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A incessante luta pela vida

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Fotojornalista da FOLHA relata a exaustiva rotina dos profissionais que atuam na UTI do Hospital Universitário de Londrina

Textos e Fotos Gustavo Carneiro

"Trabalhar em hospital não é pra qualquer um”. Essa é uma frase recorrente entre profissionais da saúde quando falam sobre rotina. No dia 23 de março, passei uma noite com a equipe que fez o plantão na UTI-1 do Hospital Universitário de Londrina. Mas não foi tão simples assim. Passei por avaliações e até por um "minicurso" no CCIH (Comissão de Controle de Infecção Hospitalar), onde fui orientado sobre os cuidados, EPIs (equipamentos de proteção individual) que deveria usar, como usar e como eu deveria me comportar naquele ambiente.

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Durante uma semana me preparei e uma das coisas que mais me preocupava é que eu nunca deveria levar as mãos à cabeça por motivo algum. Quando chegou o momento de entrar, às 19h, fui recebido pela enfermeira responsável que me apresentou para toda a equipe. Fui muito bem recebido, me deixaram muito confortável e com muita liberdade.

Cheguei no momento em que trocavam de turno e a equipe anterior passava todas as informações para a equipe que estava assumindo. Eles passavam paciente por paciente dando relatos detalhados sobre cada um.

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Pouco tempo antes de entrar, eu tinha recebido a notícia de que meu padrinho havia falecido por covid. Foi impossível olhar para os pacientes sem que eu sentisse um carinho fraternal, afinal, minha madrinha se encontrava intubada em outro hospital da cidade.

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A equipe que precedeu se foi e essa que eu iria acompanhar começava com os trabalhos. Como entrei na troca de turno, havia muita conversa, mas logo os relatos sobre os pacientes acabaram e deram lugar ao som da UTI. Eram as máquinas conversando com a equipe e informando o que acontecia com cada paciente.

Os técnicos, as enfermeiras, as fisioterapeutas não paravam. A cada entrada em um dos cômodos com paciente isolado, os aventais, as luvas e toda a proteção era jogada no lixo.

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Quando saiam, começavam a anotar cada procedimento e assim que acabavam de anotar, já era hora de atender outro paciente isolado. Não dava tempo pra nada. Não vi ninguém saindo para tomar um cafezinho ou sequer água.

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Alguns pacientes tomavam mais de nove medicações diferentes, que eram controladas por máquinas programadas pela equipe. Por um breve momento foi possível confundir a equipe com as máquinas. Logo os detalhes da humanidade começaram a aparecer. A equipe começou a suar pela correria, o carinho e humanidade gritavam quando entravam em um isolamento conversando e chamando o paciente pelo nome, mesmo que esse estivesse em coma induzido.

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A única paciente em isolamento que não estava intubada recebeu até cafuné. Durante a noite, um leito vagou. Na enfermaria havia mais de sessenta pessoas esperando uma vaga na UTI. Desci com as fisioterapeutas para buscar o paciente que ocuparia o leito. Quando chegamos na enfermaria, fiquei espantado com o número de pessoas. O escolhido foi um rapaz de trinta e poucos anos. Foi um baque.

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Quando voltamos com o rapaz para a UTI, a equipe se reuniu para transferir o paciente da maca para o leito. Foi uma das cenas mais emocionantes naquela noite. Apesar de exaustos, os humanos da equipe não se cansavam de dar dignidade aos que ali estavam isolados.

Outra pessoa que não parava um segundo se chama Maria. Ela é a responsável pela limpeza de todos os ambientes da UTI. O tempo todo desinfetando as paredes, os vidros, o chão, recolhendo o lixo hospitalar. Um trabalho fundamental e de muita força.

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Medicamentos, seringas, máquinas, aventais, luvas, produtos de limpeza, água, luz, oxigênio, controle de temperatura, ambientes com pressão negativa, salários. Entre inúmeras outras coisas que fogem do meu conhecimento, o custo para manter cada paciente em UTI é altíssimo. Na verdade parece milagre manter UTIs por todo o Brasil com orçamento tão apertado.

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Entre uma conversa e outra com a equipe, foi possível perceber que já existe um certo racionamento para que num futuro próximo não falte nenhum medicamento. A preocupação é real. Me foi relatado que vários passariam a noite naquela UTI e depois iriam para outros hospitais para fazer outro turno. Assim completam a renda familiar.

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Quando o dia começou a amanhecer, todos os pacientes já haviam tomado banho, feito sessão de fisioterapia. Tiveram suas roupas de cama trocadas e estavam lutando pela vida com dignidade e muito amor ao redor. Sim, amor. Apesar de todas as dificuldades, ficou claro que não é possível trabalhar em uma UTI sem amor.

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Enquanto eu escrevo esse texto, recebo uma mensagem da minha irmã dizendo que a minha madrinha também havia falecido. As lágrimas embaralham a minha visão e meus pensamentos. Não consigo mais escrever.

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Uma das coisas que me confortam é acreditar que a equipe que cuidou da minha madrinha foi tão carinhosa quanto essa equipe que acompanhei. Trabalhar em hospital realmente não é para qualquer um. Viva o SUS!

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