O debate sobre a possibilidade de se implantar a chamada “tarifa zero” no transporte coletivo de Londrina começou a movimentar o cenário público novamente. A intenção, dessa vez, vem na forma de um projeto de lei. O PL 224/23 é assinado pelo presidente do Legislativo, Emanoel Gomes (Republicanos), e está em fase inicial de tramitação junto aos vereadores, sem previsão de ir a votação no plenário. A meta é chegar na gratuidade integral de 2027 em diante.

A Comissão de Justiça, Legislação e Redação tem até 14 de dezembro para se manifestar quanto aos aspectos constitucionais do texto. Em seguida, o objeto da matéria será analisado pelos parlamentares de duas comissões: Finanças e Orçamento e Política Urbana e Meio Ambiente.

Ofertar – ou ao menos prometer – ônibus de graça ao cidadão não é novidade por parte da classe política, seja em Londrina ou Brasil afora. De acordo com arquiteto e urbanista e professor colaborador de Planejamento de Transportes da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Thiago Neri, são mais de 60 municípios no Brasil com esse tipo de serviço atualmente colocado em prática.

SÃO CAETANO ACABA DE LANÇAR

Segundo o acadêmico, no entanto, a maior parte dessas cidades têm porte menor em comparação com Londrina. Os centros que estão “menos distantes” em termos de população são Caucaia, no Ceará (355,6 mil habitantes), Maricá, no Rio de Janeiro (197,2 mil habitantes), e, mais recentemente, São Caetano do Sul, em São Paulo (165,6 mil habitantes), que começou a operar a iniciativa agora em novembro.

“Esse exemplo [do projeto de lei] de Londrina é muito parecido com o que aconteceu em Vargem Grande Paulista [na Região Metropolitana de São Paulo], que o prefeito de lá também implementou medidas, por exemplo, a partir de receitas obtidas a partir de multas de estacionamento, taxas cobradas de empresa no lugar do vale-transporte, publicidade nos ônibus, terminais, pontos de ônibus, locação de lojas nos terminais. Isso viabilizou a cobertura dessa parte do transporte coletivo que antes era paga pela tarifa.”

A proposta de Gomes lista 10 possibilidades para bancar o modal, desde a utilização de créditos de carbono até mesmo “contribuições voluntárias de empresas e cidadãos”, passando ainda pela reversão de multas de trânsito, recursos obtidos por meio do estacionamento rotativo da Zona Azul e dotação orçamentária própria.

Entretanto, a complexidade da política pública vai além de efetivar maneiras de custeio da gratuidade, argumentou Thiago Neri. “Obviamente que, quando se implementa a tarifa zero, tem um aumento muito significativo de demanda. E continuar a atender essa demanda é um dos principais desafios, talvez até maior do que o de conseguir as fontes de financiamento.”

“A pandemia [de covid-19] reforçou a necessidade de discutir isso, porque a gente teve uma queda abrupta [do número] de usuários do transporte coletivo. Essa queda já vinha acontecendo e a pandemia ‘ajudou’ isso a piorar”, acrescentou o professor da UEM.

Também há relação direta do 224/23 com debates como o do projeto de lei do Sistema Viário Básico (PL 63/23). O texto em tramitação é um dos complementares ao Plano Diretor de Londrina e, ao passar pelo Conselho Municipal de Planejamento e Gestão Territorial, em maio, recebeu parecer parcialmente desfavorável do CMPGT por não incluir mais dispositivos voltados à mobilidade urbana.

“Conforme você aumenta a infraestrutura viária, você induz a demanda [pelo transporte individual, principalmente carros]. É um negócio que não vai acabar nunca. Amplia uma via hoje, daqui alguns anos ela vai precisar ser novamente ampliada, ou achar uma nova alternativa para ela”, afirmou o especialista.

AJUDA DE CURITIBA E BRASÍLIA

Em entrevista à imprensa a respeito do PL, Emanoel Gomes disse que, através de uma frente parlamentar a ser formada para discutir a tarifa zero, vai bater às portas dos governos estadual e federal para pedir ajuda financeira ao eventual programa. “Londrina não recebe nenhum tipo de subsídio do governo do estado”, relembrou, mencionando o aporte que é feito pelo Palácio Iguaçu no transporte coletivo da Região Metropolitana de Curitiba.

PL INCONSTITUCIONAL?

Porém, projetos como o do presidente da Casa costumam ter dificuldades em prosperar por criarem uma despesa adicional à prefeitura – posição que tende a ser levantada já pelos advogados do Legislativo que emitem parecer para subsidiar o voto dos membros da Comissão de Justiça. “Acredito que isso poderá acontecer. Acontecendo isso, estamos dispostos a pausar o projeto e fazer com que o Executivo entenda essa necessidade”, reconheceu o vereador.