Já morei em muitas casas, em pequenas e grandes cidades. Nos pequenos municípios a vida é tranquila, tudo é perto e as pessoas se conhecem, enquanto que nos maiores há muita agitação, trânsito e correria. Uma das vantagens da cidade grande é a existência de distritos, bairros e vilas, muitas vezes afastados do centro e que proporcionam boa qualidade de vida aos habitantes.

Moro em Londrina há mais de quarenta anos e sei como é agradável viver em bairros e vilas, devido à convivência entre os moradores e pelo fato de existirem pequenos comércios e vendedores de rua. Tradicionais nas cidades grandes, com o passar do tempo os ambulantes foram se afastando das regiões centrais, muitos viraram camelôs e outros se formalizaram como empreendedores. Acredito que esse mercado de rua ainda persiste porque as pessoas gostam de fazer compras perto de casa e manter contato com os comerciantes, a exemplo do que havia no tempo dos mascates e caixeiros-viajantes.

Os vendedores de rua trabalham duro, driblam diariamente as dificuldades, conhecem bem a cidade e andam sem parar indo de um bairro a outro. Usam a simpatia e criatividade para enfrentar a concorrência dos sacolões, feiras livres e supermercados. A maioria atua como itinerante, sem ponto fixo, mas alguns preferem se estabelecer em locais específicos onde a clientela se acostumou a encontrá-los.

Sabendo das necessidades dos consumidores, os vendedores de rua passam de casa em casa oferecendo uma infinidade de produtos e serviços. Um dos mais conhecido é o vendedor de pamonhas, que transita pelas ruas chamando a freguesia com o seu habitual “olha a pamonha”! Na mesma toada aparecem o homem que vende pães, o rapaz das verduras e legumes e o casal que comercializa queijos e ovos.

Cada um se vira como pode, utilizando veículos e carrinhos de todo tipo. Nos outros dias e em horários diferentes passa o carro do vendedor de peixes, outro que vende vassouras e a Kombi do consertador de panelas, guarda-chuvas e afiação de facas e tesouras. Dá a impressão que eles possuem uma rede de contatos para gerenciar os dias e horários dos trajetos, evitando passar no mesmo lugar onde outro comerciante está trabalhando.

Mas não tem nada disso, eles trabalham com muita intuição e atenção, se valendo de buzinas, apitos e outros sinais sonoros que cada um utiliza no seu negócio, evitando assim o acúmulo de negociantes no mesmo dia, local e horário. É maravilhoso poder ouvir de longe o inconfundível assobio do vendedor de picolés e o barulho das matracas dos vendedores de algodão doce, biju e cocada.

Gosto muito desse comércio de porta em porta, repleto de sons, aromas e cores, que ainda permite o fiado e débito em caderneta. O que mais me agrada, porém, é a originalidade dos vendedores na criação dos seus anúncios e bordões. Cada um com seu jeito e singularidade. Nunca esqueci da mensagem de um antigo vendedor de sonhos:

- “Atenção freguesia. É o carro dos sonhos que está passando. Sonhos ALFA. Sonhos de qualidade. Recheios de creme, chocolate e doce de leite. Não deixe passar essa oportunidade”.

Sei que a tecnologia e as mudanças de hábitos são irreversíveis, mas tomara que esse tipo de ambiente sobreviva por muito tempo. “Traga a bacia, Dona Maria”!

Gerson Antonio Melatti, leitor da FOLHA