Neste domingo (7), ele faz 80 anos.

Incontáveis as vezes em que ouvi Caetano, senti Caetano, me apaixonei com Caetano, sempre ao meu lado, ou melhor, nos meus ouvidos, sensibilizando o verbo que deságua em "caetanear."

A paixão começou na infância, ouvindo e cantando "Alegria, Alegria", um marco, o início, um indício de que o Brasil , então na ditadura militar, tinha um lado muito mais feliz.

"Alegria, Alegria", enquanto o exército perseguia pessoas nas ruas. "Alegria, Alegria" profetizando um tempo que seria muito maior com a Tropicália, com aquele bando feliz, colorido, compondo as canções mais bonitas que me acompanhariam numa trilha sonora que durou mais que os casamentos. "Sobre a cabeça os aviões, sob meus pés os chapadões, meu nariz".

LEIA MAIS

A vista do coração urbano, cada vez mais concreto

'Pantanal' põe JUma entre as onças e o xampu

Nascia uma nova ordem, o inverso da crueldade dos tanques nas ruas, com homens duros sendo obrigados a ver uma outra nação nascendo mais feliz. Ele já havia escrito a música "Terra" na prisão. Depois, isso tudo valeria o exílio para a tribo da Tropicália.

Dizem que Caetano no exílio em Londres, triste com a distância, nunca se conformou em estar fora do País, longe dos seus amores e contrariado compôs uma obra-prima: "London, London." Foi quando começamos a ver discos-voadores: "While my eyes Go looking for flying saucers in the sky."

Ele voltaria definitivamente ao Brasil em 1972. João Gilberto deu o mapa num telefonema: "Ouça bem, você vai desembarcar no Rio, todas as pessoas vão sorrir pra você." E João o convidou para participar de um especial na televisão.

Mais tarde, nos anos 1980, ele continuaria ídolo de várias gerações. Viriam pérolas como "Vocé é Linda", "Trem das Cores", "Eclipse Oculto", "Menino do Rio"." Caetano requebrando com seu corpo eternamente flexível, seus pés de samba de Santo Amaro da Purificação, sinalizava à nação que o amor era grande, muito maior do que se supunha.

O amor do homem pela mulher, da mulher pelo homem, da mulher pela mulher, do homem pelo homem. Com todos os seus amores ele deflagrava a revolução. Não a dos tanques nas ruas, mas a do corpo no corpo, da mente com a emoção. Revolução! E os "bons costumes" nunca mais seriam os mesmos, graças também a ele. E graças a Deus!

Cantei todas essas canções, em rodas de violão no meio universitário de Londrina, adentrando os anos 1990 com a trilha sonora dos meus amores. Olhares compridos para o moço que cantava comigo, que parecia se apaixonar também, mas o amor era outro, ele era homossexual e foi uma das minhas grandes paixões. Cantamos juntos todos as músicas de Caetano, era essa a celebração de nosso amor. E foi como sempre foi: "É proibido proibir!"

Caetano faz 80 anos. Imagino hoje se sua canção-tema será "Oração ao Tempo", na voz deste "senhor tão bonito".

Ou será aquela outra que me lembra meu pai se despedindo da vida: "O homem velho deixa a vida e morte para trás (para trás)/ Cabeça a prumo, segue rumo e nunca, nunca mais (nunca mais)/ O grande espelho que é o mundo ousaria refletir os seus sinais/ O homem velho é o rei dos animais."

Caetano rei profetiza também a eternidade, que não está na duração da vida, está na duração da arte, como veremos neste domingo (7), em live aberta a todos na Globoplay, com transmissão simultânea no Multishow, às 20h30. A festa ao vivo - com direito a algumas cenas no Fantástico - é a celebração de seu aniversário, cantando e dançando com os filhos Moreno, Zeca e Tom, com a irmã Maria Bethânia..

.
. | Foto: Reprodução

Na festa, ele estará fazendo o que gosta, com os passos miúdos do samba baiano, do coco regado a tantos talentos que se condensaram neste leão fabuloso que atrás de si deixa um rastro de luz e de canções.

De tantos amores e desamores sobram poemas, isso é maior que a dor. Obrigada pela trilha da minha vida inteira.

Salve, Caetano! No samba com seus filhos, eternamente baiano e brasileiro, como rei dos animais e rei dos ancestrais. Amém!

...

Receba nossas notícias direto no seu celular, envie, também, suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link