Quando um miserável, um deficiente ou um sem-teto é ignorado de tal forma que passa a ser apenas simplesmente uma figura na paisagem, ele se torna invisível. Fato atribuído aos frágeis, idosos, vítimas de adversidade, pedintes, pessoas com vulnerabilidade social. Mesmo aqueles que desempenham funções importantíssimas como coveiros e catadores de lixo tornamo-los invisíveis. Pior ainda é que muitos deles também são invisíveis para o Estado.

O termo “invisível” é baseado na obra de um personagem criado por Ralph Ellison, década de 50. Pessoas continuarão invisíveis para muitos, enquanto houver desigualdade, conflitos e divisões. Isso faz com que as pessoas não enxerguem o próximo como ele é de fato. Somente são visíveis aqueles dentro dos limites que rodeiam seus círculos sociais.

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É bom lembrar que todos somos feitos da mesma matéria prima, moléculas de carbono, hidrogênio e nitrogênio. Alguns destes aglomerados de moléculas tiveram mais oportunidades para estudar e ter um emprego com mais vantagens. E na nossa viagem de autoconhecimento encontramos episódios tristes, comoventes, irônicos. Muitos desses absurdos fazem com que muitas vezes não vejamos o ser humano à nossa frente. Isso porque não fomos preparados para saber que nada somos e só fazemos parte do contexto geral.

A cegueira coletiva importa mais do que os fatos que estão à nossa frente. É a nossa vida, com desencontros inusitados, uma ilusão com desinteresse pelo próximo - tão próximo. O qual importa mais do que os fatos que realmente queremos ver. Mas para chegarmos em algum lugar de bem-estar é necessário acreditar no impossível e começar a enxergar o que nos é invisível.

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O que sente o “ser invisível”, tido como sem substância, uma voz desincorporada? O que pode ele fazer? O que dizer quando seus olhos não nos enxergam? Às vezes tão treinado em ser despercebido que, entorpecido, não sente mais.

O orgulho assume tons diversos e pode passar a se chamar soberba. Mas a cegueira social se disfarça dentro nos nossos sentimentos e a assimilamos para nós mesmos, para não vermos os invisíveis. Mas existe uma realidade e a soberba é a rainha de todos os pecados.

Nossa ignorância coletiva pode as vezes nos fazer pensar, dentro da insegurança ou por medo, que alguém é invisível porque sua existência incomoda meu ego. Quero sentir que, em algum momento, posso ser melhor do que o outro. Mas, seríamos melhores se fossemos misericordiosos e não insensíveis. Na verdade, todos os seres humanos nascem livres em dignidade e em direitos. Mas será? A fraternidade nada mais é do uma das maiores hipocrisias da sociedade. Acredite em um mundo melhor, mesmo que isto não exista. Saia deste altar ilusório e veja a guerra ao seu lado, e preocupe-se menos com a guerra da Rússia que está tão longe. Acreditar em um mundo melhor não é fingir que o desfavorecido não está ao seu lado. Olhe e enxergue-se nele.

O mundo é uma comédia e o Brasil é a parte trágica, onde tanto se fala e nada existe além de grandezas tristes. Dirigentes só olham para si e nenhum enxerga a parte invisível. Parece piada, somos o país de tantos invisíveis com fome, frio, falta de saúde e educação, mas temos carnaval, futebol e Brasília. Rimos da miséria, dos roubos e dos falsos profetas. Agora a Copa do Mundo e tudo fica para depois. País dos invisíveis?

Se não somos eternos, pelo menos poderíamos ser fraternos. Disse T.S. Eliot, Nobel de literatura de 48: “Posso lhe afirmar, que não é para mim que você está olhando, não é para mim que você sorri forçadamente, nem para mim são seus olhares secretos. Acuse, se quiser, aquela outra pessoa, se é que existe, quem você pensava que fosse eu: deixe sua necrofilia alimentar-se da sua carcaça”.

” A soberba do homem o abaterá, mas o humilde receberá honra” (Provérbios 23).

Nelio Roberto dos Reis, professor universitário, Londrina

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