Caingangues em Londrina relatam dificuldades para recuperar moradias
Famílias dependem de doações de alimentos, roupas, móveis e tábuas de madeira para reerguer casas destruídas por um incêndio; centro cultural foi palco de uma apresentação do grupo VÄN-GA
PUBLICAÇÃO
quinta-feira, 26 de agosto de 2021
Famílias dependem de doações de alimentos, roupas, móveis e tábuas de madeira para reerguer casas destruídas por um incêndio; centro cultural foi palco de uma apresentação do grupo VÄN-GA
Micaela Orikasa - Grupo Folha
Desde que um incêndio destruiu a moradias de seis famílias no Centro Cultural Kaingang - Vãre, na zona sul de Londrina, a comunidade que vive às margens da avenida Dez de Dezembro enfrenta dificuldades para reerguer as casas de madeira. O fogo foi ocasionado por um lampião com óleo diesel que caiu sobre um tapete, em 4 de agosto. Uma das casas atingidas era de Leonice Cândido Rael, que vive com o marido, a filha e um neto.

“Perdi tudo o que tinha. O fogo foi rápido e não deu tempo de tirar nada. Perdemos cobertores, roupas, armários, panelas, sofá, fogão, comida. O mais urgente agora são as madeiras para conseguirmos, pelo menos, levantar as casas”, disse ela, na tarde de quiarta-feira (25).
Renato Kriri, vice-cacique caingangue da aldeia Água Branca, localizada em Tamarana (região Metropolitana de Londrina), conta que as doações recebidas até o momento não são suficientes para o recomeço das famílias. “Estamos precisando de materiais para as casas, além de alimentos. A ajuda vem mais de igrejas, ONGs e associações. Os políticos não querem nem saber”, desabafa. Na sexta-feira (27), um grupo de voluntários vai ajudar as famílias com a limpeza do terreno, onde ainda há resíduos do incêndio.

VALORIZAÇÃO DA CULTURA
No último sábado (21), a comunidade caingangue em Londrina realizou no espaço cultural uma apresentação do grupo de dança VÄN-GA, que faz parte da religião nativa da etnia. Com o apoio da secretaria municipal de Cultura e o Conselho Municipal de Transparência e Controle Social, o objetivo era mostrar parte da cultura indígena e arrecadar alimentos.
“Por causa da pandemia (de coronavírus), temos que evitar aglomerações, então tivemos pouca arrecadação e conseguimos vender cerca de R$ 200 em artesanato. É pouco porque estamos hoje em 35 famílias e o que temos recebido é entre cinco a dez cestas básicas. Para não deixar ninguém sem comida, dividimos os produtos entre todos”, conta o vice-cacique Kriri.
A apresentação foi marcada por cânticos que simbolizam a aldeia Água Branca, a natureza e o povo caingangue. “É como uma apresentação do índio caingangue e uma forma de mostrar que estamos vivos, resistindo. A nossa fonte de vida sempre foi o artesanato vendido em Londrina e na região, mas a pandemia também tem nos atingido fortemente. Precisamos do nosso espaço, do respeito de todos e de oportunidades. Viemos para a cidade não só para vender artesanato, mas para buscar meios de sobrevivência e para estudar. Os mais jovens precisam se profissionalizar, acompanhar a evolução”, diz.
DESDE 1999
O Centro Cultural Kaingang Vãre foi inaugurado pela Prefeitura Municipal em 1999 com o objetivo de oferecer melhores condições de permanência aos caingangues por ocasião de suas vindas à Londrina para a comercialização de produtos artesanais. Kriri destaca que o espaço também surgiu com a ideia de promover a educação de crianças e jovens através de palestras e eventos culturais. Com o tempo, a estrutura foi ficando abandonada e não recebeu nenhuma manutenção.
A permanência da comunidade indígena às margens do Ribeirão Cambé é alvo de discussão há muito tempo. O espaço foi declarado como de preservação ambiental e está em litígio. A secretária municipal de Assistência Social, Jacqueline Micali comenta que a ocupação no local pelas famílias caingangues é tida como irregular e a orientação é para que elas não permaneçam no local.
De acordo com ela, o município oferece um espaço aos indígenas, no conjunto Cafezal (zona sul). A Casa de Passagem funciona desde 2015 e segundo Micali, é estruturada para a permanência dessas famílias em decorrência de algum tratamento de saúde ou durante a venda de artesanato.
“Temos prestado assistência à comunidade não só com o fornecimento de cestas básicas, mas acompanhamento para Cadastro Único. Uma assistente social da nossa equipe está em contato permanente com as famílias da Aldeia Água Branca e uma vez por semana vai no Centro Cultural Vãre”, afirma.
A ação de reintegração de posse do terreno foi movida pela Prefeitura de Londrina em novembro de 2015. Dois anos depois, houve uma sentença favorável do juiz da 3ª Vara Federal, Décio José da Silva. A Funai (Fundação Nacional do Índio) recorreu em segunda instância, mas até hoje o recurso não foi julgado. A assessoria de imprensa do TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), órgão responsável por analisar o questionamento da Funai, disse à FOLHA que não há previsão disso acontecer. (Colaborou Rafael Machado)
SERVIÇO: Quem puder ajudar as famílias com doações pode entrar em contato pelo fone (43) 9 9963-3942. Também podem ser feitas doações em dinheiro através da chave Pix 950.697.399-72.
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