Há mais de um mês, Débora Miriam Ortega Paes, 31, está fora de casa. Grávida, ela precisou ser internada na maternidade do HU-UEL (Hospital Universitário) de Londrina para evitar o nascimento prematuro de Beatriz. Hoje, com 29 semanas, Paes aguarda ser imunizada contra a Covid-19 nos próximos dias. Uma ansiedade que ela não experimentava meses atrás. “Eu tinha um pouco de receio porque são vacinas que a gente não tinha ouvido falar e não sabia se podia afetar algo no desenvolvimento da bebê, mas fui ficando mais tranquila porque a gente vai se informando, entendendo que elas são desenvolvidas com alta tecnologia. O que me dá medo agora são essas novas variantes do vírus, que estão deixando todos suscetíveis á doença. Antes eram só os mais idosos que ficavam doentes, mas agora estão atingindo os mais jovens”, comenta.

 Débora Miriam Ortega Paes: "Eu tinha um pouco de receio das vacinas, mas fui ficando mais tranquila porque a gente vai se informando"
Débora Miriam Ortega Paes: "Eu tinha um pouco de receio das vacinas, mas fui ficando mais tranquila porque a gente vai se informando" | Foto: Marco Antonio Corbanez/ HU

Paes é uma entre as milhares de brasileiras que engravidaram durante a pandemia do coronavírus e tem encarado o medo de contrair a doença, assim como a ansiedade e angústia em relação às vacinas. As grávidas e puérperas (até 45 dias após o parto) foram incluídas no grupo prioritário para receber a vacina em 27 de abril, mas em 10 de maio veio a notícia da suspensão da vacina com o imunizante da Astrazenenca/Fiocruz. A medida foi anunciada pelo Ministério da Saúde diante da morte de uma gestante no Rio de Janeiro, que havia sido vacinada. O caso está sob investigação dos órgãos de saúde. Segundo o MS, a medida é resultado do monitoramento de eventos adversos feito de forma constante sobre as vacinas contra Covid, e também com base no princípio da precaução.

Em nota, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) disse que “o uso off label de vacinas, ou seja, em situações não previstas na bula, só deve ser feito mediante avaliação individual por um profissional de saúde que considere os riscos e benefícios”. Dessa forma, a orientação a todos os estados é de que seja seguida a bula atual do imunizante, que descreve que o uso por gestantes só deve ocorrer mediante orientação médica.

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SBIM RECOMENDA

A presidente da Comissão de Revisão de Calendários de Vacinação da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), Mônica Levi, lembra que da mesma maneira como foi o H1N1 em 2009, as gestantes foram contempladas no grupo de risco da Covid pelo aumento dos registros de mortes. “As gestantes têm outras duas opções de vacinas que não apresentaram nenhum evento adverso grave em nenhum lugar do mundo e, portanto, não correm o risco de serem suspensas. A interrupção da Astrazeneca não é uma decisão generalizada e sim uma precaução. As grávidas de risco deveriam ter mais medo de pegar a Covid e isso atrapalhar a gestação, do que ter medo da vacina”, enfatiza.

Imagem ilustrativa da imagem Dupla insegurança para gestantes: risco da Covid e o medo da vacina
| Foto: Ana Leal/OFotográfico/Folhapress

Levi reforça que uma câmara técnica investiga o óbito da gestante no Rio e lembra que as decisões em saúde pública devem ser ponderadas quanto ao risco-benefício. “Vamos supor que seja descartada a associação da vacina com este óbito. A comunicação vai ter que ser muito clara. Tomar ou não a vacina é uma decisão que deve ser discutida e compartilhada com o obstetra. A SBIm recomenda a vacinação. A Covid é uma doença que está causando complicações graves e matando as gestantes”.

NO HU

O ginecologista e obstetra Inacio Inoue, que atua há 25 anos no HU (Hospital Universitário) em Londrina, destaca que quando a gestante toma uma vacina “está protegendo a si mesma e indiretamente o seu bebê”. Ele avalia que a morte da gestante após a aplicação do imunizante da Astrazeneca/Fiocruz “é um fato isolado, ainda inconclusivo e muito raro. Por cautela, a Anvisa suspendeu sua aplicação, mas temos outros imunizantes para uso como a Coronavac e a da Pfizer. Algumas gestantes minhas já se vacinaram e tiveram reações leves, esperadas”, diz.

Para Inoue, os benefícios da imunização contra Covid-19 se estendem para a gestantes sem comorbidades. A explicação do médico é que durante a gravidez o quadro da doença pode ser mais grave quando a mulher é infectada com o vírus. “O risco de complicar e morrer é maior. E pode comprometer a vida do bebê também. O fato de a mulher estar grávida a torna imunodepremida, ou seja, com a defesa do organismo diminuída, pois o feto é como se fosse um transplante de órgão, para fins comparativos. É como um corpo estranho e, para mantê-lo dentro do útero, a imunidade da mulher diminui”, explica.

Quando a gestante possui comorbidades, o risco de agravamento é ainda maior, principalmente naquelas com obesidade mórbida, diabetes ou idade materna avançada (acima dos 35 anos). “Quando o quadro de Covid se agrava, essa gestante precisará ser entubada e submetida a vários medicamentos que atravessam a barreira placentária. Então, antes de realizarmos esses procedimentos, antecipamos o parto. O risco do bebê morrer está mais ligado à prematuridade como em gestações com menos de 28 semanas. O risco de mortalidade é maior”, afirma.

SOBRECARGA DE GESTANTES GRAVES

A orientação do médico obstetra para que todas as gestantes tomem as vacinas contra Covid-19 vem da experiência clínica diante da pandemia. Inoue ressalta o quanto a variante P1 do coronavírus é mais agressiva.

Dados estatísticos do HU mostram que em abril de 2020 nenhuma paciente gestante foi atendida com registro de diagnóstico de infecção pelo Covid. Já no mesmo período de 2021 foram nove gestantes. “Neste ano, estamos com sobrecarga de gestantes graves. Os atendimentos dessa população aumentaram mais de 50% aqui no HU. Todos os dias temos quadro de gestantes com Covid positivo, diferente do ano passado quando eram casos isolados. Por isso eu digo que é muito importante vacinar”, afirma.

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MATERNIDADE MUNICIPAL

O obstetra e ginecologista Eduardo Cristofoli Silva, que atua na Maternidade Municipal Lucilla Balallai, em Londrina, onde nascem por mês cerca de 250 bebês, acredita que um dos fatores que podem gerar medo entre as gestantes na questão das vacinas é porque algumas (as de vírus vivo) são proibidas durante a gravidez, como a de rubéola.

“A pandemia coloca algo novo para elas, com vacinas desenvolvidas com tecnologias mais avançadas, em um ritmo mais acelerado. Assim, algumas pacientes pensam que não devem se vacinar, mas temos um calendário de imunização muito importante para as grávidas. As vacinas diminuem as taxas de transmissão de doenças para a criança assim que ela nasce, sem falar na proteção da mãe. Elas devem seguir as orientações desses grupos regulares porque eles avaliam o risco benefício mais favorável a cada grupo. Nas gestantes com comorbidades o risco de se vacinarem contra Covid é menor do que o de não estarem imunizadas”, diz.

Imagem ilustrativa da imagem Dupla insegurança para gestantes: risco da Covid e o medo da vacina
| Foto: Folha Arte

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