Fugindo de polêmicas, redações do último Enem focaram em temas sociais

Em sua última edição, pela primeira vez o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) possuiu três versões de redação. Na tradicional prova impressa, e também na versão digital e na reaplicação, aplicada um mês depois do primeiro exame, como uma alternativa aos candidatos que, por algum motivo, não fizeram a prova em janeiro.

E dentro de cada modelo de prova, um tema diferente. Na visão do professor Nilson Douglas Castilho, coordenado do ensino médio do Colégio Marista de Londrina, foram boas escolhas. "Nada do que fugisse do esperado para uma prova como o Enem, que é de apresentar problemas sociais".

O professor reforçou que por o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) ser um órgão ligado ao Ministério da Educação, temas polêmicos como a condução da pandemia do coronavírus no país não seria alvo da redação para não dar margem à possíveis críticas ao governo federal.

Na versão impressa, o tema foi "Estigma associado às doenças mentais". Para Castilho, foi um tema restrito e o foco ficou justamente na primeira palavra do tema, que representa um padrão, um comportamento, uma atitude. "Essa palavra muitas vezes carrega um peso negativo. A proposta era de apresentar ações para minimizar esses comportamento e não, por exemplo, argumentar sobre o atendimento ao paciente portador de alguma doença mental", explicou.

Para ele, a nova geração ainda pode carregar uma "herança" dos pré-conceitos que eram criados sobre a pessoa portadora de doença mental. "Tempos atrás, uma deficiência auditiva era associada à uma doença mental, por exemplo. E isso não é verdade. Então foi um tema que não estava em alta, mas que ao mesmo tempo não poderia ser ignorado. Para um jovem que quer se engajar na sociedade, valeu muito a pena ter falado sobre isso e derrubado esses estigmas", reforçou Castilho, dando ênfase na palavra-chave do tema.

Já para o tema da prova reaplicada, "Falta de empatia nas relações sociais no Brasil", o aluno deveria partir para a outra ponta da interpretação e fazer uma abordagem generalizada. "Empatia foi a palavra do ano, e o candidato teve que elencar as relações sociais mais importantes, pontuando sobre como essa falta de empatia poderia ser tratada, as motivações por trás disso, sem fazer nenhum recorte e limitar o tema", comentou o professor. Na proposta de intervenção, parte final da redação, Castilho indicou que o melhor caminho era de apresentar uma ação em conjunto e que trouxesse um benefício coletivo. "Fugindo de alternativas sem muita profundidade, como campanhas de conscientização. Algo diferente", justificou. "Foi preciso que o aluno tivesse uma habilidade de leitura desenvolvida".

Novidade da última edição, o Enem Digital trouxe como proposta que o aluno abordasse o "Desafio de reduzir as desigualdades entre as regiões brasileiras", em um país muito rico e diversificado culturalmente. Castilho foi perguntado se o tema foi um tipo de teste para a atual geração de jovens. "Acho que isso ficou nas entrelinhas da redação. Os professores perceberam pelo discurso usado na prova de qual é a percepção do jovem que mora no sul sobre a real situação do jovem que mora no nordeste, e vice-versa, tentando fazer com que eles pensem em que medida eles vão perpetuar ações que derrubem as barreiras criadas ao longo dos últimos anos, de preconceito principalmente contra a população que mora mais ao norte do país, da migração para grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro em busca de novas oportunidades de trabalho. Hoje, esse grupo tem mais condições de conhecer todas as realidades do Brasil graças à internet".

Por fim, o professor Nilson Douglas Castilho alertou que temas que envolvam única e exclusivamente o Brasil pode se tornar a tônica da redação do Enem: "Na última edição quiseram valorizar, acrescentando no tema algo relacionado ao nosso país. É um ponto para que os alunos fiquem atentos para as próximas edições, esse nacionalismo trazido pelo atual contexto político".

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