Alguns números assustadores: segundo a edição de 01/11/2021 do Folha de Londrina, a Covid deixou mais de 700 crianças paranaenses com até 6 ano órfãs; de acordo com a revista Lancet (07/2021), são 130 mil as crianças brasileiras que se tornaram órfãs em função da mesma doença.

Constar entre as nações com um dos maiores números de mortos representa uma afronta contra os brasileiros. No entanto, contamos com leis e estatutos modernos que felizmente preveem o bem-estar da população. Em se tratando das mencionadas crianças, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) pode ser compreendido por nós como um farol cuja luz, apesar de mitigada em função de uma tempestade terrível, continua acesa. Não há dúvidas de que mais mortes infelizmente acontecerão, portanto cabe aos setores públicos e civis manterem-se alinhados àquilo que serve como base para a nossa justiça social: a Constituição.

Imagem ilustrativa da imagem ESPAÇO ABERTO - ECA, Fundeb e os órfãos deixados pela covid
| Foto: iStock

Foquemos no ECA. Seu artigo 1º é voltado para “a proteção integral das crianças e adolescentes”. Para tal, no artigo 3º é especificado que para essa parcela da população devem ser asseguradas todas as oportunidades e facilidades a fim de que possam se desenvolver de forma saudável, física, mental, moral, espiritual e socialmente. Tudo isso deve ser proporcionado sem que elas jamais tenham cerceadas tanto a sua dignidade quanto a sua liberdade. A tarefa é hercúlea mas, com finalidades didáticas, podemos dividi-las em setores a fim de que a presente discussão seja mais bem delimitada. Foquemos no campo da educação.

Como é sabido, parte considerável das crianças e adolescentes brasileiros frequentam escolas públicas. Para além da educação científica, lá também recebem uma educação formativa, alimentam-se e contam com o apoio de psicopedagogos(as) que se preocupam não apenas com os seus potenciais de assimilação de conteúdos, mas também de suas condições psiquico-emocionais.

A pandemia não trouxe apenas a morte. Ela também gerou empobrecimento e desestabilização emocional. Diante de uma população empobrecida e fragilizada, de crianças e adolescentes que se tornaram órfãs além dos crescentes níveis de evasão escolar e das dificuldades de sociabilidade provocadas por uma longa quarentena, como é possível fazer valer aquilo que se encontra previsto no ECA? A meu ver, em se tratando do âmbito educacional, reconhecendo a importância do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

Não me refiro a uma simples transferência de recursos. Na verdade, o que defendo é um sistema de valorização e aprimoramento do espaço onde parte considerável das crianças e adolescentes sociabilizam-se, estudam, formam-se, amadurecem, alimentam-se, enfim, passam parte considerável de suas vidas e se preparam para o futuro: as escolas.

Educadores bem-preparados e remunerados poderão oferecer muito mais aos jovens. Escolas bem equipadas, tecnológicas e limpas são convidativas e oferecem a tranquilidade necessária para que possamos minimamente baixar toda essa fervura. A situação dos órgãos é muito grave e a eles a atenção deve ser redobrada. Setores sociais e públicos, sempre em conjunto, devem oferecer os meios para a continuidade formativa deles. É evidente que nada substituirá um ente querido, mas o caminho para a reconstrução de uma vida desestabilizada pode pelo menos ser pavimentada a fim de que a jornada seja menos tortuosa. Reconstruir aquilo que a pandemia destruiu demanda muitas frentes de batalha. É claro que, sozinha, a educação não bastará, mas ela se mostra como uma importante peça-chave enquanto no atendimento àquilo que prevê o ECA.

Paulo Sérgio Micali Junior, professor em Londrina

A opinião do autor não reflete, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina

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