Me chega agorinha (final de domingo) o passamento do maestro (di tutti maestri) Adyr Sebastião Ferreira, maior Advogado que conheci e amigo extraordinário de horas ordinárias em tempo comum...

Adyr foi/é meu professor desde que aqui cheguei, em julho de 1982, e mais que direito me ensinou o valor do conhecimento. Homem excepcional que devorava livros com a facilidade com que hoje se dá um like em rede social, Adyr esteve muito adiante de seu tempo, por vários motivos...

Aliás, motivo e circunstância não compunham o cotidiano de Adyr, que sempre optou pela entrega cega às próprias paixões e, por isso, foi emocional mais do que racional – ainda que nenhum outro Advogado lhe tenha feito frente na arte de argumentar...

São tantas e nossas as histórias possíveis que o que me vem a memória é a que não morre. Quem me fez um mortal distinto foi Adyr, ao me pronunciar ‘grande Advogado’ – exagero imerecido que devo, até hoje, a seu coração crescido...

Neste contexto, lembro que Adyr sempre me considerou além de qualquer merecimento.

Adyr deixa filhos (Thelma, Neto e Alexandre), uma linda viúva (Íria), netos (não sei exatamente quantos) e muitos amigos cujo convívio repartido com sua mudança para Curitiba não se perdeu na equação tempo e espaço...

Romanista que metaforizou a pena à serviço do estado democrático de direito, tocava piano com a mesma paixão com que se entregou à vida.

Amou, flertou, experimentou. Viveu ontem e hoje sem amanhã. Mas o fez com um apego de contornos civilizacionais meandrando o abandono. Nunca colocou posse adiante de gente....

Em ocasião pretérita onde este pequeno escriba estava procurador jurídico da Câmara Municipal de Londrina, um entendimento jurídico meu lhe mereceu severa crítica...

Tramitavam dois pedidos de impedimento do então alcaide. O mais adiantado foi levado à julgamento na Casa e o alcaide fora cassado. Lavrei entendimento pelo arquivamento do pedido remanescente, entendendo que já não havia mandato a ser impedido...

Ao vivo pelo microfone histórico da Paiquerê, Fernando Brevilheri nos confrontou (respeitosa e democraticamente). Me lembro até hoje do diálogo, que me levou às lágrimas...

Adyr dava os pêsames à Câmara Municipal de Londrina por uma decisão técnica minha e essa crítica me fez chorar, suposto que nunca me vi com o conhecimento jurídico dele – aliás, não conheci ninguém, ao longo de meus trinta anos de Advogado, que lhe fizesse frente neste campo...

Estou seguro (dogmaticamente) até hoje de minha decisão, mas o fantasma de Adyr dando os pêsames à Casa por decisão minha pesa mais que a dor de não ter sido...

O tempo, todavia, nos distanciou mais do que seria de minha vontade, mas a vida é de ser vivida e não lamentada. Fica a saudade e o reconhecimento do extraordinário Advogado e amigo fraterno.

Saibam, entrementes, vocês todos que estão a ler esta despedida, que a arte, quando imita a vida, produz talento e compreensão de destinos exangues ao fardo de bem viver – afinal o gênio está nu e não lhe destaca uma estrela na testa...

No ponto, Adyr foi/é um gênio das ciências jurídicas, desde que pugnou em pretória pela primeira vez. Não teve rival na arte de escrever e argumentar. Um clássico que, por inesgotável, se esgotou...

Você, Adyr, é daqueles sujeitos que a vida fez imprescindível porque traduzia a arte de bem viver dentro das linhas frias da dogmática jurídica e na companhia dos amigos.

Meus sentimentos à Íria, à Thelma, ao Neto, ao Alexandre.

De minha parte fica a saudade do amigo querido que a distância costurada pela vida só fez aumentar – e que hoje é definitiva.

A Advocacia, todavia, está órfã; morreu o seu mais distinto e brilhante filho!

Tristes trópicos....

João dos Santos Gomes Filho, advogado

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