Imagem ilustrativa da imagem DEDO DE PROSA| Muito prazer, milho!
| Foto: iStock/Folha Arte

Em um vídeo muito compartilhado no final do ano passado - já que ‘viralizou’ se tornou politicamente incorreto - uma blogueirinha faz a apresentação de um produto, encantada com seu invólucro. “Achei tão retrô esta embalagem que simula a capa do milho”. Uma voz a alerta: “É a capa do milho, mesmo”. E, espantada, ela retruca: “Nossa, e o Inmetro aprova isso?”. O produto nada mais era que uma simples pamonha.

Depois de uma enxurrada de comentários odiosos, a autora do vídeo explicou que se tratava de uma dublagem, dessas bem populares em redes sociais como o Tik Tok, de um vídeo original de humor. Fiquei curioso em saber o grau de afinidade entre os jovens digitais e a pamonha. Por pura curiosidade, fui até ao Yahoo Respostas e, eis que encontro a pergunta: “Como chama a capa verde que envolve o milho? E dos fiapos?”. A questão foi feita há dez anos.

icon-aspas “Achei tão retrô esta embalagem que simula a capa do milho”. disse a blogueira no unboxing da pamonha.

Além das respostas tradicionais, palha e cabelo, sempre tem os especialistas: “As palhas do milho são as bainhas foliares e os cabelos são os estilo-estigmas. Sabia que os estilo-estigmas quando polinizados geram um grão de milho? Ou seja: um estilo-estigma mais um pólen é igual a um grão de milho”. E sempre aparecem os engraçadinhos: “É só ir em um cartório e ver como o milho e a milha registraram o nome do dito cujo”.

Como diria um amigo, é realmente “um milho” a pessoa não saber o que é uma palha. Aliás, tanto “milho”, como “palha”, no meu tempo, eram usados como expressões depreciativas. Se uma coisa não prestava, era “palha”. Se o fulano fizesse alguma trapalhada: “Que milho!”. Nunca entendi muito bem essas analogias. Devem ter sido criadas por gente igual a meu amigo Lucas Aleixo, que nunca consegue esconder a cara de frustração ao ver os grãos amarelinhos no lanche depois de repetir três vezes sua frase mais famosa: “o meu é sem milho”.

A história conta que o milho tem origens mexicanas, mas já era cultivado da América do Norte à América do Sul quando os europeus chegaram ao Novo Mundo. Atualmente, o Brasil é o terceiro maior produtor do cereal, atrás apenas da China e dos Estados Unidos. O Paraná é o segundo estado com a maior área cultivada, sendo superado apenas pelo Mato Grosso.

Aqui, conhecemos sua espécie tradicional, de grãos amarelos. Mas nos nossos vizinhos andinos, principalmente no Peru e na Bolívia, a variedade das espigas impressiona. É milho de toda cor e de todo tamanho. De lá vem a chicha morada, uma espécie de refresco feito com milho roxo. A receita chegou a se popularizar em algumas casas noturnas badaladas dos grandes centros do país, dessas que atraem muitos daqueles que não sabem o que é palha.

Mas voltando à nossa roça, é impressionante a versatilidade do alimento. Bastam algumas espigas para a mesa se encher de pamonha, cural, bolo, broa, cuscuz, pipoca, farinha, além da própria espiga cozida ou assada, com sal e manteiga. Depois de tanta comilança, nem o sabugo era desprezado lá no sítio. Sempre aparecia o tiozão para fazer a piada do sabugo e suas três funções, mas isso é assunto para outra crônica.

Celso Felizardo é editor da FOLHA