Tradicionais, guerreiros, sobreviventes, teimosos. Os adjetivos são muitos para descrever os comerciantes de bairros que resistem às crises econômicas e se reinventam para manter as portas abertas. Alguns foram mais impactados pela queda de consumo do brasileiro. Outros passaram à margem. Mas todos buscam estratégias para continuar no mercado.

Não há dados específicos sobre o número de comércios de bairros em Londrina, e nem a quantidade de empregos gerados. Mas de acordo com o Sincoval (Sindicato do Comércio Varejista de Londrina e Região), os bairristas concentram as vendas de menor volume, mas vendem mais do que a região central.

"O bairro não sai mais do bairro. Os sacolões, as lojas de presentinho, por exemplo, vendem até mais do que lojas de rua e shopping. Se o consumidor for computar o tempo para ir ao centro e o valor pago em estacionamento, ele vai no comércio da esquina que atende a necessidade dele", comentou Ovhanes Gava, presidente do Sincoval.

Na zona oeste, a loja de tecido do Jardim Bandeirantes é a primeira opção de compra dos moradores. "Eles procuram primeiro aqui, se não encontram o que precisam vão em outros lugares", disse a vendedora Isabela Silva Melo. A loja sentiu os efeitos da crise com queda no movimento nos últimos dois anos e precisou reduzir o quadro de funcionários. Oito anos atrás, quando Melo foi contratada, eram três funcionárias. Hoje, são duas. "Antes não era essa paradeira. A gente corria o dia todo", recorda.

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Dono de uma loja de móveis na rua Serra da Graciosa, no Jardim Bandeirantes, há mais de vinte anos, o comerciante Ederaldo Antonio Baron precisou se "virar nos trinta" para ficar de portas abertas. Ele adotou estratégias mais assertivas de compra das mercadorias e apertou a avaliação do crédito. Mais de 90% dos seus clientes são do bairro e das redondezas. "Quando alguém de fora da região vem comprar você analisa o crédito mais de perto. Porque, às vezes, ele busca o comércio local porque não consegue comprar em outro lugar", comentou Baron.

A avenida Arthur Thomas e a rua Serra da Graciosa estão tornando-se polos do comércio local da zona oeste, com a abertura, mesmo que tímida, de novos negócios. "Acredito que é uma tendência de cidades grandes, como Londrina, do comércio se espalhar", afirmou o comerciante. Mas ele avalia que o comércio da região central ainda atrai os consumidores do bairro. "Quando o comércio abre aos sábados à tarde, o movimento cai aqui. O pessoal aproveita para passear no centro", disse.

Para Ana Paula Nóbrega Paes, proprietária de um pet shop, também na rua Serra da Graciosa, o comércio do bairro seria mais forte se houvesse mais investimentos e apoio do poder público e das entidades comerciais. Há oito anos ela decidiu se aventurar no comércio sem muita experiência.

Aos poucos foi conhecendo o mercado e conquistando a clientela. Foram mais de três anos de trabalho até se estabelecer. Conta que "bateu cabeça" no início, mas hoje aprendeu a negociar com fornecedores e identificar as necessidades dos clientes.

Sua clientela não se restringe ao bairro. Hoje atende Cambé, a região dos Cinco Conjuntos (zona norte) e centro. Investe nas redes sociais, mas seu maior retorno é no boca a boca. "A página da loja ainda dá pouco resultado. Minha maior propaganda ainda é a indicação", contou.

MUDANÇA DE HÁBITOS

O setor varejista é o primeiro a sentir os impactos da recessão e também sofre com a mudança de hábitos e comportamento do consumidor. A chegada dos e-commerces, que colocam os produtos na palma da mão do consumidor, no conforto de sua casa e a qualquer hora, e a abertura de shoppings centers, com seus ambientes agradáveis, segurança, estacionamento, praças de alimentação, são fatores que impulsionam essa transformação de comportamento e ameaçam o comércio de rua.

Por outro lado, o consultor do Sebrae Rubens Negrão aponta o custo de ter uma loja em um shopping e a proximidade que a loja de rua proporciona com os consumidores podem ser vistos como oportunidades para os bairristas. "Hoje, você tem que analisar quanto o cliente está disposto a andar para chegar até você. Estudos mostram que em cidades grandes esse tempo é de uma hora e, em cidades menores, de até 30 minutos", afirmou.

Negrão disse que o grande desafio do comércio de rua é conseguir levar um ambiente de shopping à sua rua. "O comércio precisa tentar se aproximar destes concorrentes. Como fazer isso? Com fachadas atrativas, estacionamento, segurança, ter um mix de negócios na rua que atenda o consumidor, como por exemplo, lanchonetes e restaurantes", comentou o consultor.

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O comerciante precisa levar seu negócio para o ambiente virtual, com canais de vendas e estratégias de aproximação. "Chegar às 8 horas, abrir a loja e esperar o consumidor é uma atitude de alto risco. Tenho que ter estratégias para buscar novos clientes. O comportamento tradicional é um limitador", ensinou.

O varejo de bairro precisa, na percepção do consultor do Sebrae, aprender a vender valor e não preço para competir com o e-commerce. "O comércio de rua entrega valor no relacionamento com o cliente. E esse relacionamento não é só bom atendimento. É saber o que o cara gosta, onde frequenta, na sua interação com ele nas redes sociais. Estar onipresente, agregar serviços e deixar essa relação mais pessoal e menos máquina", orientou.