Brasília - Após mais de seis horas de sabatina, o advogado Cristiano Zanin teve seu nome aprovado pelo Senado para ocupar a vaga de Ricardo Lewandowski como ministro do STF (Supremo Tribunal Federal). Em votação no plenário da Casa, o indicado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teve 58 votos favoráveis e 18 contrários à indicação. Antes, Zanin havia passado por sabatina na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e teve o nome aprovado por 25 votos a 5.

A esperada interação entre Cristiano Zanin e o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) na sabatina girou em torno da possibilidade de o advogado julgar processos da Operação Lava Jato e ocorreu sem sobressaltos.

O advogado disse que irá analisar caso a caso antes de se declarar impedido ou suspeito.

"Num passado recente, quase tudo o que funcionava em varas especializadas criminais muitas vezes recebia a etiqueta de Lava Jato. Isso não é para mim um critério para um controle jurídico, mas sim aquele que a lei prevê, que é analisar as partes e o conteúdo", afirmou.

"Uma vez identificada uma hipótese de impedimento e suspeição, não terei o menor problema em declarar o impedimento ou a suspeição e não participar do julgamento."

Zanin e Moro têm rusgas desde que o advogado defendeu Lula na Lava Jato, da qual Moro era juiz.

Durante a sua carreira como advogado de Lula, Zanin ficou conhecido por questionar a imparcialidade dos juízes que julgavam as ações contra o presidente, muitas vezes apontando o que considerava serem relações suspeitas.

Lula teve condenações anuladas porque o Supremo considerou parcial o ex-juiz Sergio Moro, a partir de um recurso apresentado por Zanin.

Na sabatina, Moro afirmou a Zanin que faria perguntas duras, mas que não se tratava de questões pessoais. Ele pediu, por exemplo, que ele detalhasse a sua relação com o presidente Lula e se ele foi, de fato, padrinho de casamento do petista com Janja.

"[A proximidade] vai além da relação como advogado particular?", indagou. Moro também questionou se ele atuou na revisão do acordo de leniência da JBS como advogado e se, nesse caso, ele se daria por impedido em julgar a revisão de acordo de empresas na Operação Lava Jato.

Ele respondeu a mesma coisa, que irá analisar possibilidades de impedimento e suspeição caso a caso.

Zanin afirmou que não foi padrinho de casamento de Lula, mas que preza pela relação que tem com o presidente construída ao longo dos últimos anos. Apontou, porém, que só esteve pessoalmente neste ano com o petista ao ser indicado para o Supremo, em local que estavam outros auxiliares de Lula.

"A minha relação tem esses contornos. Jamais vou negá-la. Ao contrário, sou grato ao presidente Lula por ter indicado o meu nome ao Supremo Tribunal Federal", disse.

De acordo com a lei, um magistrado é impedido de julgar processos nos quais ele, seu cônjuge ou um parente tenham atuado —ele é sócio da esposa, Valeska Teixeira, em seu escritório. Na sabatina, ele disse que irá se declarar impedido nesses casos, de acordo com a lei.

A questão da suspeição é mais subjetiva. O juiz deve se declarar suspeito se, por exemplo, for amigo íntimo ou inimigo capital de uma das partes.

Moro quis saber, ainda, sobre como o indicado se manifestará, por exemplo, a respeito de descriminalização de drogas para consumo pessoal.

O indicado afirmou que, nesse caso, há um processo a ser julgado no STF e ele, se ele for aprovado, não pode se manifestar sobre isso, já que juízes não podem comentar sobre ações em tramitação.

Mas disse, porém, que a doutrina aponta que deve-se analisar se "é razoável determinada proibição para um caso concreto".

Zanin é amigo de Lula e advogou para ele em processos da Lava Jato, mas também tem um histórico de atuação como representante jurídico de grandes empresas e de outros políticos.

A proximidade com o presidente levantou críticas à indicação entre opositores e em círculos do mundo jurídico, mas o advogado tem a aprovação de ministros do STF e de grande parcela de políticos.

Ao longo da semana passada, o indicado de Lula fez um périplo pelos gabinetes do Senado para se aproximar dos parlamentares e angariar apoio mesmo entre evangélicos e opositores do atual governo.

No último dia 15, o senador Veneziano Vital do Rego (MDB-PB) leu seu relatório sobre a indicação de Zanin, e afirmou que o advogado atende aos pré-requisitos para ocupar a vaga.

Veneziano ressaltou os artigos publicados e a carreira dele de 25 anos como advogado empresarial, internacional, na área de comunicação e eleitoral, além da "construção e manutenção de nossa jurisprudência constitucional, por meio da subscrição de várias Reclamações Constitucionais, a fim de velar pela autoridade das decisões da Suprema Corte".

A imagem de um garantista convicto conquistada nos embates com o Moro e outros integrantes da Lava Jato é um dos principais fatores que deixaram o governo Lula otimista para a aprovação fácil de Zanin no Senado.

Com parte dos senadores investigados e outra parte em busca de blindagem para evitar problemas judiciais, a avaliação é que a postura jurídica de observar com atenção o respeito às garantias dos investigados terá grande peso no voto da maioria dos parlamentares.

Na articulação para ser aprovado, o advogado contou com a ajuda de ministros do STF que têm boa relação com o mundo político, como Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, e até dos indicados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a corte, como Kassio Nunes Marques e André Mendonça.