Não é de hoje que Olavo de Carvalho, o chamado “guru” dos bolsoraristas raiz (mais do que do bolsonarismo), tem emitido sinais de insatisfação com os rumos do governo, presidido por Bolsonaro. Atributos como “burro”, “covarde”, ou “prefeito do interior”, se mostraram recorrentes. Já em 2019, pedia que “as dezenas de seus alunos que ainda estavam no governo, o abandonassem imediatamente”!

Imagem ilustrativa da imagem ESPAÇO ABERTO - Bolsonaro traiu a extrema direita!
| Foto: iStock

Bolsonaro não tem ideologia nenhuma. Isso já é sabido sobejamente. Seus filhos e alguns colaboradores mais próximos é que o apresentaram a Olavo, que de imediato serviu como base “filosófica e moral” do seu governo. Ernesto Araújo e Abraham Weintraub são talvez os maiores protótipos dessa geringonça (usando um termo que caracterizou uma aliança política em Portugal) e que agora dá indícios de chegar ao seu epílogo. Tanto um quanto o outro, revelam-se traídos pela aproximação de Bolsonaro ao Centrão!

A dúvida que não cala é a seguinte: a extrema direita da moral dos costumes não gosta dessas táticas antigas que exponham a velha política do atual governo? Ou o atual governo, aproveitou a extrema direita como seu núcleo duro, para alçar voo e depois mostrar o que sempre foi? Em meu entender, as duas hipóteses sublinham o óbvio: Bolsonaro traiu a extrema direita. Embora essa traição feita em nome da governabilidade não seja inédita no país, o atual presidente arrisca-se a perder uma fatia substancial que o poderia garantir no segundo turno.

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Contudo, a extrema direita não é ingénua nem inocente neste processo. Ela viu em 2018, num capitão reformado, numa ojeriza nacional ao PT e no entusiasmo político de uma parcela das Forças Armadas (o vice é general), a possibilidade real de ascender ao poder e governar! É de se sublinhar isto, pois tanto aqui quanto na maioria dos países democráticos pelo mundo afora não é fácil esse grupo extremista vencer uma eleição! Ou o faz através de golpes (mesmo com verniz democrático) ou através de caronas em pseudodemocráticos populistas. Foi o que aconteceu no Brasil. Bolsonaro nunca teve proposição. Apenas oposição. A ele mesmo, à política, ao país, à civilização!

Por outro lado, a extrema direita absolutiza o mercado como maior gerador de riqueza, defende o Estado mínimo e, portanto, com unhas e dentes, o liberalismo econômico; porém, despreza os direitos e as liberdades individuais. Bolsonaro navegou nessa onda, flertando com o fascismo, elogiando a ditadura e adotando uma pauta conservadora na defesa da família, da religião e da “escola sem partido”! Era o trilho por onde os extremistas viam o acesso ao Planalto. E assim foi.

Bolsonaro os traiu. Não é conservador nem progressista; não é contra a corrupção (acabou com a Lava Jato); defende a sua família acima de tudo, e se diz evangélico segundo as suas conveniências eleitoreiras. A postura negacionista também já está incomodando a muitos que tendo-lhe hipotecado apoio, o veem ir longe demais. Portanto, malgrado continue falando para uma minoria de fãs, mais do que seguidores, e consiga aparentemente mantê-los consigo, o presidente vai amargando a fuga dos que esperavam dele muito mais do que lhes ofereceu. Se Moro vai acolher essa gente, saberemos nos próximos meses.

A extrema direita é anticorrupção. Ela acredita que se deva governar com mão firme, prescindindo de algumas instituições (que atrapalham) e na sua ótica, “bandido bom é bandido morto”! Geralmente negro e pobre! Em 2021, esse grupo sentiu-se próximo de conseguir o que almejava. Mas Bolsonaro foi fraco! Não perdoarão ao capitão que pediu socorro a Temer para escrever uma carta à nação! Como não lhe perdoarão que tenha recorrido aos mesmos métodos de governantes anteriores para se segurar num Congresso que vota em causa própria mais de cinco bilhões de reais para o Fundo Eleitoral. Com a bênção do Palácio!

Bolsonaro não estava preparado para o tamanho da missão presidencial. Ao se rodear de extremistas no seu governo impôs ao país um desmonte considerável de seu arcabouço institucional, nomeadamente na Educação e no Meio Ambiente. Forçado a recuar inúmeras vezes pelos órgãos judiciais competentes, frustrou essas forças, que desde o início o apoiaram quase sem reservas. A extrema direita queria mais. Bolsonaro, em nome da sobrevivência momentânea, não lhes entregou esse up!

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese de Londrina

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