A minuta do Código Ambiental de Londrina em elaboração pela Prefeitura tem “diversas ilegalidades, inconsistências e fragilidades”, além de reunir “propostas que caracterizam notório retrocesso e prejuízo à proteção ambiental”. A avaliação consta em uma recomendação administrativa entregue pela promotora Révia de Paula Luna ao titular da Secretaria do Ambiente (Sema) de Londrina, Ronaldo Siena, na última sexta-feira (28). O documento também é dirigido ao prefeito Marcelo Belinati (PP).

De acordo com o ato assinado pela titular da 20ª Promotoria de Justiça de Londrina, há uma “postura reducionista” por parte do Executivo na formulação do texto — que é um dos oito projetos complementares do Plano Diretor e, junto a outras três matérias, tem de ser enviado pela administração à Câmara Municipal de Londrina (CML) até meados de novembro.

Para a promotoria do MP especializada em questões de meio ambiente, a minuta “reduz, de forma significativa, os princípios balizadores da política ambiental municipal”, diminuindo-os de 30 para 10 na comparação com o Código Ambiental hoje em vigor (lei municipal 11.471/2012).

“Uma visão mais sistêmica que utilizamos é que não pode haver retrocesso ambiental [...] A nossa sugestão é que não fique tanto em legislações esparsas. Que a gente faça uma condensação no que for possível”, pediu Luna em entrevista à FOLHA nesta segunda-feira (31).

“Esse é um trabalho preventivo, porque é bom que a gente faça isso bem feito antes para não ter problemas depois [...] Qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade que venha a ter no código pode causar um problema, por exemplo, nos autos de infração a serem feitos pela Sema”, observou a promotora.

‘QUE O CIDADÃO ENTENDA’

Diferentes temas ligados ao Código Ambiental englobam as dezenas de considerações escritas pela promotoria ao longo de 106 páginas. Segundo Luna, são “minúcias e grandes questões”. Vistos como positivos, os códigos ambientais de cidades como Curitiba, Blumenau (SC) e Presidente Kennedy (ES) também inspiraram a iniciativa.

“Foi um estudo bastante aprofundado, mas entendi que valia a pena essa dedicação porque eu quero que qualquer cidadão do povo, quando ler o código, entenda o que está falando”, afirmou a representante do MP.

MUDANÇAS CLIMÁTICAS IGNORADAS

Conforme o MP, as normas defendidas pela Prefeitura “não têm dispositivos destinados à proteção climática, tal como mecanismos de redução da emissão dos gases de efeito estufa e reflorestamento de áreas degradadas”. Ao mesmo tempo, o documento lembra que “logo após a assinatura pelo Estado brasileiro do Acordo de Paris, o município de Londrina assinou o Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e Energia (GcoM)”.

“Tem que haver a compatibilização, inclusive, com as convenções internacionais [...] A questão da mudança climática, a gente tem que ter muito cuidado com isso”, reforçou Luna na entrevista. Crítica semelhante já havia sido levada anteriormente à Sema pela ONG Meio Ambiente Equilibrado (MAE), como a FOLHA noticiou na edição de 26 de junho.

FALTA DE FISCALIZAÇÃO RURAL

A análise da 20ª Promotoria de Justiça ainda sustenta que é “corriqueira, em expedientes remetidos ao Ministério Público, a alegação de que a atribuição para fiscalizar a zona rural do município seria do estado, especialmente do Instituto Água e Terra (IAT), no que se refere às demandas ambientais. A afirmação simplória não encontra amparo jurídico.”

Também há sugestão para incluir dispositivos legais no código que instituam e regulamentem o Pagamento por Serviço Ambiental (PSA). Além disso, são solicitadas novas unidades de conservação (UCs) em Londrina para, entre outros pontos, fomentar o incentivo monetário pela preservação ambiental.

Ainda há pedidos para que seja previsto o reconhecimento dos fundos de vale como áreas de relevante interesse ecológico (ARIEs) e que a Prefeitura “considere as propostas [à minuta] apresentadas pela população e caso as recusem, o façam de forma justificada”.

SEMA TEM 60 DIAS

Procurado pela FOLHA nesta segunda-feira (31), o titular da Sema, Ronaldo Siena, não concedeu entrevista, mas confirmou o recebimento da recomendação administrativa na tarde de sexta-feira. De acordo com o secretário, as sugestões e manifestações estão sendo analisadas pelo órgão. O prazo para resposta é de 60 dias.

Luna comentou já ter tratado do assunto em reuniões da própria secretaria e do Conselho Municipal do Meio Ambiente (Consemma). Ela disse não ter visto resistência de Siena em avaliar o documento, embora tenha estimado que “o município tem que ter um trabalho bem árduo para poder apresentar um bom resultado final”.

“Primeiro eu entrego, depois deixo ir para imprensa. Eu não faço o contrário. Porque gosto de justificar o motivo pelo qual estou fazendo aquilo. A RA [recomendação administrativa] é um bom instrumento de auxílio para determinada área [...] A gente não esgotou a matéria, vai ser objeto de debate”, declarou a promotora.