Na década de 1950, o noroeste do Paraná era coberto por mata nativa e já se iniciava a colonização da região, substituindo as matas pelas lavouras cafeeiras. Uma tradicional família de Cambé tinha uma grande fazenda naquela região, com parte da propriedade já em cafezais e outra ainda mata, a ser derrubada.

Imagem ilustrativa da imagem DEDO DE PROSA - O Totonho
| Foto: Marco Jacobsen

Empregava dezenas de famílias que moravam na colônia. Tinha uma serraria de médio porte que beneficiava as toras. Como na época não tinha energia, a serraria e algumas casas era fornecida energia por motores. Como tinha tratores, jeeps e caminhões, então era necessário um mecânico para a manutenção. Meu irmão mais velho, Celso, um jovem mecânico recém-casado, foi contratado para trabalhar na fazenda.

Tinha um cinema no vilarejo, em que a energia era produzida por um motor e era o meu irmão que, nos finais de semana, dava atendimento ao cinema. Ocorre que um dos caminhões de tora, um Ford 1946, que tinha o apelido de “bodinho”, era dirigido pelo Totonho, um nordestino que usava sempre um chapéu de couro, estilo cangaceiro.

Anos antes, o Totonho sofreu um acidente com uma tora que rolou de cima do caminhão sobre ele, vindo a falecer. Corria na fazenda uma estória que volta e meia, à noite, via o Totonho sentado no capô do caminhão na garagem. Muitos, quando passava a noite pelo local, se arrepiava. Outros evitavam passar próxima a garagem, nem olhavam. Até um padre foi rezar uma missa no local.

Ah, tinha o Zé do Norte, um senhor de meia idade moreno, meio esquisito, que se auto intitulava benzedor, vivia com um galho de arruda atrás da orelha esquerda. Ele sempre queimava alecrim em sua casa para espantar o mau olhado e a inveja. O Zé Biga, goleiro do time da fazenda, brincava com o Zé do Norte dizendo sempre: Zé, quem tem inveja do cê, pois você é feio, narigudo, não tem mais que metro e meio, pobre, e ainda tem uma dúzia de filhos?

Mas voltando ao assunto, Zé do Norte, por diversas vezes, fez “trabalhos” para sossegar a alma do Totonho, sem obter resultado, como diziam na fazenda.

Certa noite teve um terço em uma casa na fazenda. Meu irmão colocou uma toalha branca na cabeça e foi sentar no capô do “caminhão assombrado”. Ao terminar o terço, saiu um grupo de pessoas, homens, mulheres e crianças em direção as suas casas. Ao passar em frente à garagem do “bodinho”, viram a “assombração”. Houve uma gritaria só, correria, pânico, Dona Nardinha, que era bem obesa, caiu desmaiada. O Zé do Norte, corajoso, arrancou o galho de arruda que tinha na orelha e gritava: - Vaite-te embora alma penada.

Meu irmão saiu por trás da garagem, apavorado, foi ver o “estrago” que ele tinha feito.Até hoje ninguém ficou sabendo que o verdadeiro “fantasma” era meu irmão.

Sidney Girotto, médico

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