Moradores e trabalhadores que precisam frequentar região à noite relatam estratégias para driblar a violência


Laucenir aperta o passo para percorrer os três quarteirões até o Terminal Urbano. Guilherme passou a buscar a noiva no trabalho. O ponto de ônibus da Gabriela é na outra ponta da avenida, mas ela prefere esperar o transporte onde há mais pessoas. Essas são estratégias que o londrinense adota para driblar os riscos de violência no Centro de Londrina à noite. Se antes a sensação de insegurança já existia, após as notícias de dois latrocínios na região, o medo aumenta. A FOLHA percorreu o local durante à noite para ouvir os depoimentos de quem precisa passar por ali.

Laucenir Lombardi trabalha há sete anos na região e precisa pegar ônibus todos os dias no Terminal Central
Laucenir Lombardi trabalha há sete anos na região e precisa pegar ônibus todos os dias no Terminal Central | Foto: Ricardo Chicarelli

No início da noite, moradores ainda circulam com os pets, conversam com os vizinhos, os carros ainda preenchem as ruas, mas a partir das 20h o espaço passa a ficar deserto. O clima amedronta Laucenir Lombardi, 66, que trabalha há sete anos na região e precisa pegar ônibus todos os dias no Terminal Central. “Aqui está horrível, não tem segurança, diminuiu o número de pessoas circulando, tem muita marginalidade e não tem carro de polícia aqui”, reclama. A auxiliar de serviços gerais sai do trabalho às 20h45 e desce três quarteirões a pé. “Lá em casa o pessoal fica com medo por mim, porque aqui piorou muito. Aqui no Centro está muito pior do que onde eu moro, nos Cinco Conjuntos”, compara.

Sair do trabalho é o ponto crítico para muitos que trabalham no Centro. Guilherme Henrique de Lima, 29, passou a buscar a noiva no emprego todos os dias após os dois episódios violentos na região. Ela trabalha há uma quadra do Terminal, mas teria que passar pela praça Rocha Pombo para chegar até lá. “Passei a buscá-la com mais frequência, porque fiquei pensando em tudo que tem acontecido aqui em um curto espaço de tempo”, revela.

Imagem ilustrativa da imagem Medo altera rotina no centro
| Foto: Ricardo Chicarelli

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O técnico instalador de internet espera sozinho sentado no banco da praça, o único no local. Minutos antes, por volta das 19h30, o carro da Guarda Municipal fazia vigia no espaço, mas por volta das 20h já não havia segurança por ali. “Muito raro ter polícia aqui. Eu acho que eles deveriam estar mais presentes, deveriam colocar câmera tanto aqui quanto no Bosque Central, porque as coisas estão acontecendo debaixo do nariz deles e ninguém está vendo”, critica.

Por sua vez, as praças da região estão todas bem iluminadas, o que tem levado a violência para espaços mais escondidos do Centro, como porta de comércios que possibilitem esconderijos, calçadas mais escuras e a área interna do Bosque Central. Por volta das 22h, três amigos conversavam sentados em uma mesa na rua principal de acesso ao Bosque. “Quando a gente está junto não tem medo, mas eu não ando sozinho aqui. A gente percebe que as pessoas têm medo aqui, até com medo da gente mesmo, porque ninguém sabe”, revela Eugênio Zanin Neto, 25. Os três perceberam que houve aumento de viaturas circulando na região. “Acho que depois do que aconteceu, eles estão vindo mais”, supõe o professor.

Imagem ilustrativa da imagem Medo altera rotina no centro
| Foto: Ricardo Chicarelli

Nos pontos de transporte intermunicipal, escuridão. Na espera do coletivo, na avenida Leste-Oeste, os passageiros relatam a insegurança do local e os riscos de ficar sozinho ali. Por isso, as mulheres contam que ficam nos espaços com maior aglomeração de pessoas e que só vão para o ponto certo da linha quando veem o ônibus chegando.

Entre 21h e 22h, alunos de unidades educacionais, como o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e o Colégio Estadual Hugo Simas, contornam a violência andando em turma, mas Elzira Camilo, 56, que tem aulas de inglês no colégio, anda sozinha mesmo. Ela mora no jardim Califórnia (Leste) e, apesar da distância, prefere caminhar a ficar no ponto esperando o ônibus. “É longe, mas estou acostumada. Claro que eu ando com cuidado, porque não me sinto tão bem andando sozinha, dá medo. Se no Centro da cidade acontece certas coisas e ninguém vê, penso que pode acontecer comigo também, mas acho pior ficar no ponto esperando 1 hora para o ônibus passar”, argumenta a técnica de enfermagem.

Imagem ilustrativa da imagem Medo altera rotina no centro
| Foto: Ricardo Chicarelli

SEGURANÇA PÚBLICA

Pedro Ramos, Secretário Municipal de Defesa Social, explica que os episódios violentos da última semana contribuem para essa percepção negativa. “Na nossa percepção, os últimos episódios acabam despertando a sensação de insegurança, mas é preciso lembrar que é um episódio atípico movido por ódio de uma pessoa que agiu de modo premeditado e resolveu matar”, explica.

O secretário também comenta que a Guarda Municipal possui atribuições específicas, como cuidar dos prédios, servidores e usuários do serviço público e que, por extensão, a Guarda cuida de praças e logradouros públicos enquanto as pessoas estão frequentando esses locais.

Imagem ilustrativa da imagem Medo altera rotina no centro
| Foto: Ricardo Chicareli - Grupo Folha

Ramos também aponta que não é atribuição da Guarda fazer o policiamento ostensivo fardado, e o que a pasta tem feito é instalado câmeras e se responsabilizado por sua manutenção, assim como poda de árvores e iluminação em espaços públicos, entre outras ações. “Nós não estamos omitindo e nem nos ocultando das nossas atribuições legais, mas a gente está em um contexto em que nós temos vários órgãos de segurança que têm que atuar ao mesmo tempo”, defende.

Imagem ilustrativa da imagem Medo altera rotina no centro
| Foto: Ricardo Chicarelli

O major Nelson Villa, do 5º BPM (Batalhão da Polícia Militar), afirmou que está fazendo reforço do policiamento desde o acontecimento dos dois latrocínios. “Tanto de dia quanto de noite e madrugada nós temos reforçado a segurança no Centro de Londrina. Estamos com várias equipes fazendo o policiamento, intensificando a atividade de ostensividade. Do ponto de vista da PM, o que for preciso fazer nós estamos fazendo”, afirma.

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