Existe uma grande diferença entre “campo” e “roça”. Campo é a lavoura produtiva de onde os homens tiram os alimentos que sustentam o mundo; roça é o estilo de vida de quem vive no campo, afastado da vida agitada e frenética dos grandes aglomerados humanos que chamamos de “cidade”.

Imagem ilustrativa da imagem DEDO DE PROSA| AS COMIDAS DA ROÇA
| Foto: Marco Jacobsen

A vida urbana (que tem seu início lá na pré-história, após a descoberta da agricultura – aproximadamente há cinco mil anos antes de Cristo...) ocasionou uma ruptura violenta com o modo de vida dos seres humanos. Nas cidades (do latim: urbis - urbano) a agitação toma conta da rotina de nossas vidas: automóveis, buzinas, poluição visual e ambiental, estresse, ansiedade, depressão, prédios, relógios controlando o tempo produtivo... pessoas anônimas andando apressadas pelos calçadões e ruas numa busca desenfreada pela sobrevivência. Outros vagando sem destino tentando matar o tempo ocioso pela falta do que fazer!

A vida nas cidades têm suas exigências, necessidades e praticidades. Lojas, mercados e farmácias fornecem os víveres necessários para nossa existência e sobrevivência. Enlatados, embutidos e envazados têm seus prazos de validade prolongados pela indústria de alimentos com seus conservantes químicos que agridem lenta e silenciosamente nosso organismo. Chegam até ao limite de imitarem os sabores da natureza em laboratórios prometendo o verdadeiro gosto da fruta...”sabor artificial”!

Mas na roça não era assim! As pequenas hortas, adubadas com esterco natural, eram uma verdadeira fábrica de “remédios” preventivos que tornavam a vida mais saudável e longeva. Não haviam venenos ou defensivos para combater esta ou aquela praga. Tudo era in natura!

As carnes tinham um sabor inigualável, livres de hormônios ou remédios. As latas de banha guardavam as especiarias suínas sem nenhum conservante por meses! Aqueles frangos, que depois de irem para as panelas, apresentavam cor e sabor fantásticos, ainda mais quando eram acrescidos de temperados colhidos na hora! Hummm!!!!

Dia de fazer pães, então, era um ritual maravilhoso. Com lenços na cabeça e avental na cintura, nossas tias e mães iniciavam uma verdadeira aula de alquimia: farinha, banha de porco, ovos, açúcar, uma pitada de sal e fermento. Havia uma certa ordem em misturar os ingredientes para a massa não “desandar”. Ficávamos ali, debruçados e em silêncio ao redor da mesa, observando e contemplando aquelas mãos habilidosas trabalhando.

Massa pronta, depois de sovada, descansava envolta a um pano branquinho por umas horas até crescer. Dividida em pedações, era hora de cilindrar. Neste momento éramos convocados para girar o cilindro até que a massa começasse a soltar barulhos de bolhas estourando. Esse era o tal segredo do ponto certo de parar! Esticada, enrolada e pronto: “ nascia” o pão! Mais um tempinho descansando e era levado ao forno através de uma pá de madeira! Forno fechado, era só aguardar o momento certo para retirá-los.

Dourados e fumegantes passavam por nós inebriando nosso olfato e aguçando a fome. Cortados em fatias generosas recebiam uma camada de manteiga completando o sabor ao se derreter sobre elas. Não havia nada mais saboroso do que os pães da roça! Viva tia Geni, tia Linda e Dona Inês (minha mãe), pelas belas fornadas de pães dos tempos de infância que ainda guardo na memória!

Valdinei Franco é leitor da FOLHA.

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