As Olimpíadas confirmaram como adoramos dar palpite em tudo. Sempre entendemos alguma coisa sobre futebol, vôlei e tênis, mas de uma hora para outra também viramos especialistas em badminton, esgrima e ginástica rítmica.

Imagem ilustrativa da imagem ESPAÇO ABERTO - Lula, Bolsonaro e nós, os palpiteiros
| Foto: Isaac Fontana/FramePhoto/Folhapress

Questionamos a derrota da judoca Maria Portela e tivemos certeza que aquele aéreo do Medina foi muito melhor que o do japonês Igarashi. Pedimos VAR em tudo, até nas avaliações dele próprio, com argumentos de quem mal conhece as regras do jogo.

Vira e mexe são debatidas nas rodas de amigos complexas decisões do Supremo Tribunal Federal, como se todos fossem notáveis juristas. É arriscado até para quem frequenta o mundo jurídico opinar quando não se conhece profundamente o processo julgado, mas tem gente defendendo teses acadêmicas sem nunca ter passado em frente a uma faculdade de direito.

Com a pandemia, surgiram os especialistas em tratamento da Covid, mesmo quem mal sabe a diferença entre antibiótico e corticoide, como eu. Travam-se acalorados debates entre donas de casa, empresários, advogados e sorveteiros sobre a eficácia das vacinas, nenhum deles com expertise em imunologia.

Na política palpitamos sem dó nem piedade. A polarização, que implica divisão da sociedade em dois grupos extremistas, ainda aguçou os palpites agressivos e sempre com a razão de um lado só. E normalmente opinamos apenas com base em notícias que recebemos, sem ter a exata noção do que realmente ocorre nos porões do poder.

Imagine um clássico entre Palmeiras e Corinthians em que foi marcado um pênalti duvidoso. Você não assistiu ao jogo, nem viu os melhores lances pela TV. Pergunte a um palmeirense e a um corinthiano, ambos fanáticos, quem teve razão no lance polêmico. Você terá versões diferentes e cheias de calorosos argumentos, mas não descobrirá se o árbitro pisou ou não na bola, nem se houve esquema no vestiário.

Em Brasília é assim também. O jogo acontece lá e não participamos, nem assistimos. No máximo, recebemos informações, via imprensa ou grupos de WhatsApp, de quem “ouviu dizer” e já com a marca de alguma parcialidade. Mesmo assim, como diria Raul, temos sempre a velha opinião formada sobre tudo e não há nada que nos faça mudar de ideia.

Pior: difundimos nas redes sociais aquilo em que acreditamos e o algoritmo trata de alcançar aqueles que pensam do mesmo modo, formando verdadeiras bolhas de pensamento, todas impenetráveis, o que fecha as portas para qualquer diálogo entre ideias diferentes.

Não parece que a divisão ideológica atual ocorre entre direita e esquerda ou conservadores e progressistas, como seria saudável numa democracia. Estamos no meio de duas seitas, o lulismo e o bolsonarismo, com seus seguidores usando antolhos no culto aos seus líderes.

Neste cenário, me permito também palpitar. Lula e Bolsonaro deveriam fazer um favor ao Brasil e não disputar a eleição em 2022. Se tivessem esse raro momento de lucidez cidadã, arrefeceriam os ânimos da nação, desarmando os discípulos extremistas, e nos poupariam de um terrível dilema diante das urnas.

Mas é só um palpite...

Júlio Cesar Rodrigues, advogado

A opinião do autor não reflete, necessariamente, a opinião da FOLHA.

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Língua Portuguesa

7 de agosto de 1843

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