Folha de Londrina 73 anos

Desde a primeira edição que circulou no dia 13 de novembro de 1948, a Folha de Londrina estampa em suas páginas, sejam elas impressas ou digitais, histórias.

Histórias da vida, da política, da economia, das cidades, do Paraná. Histórias reais contadas por pessoas reais; a história do Brasil vivida por seu povo dia a dia, e a história do mundo. São 73 anos completos, 22.280 dias exercendo o papel de um diário no qual estão escritos Paraná e seu povo, cujas memórias podem ser acessadas e estudadas para compreender os dias de hoje com as histórias de um ontem. Nesse caderno especial de aniversário você vai conhecer algumas dessas páginas da qual você leitor é parte essencial.

Obrigado por nos deixar fazer parte da sua história.

Imagem ilustrativa da imagem Folha conta histórias da vida privada
| Foto: Arquivo Folha

Sabe aquele recorte de jornal na gaveta ?

Ele é um suvenir de uma memória marcada para sempre no coração das pessoas

Quando o casal Fortunato e Ana Baiana decidiu fugir a pé da seca no centro-sul da Bahia, em 1899, puderam contar com a esperteza do primogênito Fulgêncio Ferreira Neves que fez de tudo para encontrar um lugar seguro para a família toda e isso foi em Monte Santos de Minas. Mas ele queria mais. Foi para Ribeirão Preto para trabalhar nas lavouras de café e depois, para Itápolis, sempre no interior do estado de São Paulo, onde conheceu Benta, casou e teve doze filhos. Dono de um espírito empreendedor, ficou sabendo da criação da Cia. de Terras do Norte do Paraná e em 1932 chegou a Londrina, participando daquele momento mágico de fundação da cidade.

O pioneiro Fulgêncio Ferreira Neves acreditou e investiu no projeto de criação da Folha de Londrina, em 1948
O pioneiro Fulgêncio Ferreira Neves acreditou e investiu no projeto de criação da Folha de Londrina, em 1948 | Foto: Arquivo pessoal

Foi vereador em duas legislações e em uma delas, propôs a criação da Banda Municipal. “Cidade sem banda é como um jardim sem flor”, dizia. E assim, ele foi plantando flores e colhendo conquistas na terra vermelha. Em 1948, Fulgêncio Ferreira Neves ajudava a plantar mais uma semente. Juntamente com Aquiles Pimpão, Abdoral Araújo, Eufrosino Lázaro Santiago, João Milanez e Correia Neto fundaram a Folha de Londrina; jornal que há 73 anos conta aos seus leitores o cotidiano da cidade e as histórias das famílias. Como essa daqui uma parte da história da minha família: eu, jornalista e bisneta de Fulgêncio Ferreira Neves em uma reportagem para mostrar como as páginas da Folha, às vezes, se tornam folhas de um diário da vida privada.

ÁLBUM DE UMA FIGURINHA AMADA

No começo da década de 1980, a empresária Mônica Dias Bertolaci da Fonseca, começou a recortar as notícias que saiam no jornal sobre o então namorado, o jogador de futebol e ex-técnico do LEC, Roberto Fonseca. Desde criança, ela frequentava o Estádio do Café na companhia do tio Osvaldo Bento de Oliveira que levava toda a criançada para torcer para o Tubarão. Uma família de fanáticos pelo time, com o sangue azul nas veias. “Meu tio já saiu numa matéria uma vez! Fotografaram ele deitado sozinho na cativa, fingindo que dormia porque o jogo estava tão ruim, mas tão ruim...”, lembra. Apesar da familiaridade com o ambiente, namorar um jogador de futebol não estava nos planos, mas aconteceu. “Eu conheci o Roberto através de uma amiga que morava perto da República deles na rua Espírito Santo. Ele estava subindo para a categoria profissional e eu comecei a recortar e guardar tudo o que saia sobre ele no jornal”, diz. O primeiro recorte desse álbum é de 1983. Para não perder nem uma linha das matérias que registravam a evolução da carreira do querido, ela se tornou frequentadora assídua das bancas da cidade e as lembranças são um registro, em papel jornal, da carreira do hoje seu marido. “Tenho matérias de quando ele se tornou profissional, depois sobre a primeira atuação em um time grande, no São Paulo e foi nessa época que casamos”, conta. Ao longo de mais de três décadas de companhia, viajando com os dois filhos a cada desafio profissional do esportista, a família voltou a fixar residência em Londrina quando Fonseca voltou ao LEC para assumir a carreira de treinador.

O primeiro recorte desse álbum é de 1983. Para não perder nem uma linha das matérias que registravam a evolução da carreira do marido
O primeiro recorte desse álbum é de 1983. Para não perder nem uma linha das matérias que registravam a evolução da carreira do marido | Foto: Gustavo Carneiro

O álbum de um jogador só da empresária, é um tesouro de família e fica difícil escolher um recorte preferido. “A fase quando ele foi para o São Paulo F.C. foi muito bonita de acompanhar, acho que ir para um time grande é o sonho de todo jogador e ele estava realizando o seu. Outra fase marcante foi quando estava começando no Londrina e depois quando voltou para o LEC como treinador, com resultados muito bons”, afirma. Lembra do tio Osvaldo, que levava Mônica e os primos para o Estádio? Ele era o maior colaborador da Mônica na tarefa de recolher as reportagens sobre o sobrinho agregado. “Ele era apaixonado pelo Londrina e tudo o que saia no jornal, ele guardava. Ajudou bastante”, conta Monica. “A Folha acompanhou a vida da nossa família, de certa forma. Quando casamos, publicaram uma foto da cerimônia e também quando eu estava grávida do meu primeiro filho, apareci no Jornal”, recorda.

Na década de 1980, Mônica Fonseca criou um álbum de recortes de jornal da carreira do então namorado e companheiro de vida Roberto Fonseca
Na década de 1980, Mônica Fonseca criou um álbum de recortes de jornal da carreira do então namorado e companheiro de vida Roberto Fonseca | Foto: Gustavo Carneiro

Hoje, os links substituem os recortes e nessa fase como técnico, a família Fonseca também vai administrando as críticas com serenidade. “Quando sai alguma coisa negativa, conversamos, avaliamos e tentamos entender o que pode ser melhorado. A cobertura da carreira como jogador e como treinador é diferente. Se pudesse escolher uma fase do Roberto, para voltar a recortar as matérias, seria de quando ele era jogador. Quando somos jovens somos sonhadores, sempre com responsabilidade, mas parece tudo mais colorido. Hoje, com a maturidade vivemos outro momento que eu gosto muito também. É uma alegria quando ele está fazendo um bom campeonato. Amo o treinador de hoje assim como amo o jogador. São duas fases que aprendemos a viver com maturidade e tranquilidade”, completa.

JORNAL EM CASA DESDE 1959

Quando a Folha completou 70 anos, a professora Marcia Numata Ueda telefonou na Central do Assinante para tentar descobrir a data do contrato do pai, o agricultor Masaji Numata. Qual não foi a sua surpresa ao receber a informação que a família era dona de um dos contratos de assinatura mais antigos, recebendo a Folha em casa desde 1959. A informação rendeu uma homenagem na cerimônia da festa de aniversário do jornal, uma deferência da qual o senhor Masaji Numata nunca mais esqueceu. “Sempre mostrava as fotos e comentava da festa. Meus pais ficaram encantados com o carinho e a homenagem”, diz. Masaji Numata nasceu no Japão, casou com Mioko Numata, teve três filhos. Plantou café, soja, cana e durante toda a vida, manteve os costumes da terra onde nasceu. Colaborou com as associações japonesas, fundou o Londrina Golf Club e o Templo Budista na cidade. “Ele lia muito as reportagens de economia e a Folha Rural e também gostava de ver as páginas do Social. Na infância, eu acordava e meu pai já estava com o jornal em uma mão e uma xicara de café na outra. Foi assim até os seus últimos dias. E quando terminava de ler, deixava tudo arrumadinho” lembra. Masaji Numata faleceu no ano passado, aos 92 anos.

As edições da Folha acompanharam Marcia durante todas as fases da vida. O pai foi um dos primeiros assinantes do jornal, em 1959
As edições da Folha acompanharam Marcia durante todas as fases da vida. O pai foi um dos primeiros assinantes do jornal, em 1959 | Foto: Gustavo Carneiro

As edições da Folha acompanharam Marcia durante todas as fases da vida. “Usei muito os artigos para tarefas escolares. Lembro que a professora fazia uma tevê de caixa de papelão e nós alunos tínhamos que ler as reportagens. Eu recortava notícias para mim e para os meus colegas. Já na adolescência, gostava de acompanhar a programação dos cinemas e os resumos das novelas”, conta. Quando casou com o engenheiro Edson Massao Ueda, fez questão de ter uma assinatura para a nova casa. “Dei continuidade para que minha filha também gostasse de ler e acho que ajudou bastante nas seis aprovações de vestibulares”, diz. A professora revela que herdou dos pais alguns rituais. “Na portaria já sabem que no meu jornal, ninguém mexe. Tenho ciúmes, sim! Não gosto que tirem as paginas da ordem e devo admitir que, nesse sentido, o novo formato ajudou muito porque fica mais difícil de separar os cadernos”, comenta. Ela ainda diz que resiste ao formato digital: “Gosto do cheiro, da textura, parece que a notícia tem mais alma, valor. Às vezes leio o on-line, mas não é a mesma coisa que folhear uma edição de papel. É como lembrar dos meus pais”. Nos anos 90, ela mesma foi personagem de uma matéria na Folha, sobre a tradição japonesa dos origamis. “Falaram que era só uma nota sobre as dobraduras e saiu uma reportagem de uma página inteira! Foi assim que fiquei sabendo que a Folha chega longe porque um primo do Mato Grosso viu e me mandou os parabéns”, lembra Marcia.

UM TALENTO DESCOBERTO

O pedagogo e professor universitário Ricardo Desidério fez parte de um time de colunistas na seção Sexo e Comportamento do caderno cidades entre 2007 e 2008. Tudo começou por conta da sua intensa participação no espaço de cartas dos leitores, sempre contribuindo com textos de opinião sobre matérias publicadas no jornal sobre sexualidade. E aí veio o convite da Redação para ser colaborador fixo. “Eu já trabalhava com essa temática, com pesquisa e estudos. A Folha, de certa forma, me incentivou a escrever sobre o tema. Eu desconhecia esse meu lado”, conta. O primeiro livro de Desidério foi justamente uma coletânea dos textos publicados durante o período de colaboração com a Folha. “Até hoje as pessoas me reconhecem por conta dessas publicações”, diz.

Ele conta que na época era professor da educação básica e conseguia perceber que os colegas usavam os textos dentro das salas de aula. “Uma coisa que era fantástica é que a inspiração vinha dos meus próprios alunos que às vezes me perguntavam algo. Eu sabia que escrevendo sobre aquele tema iria ajudar, de alguma forma, outros jovens e até os pais com mais informação”, afirma. Em casa, Desidério diz que guarda todos os recortes das suas colunas, devidamente colados em folhas de papel sulfite e organizados por data. “Foi uma experiência incrível. Hoje eu continuo escrevendo na área de sexualidade e o meu trabalho profissional, principalmente em Londrina, foi impulsionado pela Folha. Fui ganhando espaço também por conta da minha trajetória acadêmica e acabei virando uma fonte para os jornalistas, aparecendo em programas de tevê da cidade e tudo mais”, comenta.

O professor universitário Ricardo Desidério descobriu o talento para a escrita ao ser convidado para ser colunista no jornal. “Escrever me fez mudar"
O professor universitário Ricardo Desidério descobriu o talento para a escrita ao ser convidado para ser colunista no jornal. “Escrever me fez mudar" | Foto: Arquivo pessoal

Desidério relata que desenvolveu várias atividades e contatos profissionais importantes por conta da visibilidade dos textos publicados na seção. No entanto, as demandas da vida profissional e acadêmica fez com que ele deixasse, por enquanto, as colaborações fixas de lado. “Às vezes eu ainda escrevo na seção de cartas”, confessa. “Se jogar meu nome no Google sempre aparece Folha de Londrina”, diz. “Eu sinto falta de um espaço como era aquele, abordando essa temática. Entendo que hoje mudou muito a configuração dos jornais. Foi um grande momento para a minha vida, eu estava indo para o mestrado e a Folha estava comigo”, completa. Atualmente, ele colabora com o Portal UOL. “Hoje, se escrevo e posso colaborar com outros veículos foi graças à Folha que me fez descobrir esse dom”, pontua.

A troca com os leitores também era algo que sempre agradava Desidério. “Uma vez, um rapaz que morava no Japão leu um artigo nos site sobre ginecomastia em adolescentes, dos efeitos disso na vida dos jovens e de como eles poderiam se sentir diante do problema. Me escreveu agradecendo porque o filho dele estava passando por isso e até então, não sabia o que era e o que poderia fazer para ajudá-lo”, revela. “Isso eu nunca esqueci. Me chamou a atenção pelo o quanto pode ser gratificante ajudar alguém. Foi uma experiência bem especifica, com um texto que chamou muita a atenção dos meus próprios alunos quando puderam ler sobre o assunto”, comenta.

Os assuntos que mais geravam repercussão, segundo Desidério, eram pautas sobre relacionamento e temáticas voltadas ao público masculino. “Acho que eles acabavam se identificando porque era um homem escrevendo sobre assuntos do universo masculino. No meu canal do YouTube, por exemplo, 80% do público é de homens. Hoje, talvez, uma seção assim seria uma ousadia maior, mas para a época, não existia críticas do tipo ‘nossa, o jornal está falando sobre sexo’, era tudo visto como informação, utilidade pública, sem polêmicas. Hoje, diante da situação, acho que um espaço assim não sobreviveria”, analisa. Quanto aos relacionamentos, eram as mulheres a engajarem. “Meu foco maior sempre foi trabalhar a questão da sexualidade da criança e adolescência. Acredito que as mães se identificassem muito, entendendo que estavam recebendo informação de como lidar com determinadas situações com os filhos”, completa. “Escrever me fez mudar, perceber como o meu próprio pensamento mudou. Valeu muito a pena”, afirma.

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