Desde o início de janeiro de 2022 está em vigor a 11ª revisão da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-11), editada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A advogada e sócia do escritório De Paula Machado, Sibely de Oliveira Lazari, explica que a nova classificação descreve a Síndrome de Burnout como um quadro “resultante do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso."

De sua experiência com ações trabalhistas, alerta: "A CID-11 também delineia as seguintes características que serão levadas em consideração no diagnóstico: sentimentos de esgotamento ou exaustão de energia; aumento da distância mental do trabalho, ou sentimentos de negativismo ou cinismo em relação ao trabalho; e uma sensação de ineficácia e falta de realização".

Segundo a advogada, uma das indagações que surgem em decorrência desse novo enquadramento para Lazari é: "Até que ponto isso interfere nas rotinas de trabalho?" E responde: "Se considerarmos que oferecer um ambiente de trabalho saudável já é uma obrigação legal do empregador, e que medidas que proporcionem saúde e bem-estar aos trabalhadores também podem melhorar a produtividade, pouco teria mudado".

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Entretanto, a conhecedora das leis trabalhistas lembra que o mundo globalizado tem submetido as pessoas a variados gatilhos estressores também fora do ambiente de trabalho. "Trânsito intenso, violência urbana, risco de acidentes, uso excessivo de equipamentos eletrônicos, perdas de familiares e de amigos em decorrência da pandemia atual, dentre outros, tais fatores também podem atuar no desencadeamento de doenças psicológicas."

Nesse contexto, Lazari alerta que a classificação torna ainda mais relevante toda e qualquer providência do empregador para promover a valorização do trabalho, um ambiente saudável e a saúde de seus colaboradores", sustenta. Empregadores precisam estar atentos a situações do local de trabalho que podem, pela repetição, causar prejuízos emocionais que possam resultar em danos à saúde.

A advogada alerta ainda que inúmeros os fatores que poderão ser observados nessa nova postura preventiva necessária, a depender de cada atividade econômica. "O empregador deve verificar se as cargas horárias estão adequadas, a quantidade de trabalho é compatível com as funções e o tempo contratados, se não há exigência de metas excessivas, se eventuais conflitos são solucionados, se os colaboradores se sentem motivados e valorizados, se há situações de assédio moral, esses são alguns dentre vários outros aspectos que podem ser objeto de atenção patronal", observa.

DE PACIENTE A CONSULTORA DE EMPRESAS

Juliana Leal: "Empresas me procuram para participar de projetos de gestão humanizada, e transformação organizacional"
Juliana Leal: "Empresas me procuram para participar de projetos de gestão humanizada, e transformação organizacional" | Foto: Divulgacão

No ano de 2012, Juliana Leal trabalhava como executiva na área administrativa de uma grande empresa multinacional de contact center. "Precisei me afastar e fiquei 18 meses em processo de cura. O que me ajudou muito e a partir dessa experiência, venho me especializando na metodologia da Neuro-Semântica criada pelo americano Dr. Michael Hall, PhD em Psicologia Cognitivo Comportamental", relata Leal que vive no Rio de Janeiro e concedeu entrevista à FOLHA.

A diretora do endomarketing da SBNS - Sociedade Brasileira de Neuro-Semântica, é formada e treinada por essa metodologia e a aplica em trabalhos de bem estar e prevenção de burnout em empresas, uma delas, a Fiocruz. " Outra metodologia que utilizo há anos e tem sido muito eficaz, é o mindfulness e as intervenções da Psicologia Positiva, onde também capacitei profissionais da Fiocruz e nos meus cursos abertos da Psicologia Positiva", relata.

Leal destaca que várias doenças como o Burnout se agravaram com a pandemia e muitas empresas têm percebido o quanto a Psicologia Positiva pode ajudar neste processo de prevenção da doença. "Facilito programas de conscientização como steakholders e desenvolvo treinamentos específicos aplicados ao PERMA (emoções positivas, engajamento, relacionamentos positivos, propósito e autorrealização)", expõe.

PRÁTICAS QUE SÃO REFERÊNCIA

Bibiana Ribeiro Werner atua na Superintendência de Relacionamento do Sicredi de Porto Alegre: ações no cotidiano promovem bem-estar e produtividade
Bibiana Ribeiro Werner atua na Superintendência de Relacionamento do Sicredi de Porto Alegre: ações no cotidiano promovem bem-estar e produtividade | Foto: Divulgacao

Bibiana Ribeiro Werner atua na Superintendência de Relacionamento do Centro Adminstrativo do Sicredi, que fica em Porto Alegre, no RS, e o bom clima de trabalho entre os colaboradores é resultado de ações que vão ao encontro da produtividade e do bem-estar de todos. Werner trabalha há 22 anos no Sicredi, atualmente dedicada à Cultura, Educação e Felicidade no Trabalho.

Com base em fundamentos e metodologias estratégicas, levando também em consideração o papel dos gestores durante e pós-pandemia, o impacto imediato no cenário organizacional e novas formas de trabalho, Bibiana esclarece que desde que começou a pandemia deu-se início a todo um trabalho remoto com ações para cuidar das pessoas e avaliar como estavam na nova rotina. "Nesse momento começamos também a pensar na questão da felicidade no trabalho", expõe.

Com perspectivas, investiu. "Fiz alguns cursos e certificação com Carla Furtado, do Instituto Feliciência como Hapinnes Office e Hapiness Skills e começamos a preparar as pessoas para o projeto ‘Felicidade no Trabalho’, no qual começamos a falar sobre felicidade. Incialmente, trabalhamos mais treinamentos comportamentais comunicação não violenta, habilidades para o trabalho. Também passamos por uma pesquisa sistêmica de clima e com base nos resultados, que foram bons, mas entendemos que sempre há necessidade de melhoria", avalia.

Assim, antes de iniciar o projeto, os colaboradores tiveram a chance se expor seu nível de felicidade no trabalho. Nosso foco no projeto foi a felicidade de quem trabalha no atendimento, considerando que a integração e o encantamento para atender são pontos fundamentais nesse processo. "O encantamento interno é o mais importante. Pessoas precisam estar felizes para poder transbordar para o encantamento externo", sustenta. As ações possuem 360 graus, ou seja, são táticas, estratégicas e envolvem o todo.

A partir disso, nasceu a iniciativa "Felicidade de quem Trabalha no Atendimento", com uma proposta desenhada a partir dos pilares: aferição da satisfação no trabalho; entendimento dos resultados da pesquisa de clima, trilha de formação para lideranças formais e informais; treinamentos comportamentais; foco na jornada de onboarding, que é o processo de recepção a novos colaboradores.

Werner destaca que houve acolhimento interno, que resultou em cotidiano de desenvolvimento das pessoas. “Alguns aspectos fundamentais tem sido o apoio de diversas áreas em prol do objetivo e o incentivo da liderança da área de Relacionamento do Centro Administrativo, a partir do entendimento que nossos profissionais que atuam com atendimento só vão conseguir encantar os associados se estiverem felizes no trabalho”, explica.

RH DEVE ASSUMIR POSTURA DE ANTECIPAÇÃO

Henrique Gambaro: "O empregador também pode adoecer e são os casos mais difíceis de se identificar"
Henrique Gambaro: "O empregador também pode adoecer e são os casos mais difíceis de se identificar" | Foto: Divulgação

Do ponto de vista do Mestre em Administração, professor e Especialista em Marketing e Recursos Humanos, Henrique Gambaro, o reconhecimento da síndrome pela OMS promove uma discussão necessária e mais comum. "Devemos partir do princípio que toda organização é responsável pela saúde física e mental de seus colaboradores e que esta responsabilidade deve se dar pelos cuidados que a organização deve apresentar no dia a dia na realização de suas atividades. O RH das empresas agora devem assumir uma postura de antecipação, prevenção e precaução de possíveis atitudes da organização", considera.

O empregador também pode adoecer e Gambaro aponta que esses podem ser os casos mais difíceis para identificar. "Possuem uma carga de trabalho muitas vezes extenuantes e muitos empregadores as justificam pela necessidade de alcançar bons resultados e, principalmente, pelo medo do fracasso. O pior é que este indivíduo se acostuma com esta situação e quando a Síndrome aparece e não é reconhecida, entra num processo de negação em um jogo onde a sua derrota é certa. Para que isto seja evitado, estes profissionais, empregadores/empreendedores, devem buscar uma qualidade de vida equilibrada", orienta.

Sibely de Oliveira Lazari, advogada: "A classificação atual da Síndrome de Burnout na CID -11 torna ainda mais relevante toda e qualquer providência do empregador no sentido de promover a valorização do trabalho”
Sibely de Oliveira Lazari, advogada: "A classificação atual da Síndrome de Burnout na CID -11 torna ainda mais relevante toda e qualquer providência do empregador no sentido de promover a valorização do trabalho” | Foto: Divulgacao

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