"Eu quis trazer um pouco dessa ideia para que ninguém diga para elas que é impossível", afirma a professora Ana Lobo
"Eu quis trazer um pouco dessa ideia para que ninguém diga para elas que é impossível", afirma a professora Ana Lobo


Lise Meitner, Rosalind Franklin, Marie Curie. Os nomes podem não ser tão conhecidos, mas essas mulheres fazem parte de uma minoria feminina que já recebeu o Prêmio Nobel em Ciências. O baixo estímulo de meninas para a área provocou a parceria entre a ONG WLF e IFPR (Instituto Federal do Paraná) para oferecer o curso Cálculo Mais que Divertido! exclusivo para garotas. O objetivo é encorajar as jovens a buscar carreiras na área de matemática, ciência e tecnologia, ramo em que ainda são minoria.

Enquanto alguns aproveitavam as férias de julho, 42 meninas do ensino médio de escolas públicas e particulares participavam de curso gratuito de cálculo em tempo integral durante 10 dias, no IFPR, em Londrina. O intuito é motivá-las a mudar a visão para a ciência. "A ideia partiu da minha experiência com a física e por conta das mulheres procurarem muito pouco essa área", afirma Jayme Marrone Júnior, coordenador do projeto.

Segundo ele, não é uma questão de habilidade e preferência, mas de falta de estímulo por parte do ambiente e sociedade para que elas deixem de optar por esse ramo. "Dentro da neurociência, a gente percebe que o cérebro não tem gênero, há a mesma apreciação do saber. Em algum momento do ensino fundamental acontece essa distinção e o núcleo familiar e o âmbito social estão relacionados a isso", relata.

Thainá Lopes: "As aulas são importantes, porque ainda ocorre muito machismo"
Thainá Lopes: "As aulas são importantes, porque ainda ocorre muito machismo" | Foto: Fotos: Marcos Zanutto



A estudante do ensino médio Thainá Lopes, 16, matriculou-se no curso interessada em se aprofundar na área e quem sabe escolher um curso de graduação em ciências. "Acho importante as aulas, porque ainda ocorre muito machismo. Eu já presenciei, as pessoas geralmente falam que as exatas não têm nada a ver comigo, um pouco por mim, um pouco, eu acho, por ser menina", afirma. A jovem também acredita que na escola há uma maior atenção para os meninos do que para meninas quando escolhem a física como carreira.

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Ações como as citadas pela estudante podem desestimular a relação com a matemática e ciências. Assim, algumas vão mudando os caminhos e tornando os cursos de graduação em exatas cada vez mais desiguais. "A gente percebe que ainda acontece dentro da universidade. A física ainda é um curso que tem um machismo grande", relata o coordenador.

Na UEL (Universidade Estadual de Londrina), por exemplo, dos cinco cursos de graduação do CCE (Centro de Ciências Exatas), as mulheres representam apenas 35% dos alunos ativos em 2018. No total são 1.488 estudantes, 966 homens e 522 mulheres. Na pós-graduação, os números são mais equilibrados, com 52% de homens contra 48% de mulheres.

Damaris Marques de Souza: "Indo para as exatas também estou quebrando barreiras"
Damaris Marques de Souza: "Indo para as exatas também estou quebrando barreiras"



A estudante Damaris Marques de Souza, 17, pretende mudar a estatística também de outras áreas. "Quero fazer engenharia e não conheço quase nenhuma menina que queira. Tem preconceito, quando você vai ver algum curso na área, quase não tem mulher. Então quero fazer parte disso, quero representar as mulheres. Indo para as exatas também estou quebrando barreiras", argumenta.

O aumento dessa participação depende muito do esforço pessoal e de ter pessoas que inspirem e estimulem. Percebendo isso, o Instituto fez o convite à palestrante Ana de Oliveira Lobo, londrinense que participa de projeto sem fins lucrativos, o WLF, para promover oportunidades às mulheres por meio de programas educativos.

A professora cursou bacharel em astronomia e ciências terrestres na Columbia University e finaliza o doutorado no Caltech (California Institute of Technology), onde estuda a dinâmica das atmosferas planetárias. "Eu quis trazer um pouco dessa ideia para que ninguém diga para elas que é impossível do jeito que falavam quando eu estava tentando, porque às vezes você só precisa de um empurrão", afirma.

O mesmo curso é aplicado nas universidades americanas e com um custo alto. "Lá elas pagariam em torno de R$ 20 mil. Aqui ficou em torno de R$ 200 por estudante, mas tudo custeado por essa ONG", afirma o coordenador. Além das aulas de cálculo, o projeto ofereceu atividades diversas, como manejo de linguagem computacional (em phyton), palestras sobre pesquisa de ponta em astronomia, ciências planetárias, ciências atmosféricas e mudanças climáticas.


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