Em uma das audiências públicas mais concorridas dos dois anos e meio dessa legislatura, manifestantes lotaram a Câmara Municipal de Londrina (CML) na noite de segunda-feira (21) para, em sua esmagadora maioria, marcarem posição contra o projeto de lei 203/21, de Mestre Madureira (PP).

Hoje tramitando na versão de um substitutivo, o PL permite que organizações da sociedade civil sem fins lucrativos assumam a gestão de campos de futebol, quadras poliesportivas e “demais bens e espaços públicos similares destinados ao esporte, lazer e cultura” – conforme sua própria redação.

A versão original da matéria liberava a exploração desses locais até mesmo por pessoas jurídicas. A atual minuta segue abrindo margem para a cobrança de taxas – e reserva uma “cota” de 30% a beneficiários de programas governamentais de auxílio de renda.

O parlamentar voltou a defender sua medida ao sustentar que ela vai “estancar problemas” como depredação, mau uso e vandalismo registrados cotidianamente em próprios públicos cuja gestão e manutenção – ao menos em tese – são de responsabilidade da Prefeitura de Londrina.

“As pessoas passavam de sábado para domingo fazendo orgia naquele local”, criticou o vereador ao dar um exemplo sobre o Centro Esportivo Maria Cecília, na zona norte. Vaiado ao fim de seu pronunciamento, Madureira disse estar “de coração aberto para ouvir”. “Encontrei muitas pessoas com o projeto original, que não tem nada a ver com o de hoje”, comentou.

“NINGUÉM VAI TER PAZ”

Em um movimento com início de mobilização no domingo (20), por meio de manifestação no Residencial Vista Bela (região norte), o coro dos descontentes foi formado majoritariamente por jovens oriundos da cena local do hip hop. Em discursos, rimas – e até um jogral –, o grupo vociferou contra o texto, pedindo que o vereador “rasgasse” a proposta. Os poucos que se dispuseram a abraçar a ideia tiveram sua fala interrompida em diferentes oportunidades.

Uma das queixas dos moradores que querem o arquivamento é que, além de não pedir parecer do Conselho Municipal de Política Cultural (CMC), a proposição feriria dispositivos da lei 12.230/14. A norma regulamenta em Londrina as atividades dos artistas de rua, autorizando a “permanência transitória no bem público, limitando-se a utilização ao período de execução da manifestação artística.”

“Pelo menos da minha parte, se esse projeto de lei for aprovado e executado, ninguém aqui na Câmara vai ter um minuto de paz”, afirmou no microfone uma das integrantes da Batalha de Rima de Londrina, Ligia Braga. “Se não for o bastante vocês verem e ouvirem nosso descontentamento, a gente dorme aqui na frente, a gente faz batalha de rima dentro da Câmara”, acrescentou ela.

“A gente está tendo que lutar por um espaço que é nosso [...] Esse espaço é a salvação para muito jovem, esse espaço é o descanso para muita gente que trabalha a semana toda”, argumentou o presidente do Conselho Municipal de Políticas Públicas para a Juventude, Ismael Frare.

THUM MUDA VOTO; FÚ ATACA PL

Além de Madureira, seis vereadores estiveram na agenda: Beto Cambará (Podemos), Chavão (Patriota), Lenir de Assis (PT), Mara Boca Aberta (Pros), Matheus Thum (PP) e Roberto Fú (PDT). Entre eles, três (Assis, Boca Aberta e Fú) já haviam votado contra o PL quando ele passou em primeiro turno, no início de julho, com 14 votos favoráveis e 5 contrários – na ocasião, as galerias tinham mais pessoas que defendiam a matéria.

Thum, todavia, voltou atrás na audiência e decidiu mudar seu voto. O texto ainda será levado a segunda turno – que, por ora, não tem data para acontecer. São necessários 10 votos para a aprovação.

Fú reforçou ser “totalmente contra” a iniciativa. Para ele, “a quebradeira da praça” evidencia a “incompetência da nossa administração”. “Se o projeto fosse meu, eu levantaria nesse momento e rasgaria [...] Vamos regulamentar algo errado que já está acontecendo há muitos anos na cidade. Nós temos campos [de futebol] na cidade que o pai e a mãe chegam com a criança e se deparam com um cadeado no portão.”

“SE PRECISAR, FAÇO SÓ DO ESPORTE”

“Eles não estão entendendo a realidade do projeto, é lamentável isso. Se precisar, eu cancelo o projeto e faço outro só do esporte, não tem nenhum problema”, declarou Madureira em entrevista após o encontro, ponderando que, para isso, “precisa ouvir” quem o procurou para a implantação da medida.

Em parecer dado ao PL ainda em maio de 2022, a Fundação de Esportes de Londrina escreveu que “tal proposta deve ser acompanhada pelo incremento de pessoal ao quadro de servidores” da própria FEL. “Se tem a regulamentação, vai poder fiscalizar. Se não tem a lei, vai continuar igual como está. A fundação realmente precisa de melhorias”, reconheceu o autor.

As sugestões do público que foram formalizadas durante a audiência podem se tornar emendas – mas isso só se “apadrinhadas” por algum dos vereadores ou pelas comissões permanentes.