Brasília - Na primeira sessão de julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre depredação dos prédios dos três Poderes nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, os ministros Alexandre de Moraes e Kassio Nunes Marques divergiram em seus votos na condenação de Aécio Lúcio Costa Pereira. O caso dele é o primeiro de quatro que serão julgados até esta quinta-feira (14).

Moraes disse que Pereira, ex-funcionário da Sabesp (companhia de saneamento de São Paulo) preso em flagrante dentro do Congresso pela Polícia do Senado, deve cumprir uma pena de 17 anos, sendo 15 anos e 6 meses em regime fechado. Já Nunes Marques, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), votou por uma pena de 2 anos e 6 meses, em regime aberto, descontado os meses que ele já ficou preso. Isso, acrescentou Kassio, se a maioria do Supremo entender que é de responsabilidade da corte julgar o caso. Para o ministro, o processo deveria ser levado à primeira instância.

A sessão desta quarta foi suspensa e será retomada nesta quinta (14), com o voto de Luciano Zanin. Cada uma das quatro ações será julgada individualmente.

Alexandre de Moraes votou pela condenação pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada. Kassio Nunes votou pela absolvição dos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado e associação criminosa.

Kassio costuma votar de forma divergente da maioria dos ministros na análise do recebimento das denúncias apresentadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República) pelo 8 de janeiro.

DOMINGO NO PARQUE

Em seu voto, Alexandre de Moraes também se manifestou por condenação de 100 dias-multa, cada um deles no valor de um terço do salário mínimo - em valores atuais, mais de R$ 40 mil. Ao responder à defesa de Pereira, o ministro disse que "o terraplanismo e o negacionismo obscuro de algumas pessoas fazem parecer que no dia 8 de janeiro tivemos um domingo no parque".

"As pessoas vieram, pegaram um tíquete como fazem no Hopi Hari em São Paulo ou na Disney, [e disseram] 'agora vamos invadir o Supremo e vamos quebrar uma coisinha aqui, agora vamos invadir o Senado, vamos invadir o Palácio do Planalto, agora vamos orar da cadeira do presidente do Senado'. É tão ridículo ouvir isso que a Ordem dos Advogados do Brasil não deveria permitir", ironizou Moraes.

O ministro afirmou que a responsabilidade para julgar o processo é, sim, do STF e não de instâncias inferiores, como alega a defesa. Também afirmou que ele não é suspeito de julgar o caso, como também apontam os advogados.

Moraes concordou com o entendimento da PGR (Procuradoria-Geral da República) que não é necessário descrever a conduta de cada um dos réus do 8 de janeiro, já que se trata de um crime praticado por uma multidão. "Não há nenhuma dúvida no direito penal da existência e dos elementos que constituem crime", disse Moraes.

O ministro rebateu os argumentos de que não havia intenção dos acusados de provocar um golpe de Estado. "Nas próprias mensagens que vários réus que foram presos em flagrante postaram o fizeram com intuito de derrubar o governo democraticamente eleito em 2022 e que havia tomado posse em 1º de janeiro de 2023", defendeu.

Moraes iniciou sua fala após o advogado Sebastião Coelho da Silva, que representa o primeiro réu em julgamento, ironizar a existência de uma tentativa de "golpe sem armas" para pintar os atos como um simples protesto. O defensor disse que seu cliente foi visto com "ânimo descontraído" e que "na cabeça dele", a invasão era "uma vitória".

Coelho da Silva, que é desembargador aposentado, já acusou o ministro de "inflamar" o Brasil no discurso de posse em 2022 como presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Aécio Lúcio Costa Pereira tem 51 anos, é residente de Diadema (SP), e gravou um vídeo sentado na mesa diretora do Senado usando uma camiseta que dizia "intervenção militar federal". Ele é acusado pela PGR de crimes como associação criminosa armada, abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, além de dano qualificado pela violência e grave ameaça, com emprego de substância inflamável, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo para a vítima.

Em interrogatório após ser preso, Pereira disse que esteve em Brasília a convite de uns amigos que acampavam em frente ao quartel do Exército em São Paulo, próximo ao parque Ibirapuera, do grupo Patriotas.

Afirmou que seu objetivo era "lutar pela liberdade" e não sabia dizer se o procedimento para chegar a isso seria depor o presidente Lula. Negou que tenha danificado bens do Congresso.

Além de Aécio Costa Pereira, o STF pretende julgar outros três réus dos ataques às sedes dos três Poderes.

O VOTO DE NUNES MARQUES

Em seu voto, Kassio Nunes Marques citou que "embora o acusado tenha negado a prática de delitos, as fotos e vídeos por ele postados por meio de seu aparelho de telefone celular, por meio de áudio e texto, valorados em conjunto indissociável com a prova testemunhal, demonstra o contexto da criminalidade em concurso de pessoas", afirmou.

"Ele aderiu aos manifestantes que ingressaram mediante violência no prédio do Congresso, concorrendo para os danos e a deterioração do patrimônio tombado do Congresso Nacional", acrescentou o ministro.