O art. 1º da Constituição Federal estabelece que o Brasil “constitui-se em Estado Democrático de Direito”. Dizer isso é afirmar que neste país vive-se regido por leis feitas democraticamente por quem detém competência constitucional para fazê-las, mas fazê-las sempre em nome do povo, que é titular do poder estatal e observando princípios democráticos fundamentais, como a proteção de minorias sociais.

Imagem ilustrativa da imagem O Estado de Direito e as fofocas sobre as urnas
| Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE

Estabelecida essa premissa, a de que vivemos em um Estado de Direito democrático e não em um estado de fofoca com opiniões vazias e percepções alucinadas da realidade, é possível que se possa fazer uma análise, primeiro jurídica e depois moral ou política, dos ataques feitos constantemente às urnas eletrônicas.

O primeiro aspecto a ser salientado é o de que para haver algum tipo de mudança no procedimento de apuração de votos é necessário que haja lei estabelecendo tal mudança, portanto, de nada adianta centrar fogo no TSE ou STF. Talvez os críticos do momento não tenham lido esta parte da Constituição, ou se quer lembrem que existe uma Constituição, mas no Estado de Direito o principal responsável por fazer leis é o Poder Legislativo.

Vale lembrar que a proposta de alteração do mecanismo eleitoral não foi aprovada no Congresso e, por isso, só pode ser retomado ano que vem, na próxima sessão legislativa. Do ponto de vista jurídico é isso, estão olhando para o Poder errado, um erro infantil, bobinho, coisa de quem não entende muito bem das coisas da vida real mesmo.

Do ponto de vista da lógica, da moral e da política, é possível dizer o seguinte: o presidente da República é chefe da Polícia Federal, da Abin e das Forças Armadas, tem em suas mãos todas as ferramentas jurídicas e as possibilidades de inteligência para, em caso de suspeita de fraude, exigir uma apuração adequada sobre as urnas, a pergunta é, por que não fez? E, vejam, não fez! Qual é a apuração feita pela PF? Se existe tem que vir a público e apresentar. O TSE faz provas públicas da capacidade das urnas.

Em lugar de determinar apurações sérias, o atual mandatário do Poder Executivo da União parece um fofoqueiro que não tem prova de nada, mas tem certeza de tudo.

Se tem dúvidas de algo em relação à urna, deveria apresentar provas produzidas por órgãos capazes de apurar, com seriedade, a higidez das urnas. Se não tem provas, por favor, pare de encher a paciência dos demais poderes e de nós, cidadãos.

O voto é a única forma de manifestarmos a vontade popular, qual a vantagem para o país de que o procedimento eleitoral seja desacreditado sem nenhuma prova, sem inquérito, sem investigação? Uma observação, não adianta dizer que há provas, na vida real, dos adultos que manejam o Direito, prova é aquela que tem validade jurídica, portanto, o vídeo que foi repassado por whatsapp não vale para nada, é imprestável do ponto de vista da lei. Na vida real prova tem que ser válida, a nossa opinião ou suspeita não valem nada.

É importante que se diga que, assim como outros passaram, o atual mandatário passará, mas as eleições continuarão, nossa vida continuará, o país continuará. Se há suspeita de fraude, que se instaure, se já não era o caso de ter instaurado investigações sérias sobre o tema. Se não há uma suspeita sequer de fraudes, e não há, então, senhor presidente, por favor, deixe o país voltar a se preocupar com problemas de verdade, como inflação, desemprego e segurança.

A insensatez de quem trata o cargo de presidente da República como se fosse um espaço de faz de conta é o preço que se paga, cotidianamente, por se ter políticos que estão mais preocupados com a manutenção dos seus cargos do que com os reais problemas do país.

Se você que lê esta missiva é mesmo um patriota, deixe de ser um bocó que espalha fake news e use o teu intelecto para pensar em soluções para este grande buraco onde nos metemos já faz alguns anos. Fazer arminha com a mão e xingar quem pensa diferente de você de comunista não resolve, está aí o preço do leite e do combustível para provar. Talvez seja o caso de realmente pensar em algo sério e razoável para a melhoria da vida em coletividade e, para isso, é necessário que se respeitem as instituições, em especial àquelas que existem há muitos anos.

Flávio Pierobon, advogado e professor universitário

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