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Opinião 5m de leitura

A deseducação sexual e sua influência danosa

Alerto as escolas de que é preciso conhecer os documentos que dão suporte à Educação Sexual, para não deixar esmorecer a coragem

ATUALIZAÇÃO
19 de abril de 2022

Mary Neide Damico Figueiró
AUTOR

Estamos nos deparando com movimentos reacionários que, lamentavelmente, nos direcionam para uma mentalidade típica da década de 1970, período de censuras e repressões. Desde 1990, a Educação Sexual vinha obtendo adesão de profissionais das escolas e também progredindo, paulatinamente, em termos de sua aplicabilidade nas salas de aula e de aceitação pelas famílias.

Várias situações de repressão a professores/as por trabalharem a Educação Sexual na escola têm acontecido, de modo especial, a partir de 2012. No final de março, em Primeiro de Maio, município paranaense a 70 km de Londrina, por conta do livro Sexo na Cabeça, de Luís Fernando Veríssimo, algumas mães de alunos dos 7º e 8º anos do Colégio Estadual Marechal Castelo Branco - que teriam por volta de 11 a 12 anos de idade -, apresentaram denúncia ao Ministério Público do Paraná (MPP) de que a professora estaria ensinando conteúdos inadequados.

A professora declarou ao Jornal Extra Classe, de 28/03/2022, que recebeu apoio da direção, da equipe pedagógica, dos colegas de trabalho e de alunos, e que a atividade foi feita sob supervisão e aprovação da coordenadoria pedagógica. Disse, ainda, que esse livro, “em nenhum momento, aborda o assunto sexo de forma explícita ou pornográfica e foi um entre 20 indicados para a leitura dos alunos”.

Certamente, tristeza e muitas ideias perturbadoras permearam e permeiam a mente das crianças e adolescentes que acompanharam a experiência ocorrida nesse colégio: uma esmagadora deseducação sexual.

Como profissional com grande experiência na formação de educadores sexuais, posso assegurar que é possível fazer um trabalho de qualidade, voltado para a formação humana de nossas crianças, adotando leituras como a do livro supracitado, acompanhadas de criticidade e debates.

Crianças, adolescentes e jovens se veem constantemente diante de uma polarização: por um lado, discursos e ações conservadores, recheados de tabu, em que se transmite a ideia de que sexo é um assunto proibido, algo vergonhoso, sujo, como acontece no fato acima citado; por outro, nas diversas mídias -  impressas e televisivas -, na internet e em letras de músicas, conteúdos instigadores de uma vivência sexual quantitativa, pobre de respeito mútuo e de respeito e cuidado com o próprio corpo.

Diante dessa doentia e deseducativa polarização, para salvaguardar a saúde mental e sexual dos/as educandos/as e também para que a escola tenha sentido para a vida destes/as, é necessário e urgente que haja um trabalho educativo na escola, que traga conhecimentos científicos sobre todos os temas ligados à sexualidade e que abra espaço para reflexões, criticidade e promoção dos valores humanos. Do contrário, continuaremos a ver sempre o aceleramento no número de jovens e adultos frustrados em sua vida afetivo-sexual, de gravidez não planejada, de violência sexual, de transmissão das Infecções Sexualmente Transmissíveis, entre outras problemáticas.

Parabenizo o colégio, por se comprometer com a formação integral, e a professora, por desenvolver o trabalho com a anuência da direção e da equipe pedagógica. Em tempos difíceis, “todo cuidado é pouco”, como se diz popularmente.

Alerto as escolas de que é preciso conhecer os documentos que dão suporte à Educação Sexual, para não deixar esmorecer a coragem que ela demanda. Entre eles, está a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que, embora desmereça os temas da sexualidade, favorece alinhamentos com a Educação Sexual emancipatória e intencional, como, por exemplo, nas Competências Gerais da Educação Básica e em muitas Habilidades (Objetivos) de vários Componentes Curriculares (Disciplinas ou Matérias). Na página 15 da BNCC, consta que pode ser incorporada “aos currículos e às propostas pedagógicas a abordagem de temas contemporâneos que afetam a vida humana em escala local, regional e global [...]” e que “Os professores com os estudantes têm liberdade de escolher temas, assuntos que desejam estudar [..

Mary Neide Damico Figueiró é psicóloga, doutora em Educação, professora aposentada da UEL e autora de 4 livros sobre Educação Sexual

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