A manicure Graziela Araújo, moradora do Residencial Vista Bela (zona norte de Londrina), é mãe solo. Ela diz que o caçula, o pequeno Noah, nasceu este ano, mas ela preferiu criar o bebê sozinha, porque sentia que a rotina com o ex-marido estava desgastante. Araújo integra o contingente de mães que enfrenta o desafio de criar os filhos de maneira independente, sem a ajuda do pai. E no caso dela são sete filhos.

Imagem ilustrativa da imagem Cartórios do Paraná têm maior porcentagem de mães solos desde 2018
| Foto: iStock

“Fui casada duas vezes. Com o primeiro marido eu tive três filhos e fiquei casada 12 anos, mas o peguei me traindo e me separei. Os quatro últimos filhos são do segundo casamento", conta. “Tem dias que penso que não vou conseguir. Faço as unhas e sobrancelha de hena, mas há dias que trabalho tanto que dói a minha coluna. Eu não posso deixar de trabalhar, porque senão há o risco de faltarem as coisas em casa”, ressaltou.

Um levantamento realizado pelos Cartórios de Registro Civil do Paraná apontou que nos quatro primeiros meses deste ano foram registradas 2.392 crianças somente com o nome materno, o maior percentual para o mesmo período desde 2018. Vale lembrar que, desde 2012, o reconhecimento de paternidade pode ser feito direto em cartório. Segundo Bruno Azzolin Medeiros, 1º Secretário do Irpen (Instituto do Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Paraná) e oficial de registro civil de pessoas naturais de Bandeirantes, na pandemia o portal, sendo uma ferramenta recente, conseguiu diversos dados.

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“A gente tem debatido no instituto e entre os colegas a razão dessa queda do número de pais que registram seus filhos e o aumento do número de mães solo. A conclusão é de que são basicamente duas naturezas. A primeira discute até onde o cenário pandêmico afetou a logística de comparecimento às serventias e até que ponto isso pode ter influenciado a própria presença dos pais nas serventias. A segunda é que durante o período da pandemia caíram muito as campanhas que informavam os casais sobre como se dá o estabelecimento da paternidade, tanto no momento do registo de nascimento como posteriormente e quando a criança não é registrada com o nome do pai, o pai vai até a serventia declarando-se, pai.”

Ele ressaltou que a importância dessas campanhas podem esclarecer qual a documentação necessária para que o pai figure como pai já no momento da declaração do registro, bem como posteriormente.

relevância

Os dados ganham ainda mais relevância quando se observa que 2022 registrou o menor número de nascimentos para o período, totalizando 48.311 recém-nascidos, ou seja, 4,9% do total de recém-nascidos no país tem apenas o nome da mãe em sua certidão de nascimento. Comparado ao mesmo período de 2018, quando nasceram 56.361 crianças e 2.371 delas foram registradas somente com o nome materno, o número de mães solos cresceram 21 registros, equivalendo a um aumento de 0,8%.

Os dados estão disponíveis no novo módulo do Portal da Transparência do Registro Civil, denominado Pais Ausentes, lançado no mês de março, e integra a plataforma nacional, administrada pela Arpen-Brasil (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais), que reúne as informações referentes aos nascimentos, casamentos e óbitos registrados nos 7.654 Cartórios de Registro Civil do Brasil, presentes em todos os municípios e distritos do país.

Na série histórica dos quatro primeiros meses do ano, o número de mães solos em 2022 esteve próximo aos verificados nos últimos anos, com exceção de 2019, quando foram registrados 2.553 recém-nascidos somente em nome da mãe no período, diante de um total de 55.793 nascimentos, mais de sete mil registros a mais do que o total de nascimentos deste ano. Já em 2020 foram 2.297 crianças registradas somente em nome da mãe, enquanto em 2021 este número totalizou 2.363 nascimentos.

CULTURA PATRIARCAL

Para a socióloga e professora da UEL (Universidade Estadual de Londrina), Silvana Mariano, “esses dados evidenciam mais uma vez certa cultura patriarcal na qual para a mulher a maternidade é obrigatória e para o homem a paternidade é um projeto”. “Assim, os homens sentem-se mais livres para escolher quando assumem, ou não, a paternidade. E isso, além de gerar vulnerabilidades para as mulheres, fere também o direito da criança”, destacou.

Sobre o menor número de nascimentos no período, para casais ou mulheres que puderam escolher, ela apontou que muitos tomaram a decisão de adiar a gravidez em decorrência da Covid-19.” A pandemia produziu efeitos diferenciados para homens e mulheres. As mulheres ficaram mais sobrecarregadas com os trabalhos de cuidados e mais vulneráveis economicamente, seja pela condição social de cuidadora de filhos e familiares, seja porque estão inseridas nos postos mais precários do mercado de trabalho, como o trabalho doméstico.” A socióloga reforçou que, direta ou indiretamente, os efeitos da pandemia podem tanto aumentar as probabilidades de uma mulher tornar-se mãe solo como intensificar suas obrigações na maternidade.

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