Londrina sempre se destacou no cenário nacional em relação às atividades da construção civil, demonstrando grande capacidade de inovação e comercialização.

O Paraná é considerado o grande celeiro do Brasil, batendo recordes de produtividade, e gerando riqueza para o país.

Ambas atividades, no entanto, não escapam do que se verifica nas demais atividades privadas e públicas, que é o abuso no exercício de seus direitos. Na área urbana tem-se a especulação imobiliária, que prejudica o planejamento municipal adequado, e na área rural tem-se a grilagem, queimadas etc.

Ocorre que mesmo atividades consideradas legais podem trazer consequências negativas para a coletividade, e por isso, chamam para uma discussão racional e civilizada sobre o tema. Afinal, truculência e desrespeito nunca levaram nenhuma sociedade a se desenvolver ao longo da história.

No perímetro urbano de Londrina é possível verificar extensas plantações de soja, milho etc. Encravadas entre escolas, residências e comércio em geral, desfrutam de toda a infraestrutura que o poder público construiu, e que tem um custo de manutenção, sustentada essencialmente pela arrecadação do IPTU ( Imposto Predial e Territorial Urbano) e do ISS (Imposto Sobre Serviços).

Os proprietários onde ocorrem as plantações, apesar de suas propriedades estarem localizadas na área urbana, não pagam IPTU e sim, ITR, cujo valor é bem menor. Os tribunais superiores do Brasil já afirmaram que será a atividade desenvolvida no local que irá determinar qual tributo sobre a terra irá incidir, e não sua localização.

Este é um primeiro aspecto que se propõe ao debate. Haveria justiça fiscal nestes casos? A repartição da conta para manutenção da infraestrutura urbana se mostra adequada?

Outro ponto que a sociedade londrinense deve se ater é o uso de agrotóxicos nestas plantações.

É sabido o potencial prejuízo que estes produtos causam à saúde humana, e sua utilização é controlada, com necessidade de utilização de equipamentos adequados, logística reversa das embalagens etc.

Ao aplicar estes produtos na área urbana, a natureza se encarrega de espalhar boa parte dele na vizinhança, com os ventos.

Estes dois pontos parecem ser suficientes para se iniciar uma discussão séria, como propõe Ronald Dworkin em “Taking Rights Seriously”. O renomado jurista e filósofo estadunidense afirma que a ideia de justiça não se baseia somente no campo do positivismo jurídico (mera aplicação da lei), mas também com base nos diversos direitos dos integrantes da sociedade. Ou como afirma Eduardo Carlos Bianca Bittar, “o direito não pode simplesmente ser visto como fruto da legalidade estrita, mas sim como instrumento que realiza valores e expectativas de justiça que lhe são anteriores”.

Assim, o direito à justiça fiscal e o direito à saúde e o meio ambiente equilibrado devem ser variáveis no processo de decisão da sociedade sobre qual atividade deve ser empreendida no âmbito urbano.

Se por um lado a livre iniciativa e o direito de propriedade são postulados da república, eles não estão sozinhos no sistema jurídico, mas convivem com outros direitos igualmente relevantes.

Cenário diferente seria o estímulo a atividades agropecuárias familiares de baixo impacto, realizado nas franjas urbanas, como política pública de oferta de alimento sem veneno, diminuição do preço por ausência do pagamento de frete e atuação do “atravessador” e geração de emprego e renda para esta população, tema que se pretende propor à discussão, em outro momento neste canal.

Miguel Etinger de Araujo Junior, advogado e membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB Londrina