O governo do Paraná reconheceu o cavalo campeiro como de relevante interesse histórico e cultural para o Estado. O reconhecimento veio a partir da aprovação da Lei 21.856, em dezembro de 2023.

Com a aprovação da lei, o governo poderá promover ações e parcerias com instituições e organismos locais, regionais, nacionais e internacionais, a fim de viabilizar pesquisas, projetos e campanhas relativos ao cavalo campeiro.

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A lei cita ainda a criação de grupos de estudos, de trabalho, projetos de pesquisas científicas e de conservação genética para viabilizar e fomentar medidas que impulsionem a criação, a conservação, o fortalecimento e maior divulgação da raça.

“Essa lei é importantíssima para a preservação da espécie e o resgate histórico da raça. Acredito ser fundamental esse reconhecimento da criação e da conservação da espécie. Não podemos deixar a raça desaparecer, pois existem muito poucos exemplares”, destaca Eduardo Rogerio Cenci, presidente da Abraccc (Associação Brasileira dos Criadores de Cavalo Campeiro).

`UMA SEMENTE DO PARANISMO´

Criador pioneiro no Paraná e vice-presidente da Abraccc, o advogado Elizandro Pellin ressalta que se trata mais do que o simples reconhecimento da importância histórica e cultural de uma raça equina nativa do próprio estado. “Considero uma semente de paranismo, da busca por uma identidade cultural própria do nosso amado Estado do Paraná”, pontua.

Elizandro Pellin, é pioneiro na criação da raça e tem 30 exemplares do cavalo campeiro
Elizandro Pellin, é pioneiro na criação da raça e tem 30 exemplares do cavalo campeiro | Foto: Arquivo Pessoal

Não há informações de outras raças oficialmente originárias do Sul do Brasil que não seja o cavalo campeiro.

ORIGEM

A origem da raça surgiu devido ao extravio de animais por expedições espanholas que partiram do litoral de Santa Catarina até o Paraguai.

Os primeiros registros oficiais de cavalos selvagens nos planaltos de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e também no Sudoeste do Paraná são de 1728. A região era conhecida como Pinheirais do Brasil, por isso o cavalo campeiro também é chamado de "marchador das araucárias".

“Não posso afirmar se tem estados em que o cavalo campeiro ainda não está presente, pois a partir da venda do animal pelos criadores perdemos a rastreabilidade”, destaca o presidente da associação.

200 CRIADORES

De forma não oficial, a entidade contabiliza hoje cerca de 200 criadores da raça no Brasil. A maioria dos criatórios está no Sul do Brasil (50% em SC, 30% no RS e 15% no Paraná) e os outros 5% estão em outros estados.

Segundo a associação, o Paraná conta hoje com 10 criadores do cavalo campeiro. “A raça quase foi extinta e todavia não há uma oferta significativa de bons exemplares, embora o crescimento e a demanda estejam crescendo a olhos vistos”, acrescenta o vice-presidente da Abraccc.

CARACTERÍSTICAS

O cavalo campeiro conta com um andamento marchado, de tríplice apoio, de modo a causar mínimas oscilações verticais e laterais durante a movimentação, trazendo muito conforto ao equitador.

Com crina e cauda abundantes e pelos grossos, as alturas de cernelha variam entre 1,40 m e 1,50 m nas fêmeas e 1,42 m a 1,52 m nos machos, com pelagens variadas.

A espécie tem ainda como características a docilidade, a rusticidade e a versatilidade.

Eduardo Rogerio Cenci, presidente da Abraccc: "Não podemos deixar a raça desaparecer"
Eduardo Rogerio Cenci, presidente da Abraccc: "Não podemos deixar a raça desaparecer" | Foto: Arquivo Pessoal

“O campeiro é muito apreciado pela marcha confortável, ideal para cavalgadas em longos percursos, por sua funcionalidade no dia a dia nas lidas do campo e em esportes como os rodeios de laço. Sua rusticidade contribui ao homem do campo pela pouca manutenção. A raça adaptou-se bem aos grandes frios do sul do Brasil, bem como nas áreas pedregosas, onde seus cascos sofrem pouco desgaste”, detalha Eduardo Cenci.

A ASSOCIAÇÃO

A raça começou com 19 criadores, mas atualmente a Abraccc conta com 123 sócios registrados.

A associação tem como objetivo fomentar a raça e prestar serviços de registro de animais. Além disso, executa e acompanha a formação de técnicos, auxiliando os criadores na participação em exposições.

“A burocracia e exigências solicitadas pelo Estado dificultam a criação. Vejo que as vacinas de combate ao mormo e influenza poderiam ser disponibilizadas pelo Estado, ou subsidiadas. Assim continuaríamos com plantéis saudáveis, com custo menor ao criador, que poderia aumentar e vender com mais facilidade seus animais.”

PIONEIRISMO

O advogado Elizandro Pellin cria hoje cerca de 30 exemplares de cavalo campeiro em sua propriedade, a Passo da São José, localizada na barranca do Rio Santo Antônio, em Pranchita (PR), divisa com a Argentina.

“Essa raça se formou nas regiões das araucárias da região sul, notadamente sudoeste do Paraná, planalto catarinense e serra gaúcha. É, portanto, a única raça equina que se moldou também no Estado do Paraná.”

Embora o reconhecimento da raça junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento tenha ocorrido em 1985, graças ao trabalho de abnegados da cidade de Curitibanos (SC), esses animais de andamento marchado e com características do cavalo ibérico sempre estiverem presente na vida dos desbravadores do sudoeste paranaense.

O advogado ressalta que o seu nascimento tem ligação com o cavalo campeiro. “Na década de 1960, meu avô paterno criou um potro marchador de pelagem zaina e o entregou para ser domado ao meu futuro pai, que na ocasião conheceu minha mãe. Então creio não ser exagero atribuir ao `marchador das araucárias´ e elo que uniu meus pais e me gerou.”

CAMINHADAS LONGAS

Pellin relembra que, antes de saber da existência da associação de criadores e mesmo da denominação cavalo campeiro, começou a selecionar, em 2003, os exemplares remanescentes das barrancas do Rio Santo Antônio, que divide Brasil e Argentina. Hoje ele segue mantendo em sua criação a linhagem de sangue exclusiva daquela região.

“O campeiro, como a própria denominação esclarece, é para as lidas de campo. Entretanto, considerando seu andar marchado de extrema comodidade, aliado à mecanização das atividades rurais, acredito que sua maior aptidão atual seja para atividades de lazer, cavalgadas longas e confortáveis, promovendo o fortalecimento de laços familiares e amizades”, conclui.