Foram 33 anos dedicados ao magistério, como professora e diretora-auxiliar, em escolas estaduais e particulares.]

Era o início da minha carreira, 1972, Colégio Londrinense, curso noturno. Estava explicando a matéria, quando um aluno da frente, perguntou bem baixinho:

- Professora, o que a senhora vai fazer depois das aulas?

Não respondi e continuei a minha aula. E todas as noites era a mesma coisa, até que decidi conversar com o aluno. Levaria o caso para a orientação caso ele não parasse. Depois que tudo passou, rindo, pensei: “É, a faculdade não nos ensina a lidar com esse tipo de aluno...”

Em 1974, no “Evaristo da Veiga”, eu tinha um aluno na 5ª série, o Reinaldo, loirinho, cabelos caídos nos olhos, sempre com o nariz escorrendo, sentava no meio da sala, muito inteligente, mas não tinha muito capricho, seu caderno era amassado, cheio de “orelhinhas”, e ele vivia na minha mesa para eu verificar se estava tudo certo. Ficava ao meu lado e eu dizia: “Reinaldo, o lenço...” Ele tirava do bolso e limpava o nariz. Era final de ano e o Reinaldo começou a faltar. Perguntei aos colegas, ninguém sabia de nada. Falha nossa. Era 18 de novembro, desci para falar na orientação quando dois rapazes me pediram para falar com a diretora. Levei os dois e, na sala, disseram que eram os irmãos do Reinaldo. Moravam no sítio e no feriado, dia 15, o menino foi nadar no rio e morreu afogado. Uma tristeza para todos nós da escola.

Estava dando aula na escola do “João Paz”, no período noturno, quando um aluno entra na sala e fecha a porta com muita violência. Então eu lhe disse que deveria bater na porta, pedir licença, cumprimentar e depois poderia entrar. Ele falou gritando:

-Eu pedi. A senhora não escutou? Está surda?

A classe toda ficou em silêncio, esperando a minha reação. Gelei, não abri a boca e saí. Fui para a sala dos professores, fiquei andando, sem saber o que fazer, pensei: “Senhor, o que faço ?” Minutos depois, retornei. Ouvi o barulho de conversa na sala e quando entrei, todos se calaram. Decerto achavam que eu traria a orientadora, a diretora, mas não. Não comentei nada sobre o acontecido e continuei a minha aula. Passados uns dias, fui conversar com o aluno, chamei sua atenção. Pediu desculpas, sabia que tinha agido errado, mas que estava com muitos problemas em casa e no trabalho. Conversamos muito, mas ele nem chegou a terminar o ano, desistiu da escola.

A Natacha e eu fizemos o concurso de 1ª à 4ª série e fomos dar aulas no Rotary Clube de Ibiporã. Pegávamos o ônibus ali perto de um posto de gasolina, ao lado da Polícia Rodoviária. Certa vez, parou uma camionete e o homem perguntou se nós queríamos uma carona para Londrina. Agradecemos e não aceitamos. E todos os dias insistia, até que pegamos umas duas vezes. Disse que tinha um sítio em Ibiporã e todas as manhãs ia pra lá.

Resolvemos não pegar mais carona, saíamos da escola, ficávamos escondidas no posto; ele passava com a camionete, parava, olhava e nós vendo tudo. Aí quando desistia, a gente corria para não perder o ônibus. E logo o homem não apareceu mais. Em julho, a Natacha e eu resolvemos ir para Curitiba tentar a remoção. Conversamos com o Dr. Hosken; ele chamou sua assessora, disse que éramos professoras de Londrina e pra nos atender no que fosse possível. Consegui uma vaga no “Nilo Peçanha” e a Natacha, no “Barão do Rio Branco”. Ficamos felizes. O Dr. Hosken sempre foi um anjo em minha vida. E a Natacha hoje está com Deus.

Imagem ilustrativa da imagem DEDO DE PROSA: Flashes da vida de uma professora
| Foto: Marco Jacobsen

Sei que a vida é feita de opções, escolhas. Uns escolhem o caminho do bem, estudam, batalham, vencem; outros... Em 2022 completou 50 anos de quando iniciei minha carreira profissional. Fiz a escolha por vocação, procurei além de transmitir conhecimentos, passar valores, o amor a Deus e ao próximo. Sempre quis ser modelo e exemplo para os meus alunos, espero ter feito a diferença na vida de alguns. Agradeço a Deus por todo esse tempo.

Idiméia de Castro, leitora da FOLHA.