceram entre 1922 e 1928, antes mesmo da chegada da CTNP (Companhia de Terras Norte do Paraná), mas a falta de estradas limitava a sua circulação. Basta dizer que a Expedição Smith, que chegou ao Patrimônio Três Bocas em 21 de agosto de 1929, veio sem uma carroça sequer, porque a mata era fechada.

Há o registro no Projeto Cultural Comunitário (Cuco) de uma entrevista que alunos de escolas municipais e o professor Jorge Cernev, do Departamento de História da UEL (Universidade Estadual de Londrina), fizeram com a pioneira Aida Loureiro de Carvalho, filha de Alberto Loureiro, que integrou a Caravana Smith. O pai dela foi encarregado de abrir dez alqueires de mata e construiu a primeira edificação de Londrina, o Hotel Campestre. No relato, Aida se recorda de sua relação com as charretes, que eram de uso frequente, já que residia em uma propriedade rural onde hoje fica o Jardim Shangri-lá.

“Para vir para a escola, nós tínhamos que vir a pé ou de charrete, porque às vezes as estradas eram terra pura. Não tinha carro naquele tempo, era charrete, andava-se de bicicleta, então, era tudo bem difícil para gente”, relembrou na época.

Outras figuras consolidaram o uso dos veículos de tração animal como os mais populares do município nesse início da colonização. Jacob Bartholomeu Minatti chegou a Londrina em 17 de janeiro de 1931, aos 19 anos de idade, vindo de Assis (SP) e logo adquiriu uma propriedade na esquina das atuais ruas Mato Grosso e Piauí, onde abriu a Officina de Foices Minatti, considerada uma das primeiras oficinas de carroças e charretes do município. No início da década de 50, a fábrica foi transferida para a esquina das atuais ruas Mato Grosso e Santa Catarina.

Em agosto de 1933, Juvenal Corrêa de Farias, natural de Itaí (SP), se estabeleceu em Londrina, na Gleba Palhano (zona sul), e foi um dos primeiros a dedicar-se à construção de carroças e charretes por aqui. No ano seguinte, foi seguido pelo japonês Goro Ooya, que também fabricou veículos de tração animal. Em 1937, Jacintho Tosetti criou a Oficina Paulista, em uma casa de madeira na rua Cambé, 284 (atual Duque de Caxias, 804), e que depois mudou para a rua Goiás, em 1945.

Em 1936, Londrina possuía uma frota de veículos com 99 bicicletas, 60 automóveis, 135 caminhões e seis ônibus - eram, portanto, 201 veículos motorizados. Naquele mesmo ano a cidade tinha 281 carroças. Um ano depois, em 1937, passou a ter 163 bicicletas, 68 automóveis, 148 caminhões e caminhonetes, 15 ônibus e sete motocicletas (238 veículos motorizados). Ao mesmo tempo possuía 474 carroças e 26 charretes (500 veículos de tração animal).

Naquele ano, Frederico Mandt, que veio de São José do Rio Preto (SP), passou a trabalhar como ferreiro na oficina de Tosetti. “Ele foi empregado e aprendeu como fazer carroças e charretes”, relatou o filho de Frederico, o ex-funcionário da Copel, Ernesto Mandt Neto. “Depois, conseguiu dinheiro e montou uma indústria, que se chamava Oficina São José. Lá ele fabricava carroças e charretes e também as carrocerias da Plenogás. A oficina ficava na avenida Duque de Caxias”, relembra.

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