São Paulo - Canetas vaporizadoras, óleos comestíveis, lubrificantes íntimos, e haxixes do tipo dry e ice são algumas novas formas de consumo de maconha para além dos cigarros da erva, enrolados em papel seda, que dominam o imaginário quando o assunto é a planta da família Cannabis sativa.

Elas têm se popularizado no Brasil desde 2015, ano em que o STF (Supremo Tribunal Federal) deu início ao julgamento do Recurso Extraordinário 635659, que trata da descriminalização da posse de drogas para consumo pessoal. O julgamento deve ser retomado nesta quinta-feira (17).

Oito anos depois da primeira sessão do caso, quatro ministros votaram a favor de alguma forma de descriminalização do uso de drogas: Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.

Três deles restringiram suas decisões apenas à maconha. Barroso definiu como critério provisório para diferenciar traficantes de usuários a posse de 25 gramas de maconha ou de seis plantas fêmeas. Moraes ampliou esse critério para até 60 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas, mas ressaltou que a quantidade não será o único critério para verificar a condição de usuário.

A medida quantitativa apontada pelos ministros faz referência à maconha in natura, ou seja, suas folhas e flores, mas ela não se aplica aos outros formatos de consumo que vêm ganhando tração no mercado de uso adulto não medicinal brasileiro, como as canetas vaporizadoras ou vapes - além de novos tipos de haxixe.

Nos EUA, onde 20 Estados já legalizaram e regularam o uso recreativo de maconha e outros 18 permitem uso medicinal da cânabis, pesquisas apontam que o consumo de folhas e flores tem diminuído entre jovens adultos enquanto o uso da substância em cigarros eletrônicos vem aumentando.

Na ausência de dados de consumo no Brasil, as apreensões policiais indicam o aumento de circulação dessas outras formas de uso de maconha.

Para o psiquiatra Luís Fernando Tófoli, professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), o resultado do julgamento até aqui não deixa claro o que aconteceria com pessoas que fizessem outros usos de maconha. "Isso pode gerar insegurança jurídica. E uma pessoa presa com uma bolinha de haxixe pode entrar na Justiça alegando que a quantidade de THC na substância apreendida é menor do que aquela em 60 gramas de maconha in natura."

A perita criminal Silvia Cazenave, coordenadora do Grupo Técnico de Toxicologia do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo, avalia que a atual variedade de formas de consumir maconha poderia ser medida a partir da concentração de THC em cada produto. "Não dá para aplicar a mesma medida usada para a planta, em gramas, na hora de avaliar um alimento ou um óleo feito a partir da maconha", afirma. "Afinal, um bolo feito com 40 gramas de maconha, por exemplo, vai pesar muito mais do que 40 gramas", ilustra.

Para o juiz Roberto Corcioli, "é natural que as decisões judiciais não abranjam as inúmeras situações que podem surgir da complexidade das relações sociais". Neste contexto, avalia, "casos futuros, com novos elementos, devem ser conhecidos e interpretados também à luz dos pertinentes precedentes, observados os parâmetros anteriormente fixados".

O julgamento do STF avalia a constitucionalidade do artigo 28 da lei 11.434, de 2006, a chamada Lei de Drogas. O artigo considera crime adquirir, guardar e transportar drogas para consumo pessoal, ainda que determine penas alternativas à prisão para essa conduta.

O Recurso Extraordinário 635659 teve como origem a prisão em flagrante de um homem que portava 3 gramas de maconha dentro do Centro de Detenção Provisória de Diadema, na Grande São Paulo.