Durante a pandemia de covid-19, o escritor londrinense Domingos Pellegrini colocou em prática uma ideia que acalantava há muito tempo. A ideia de reescrever os contos de seus primeiros livros das décadas de 1970 e 1980.

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Com os contos reescritos Pellegrini está organizando uma tetralogia: “Reescrevendo e republicando, melhoro o que tinha de melhor em contos e descarto para o esquecimento o restante”.

O primeiro dos quatro volumes, “Tempo de Crescer”, acaba ser lançado pela editora Moderna e reúne seis histórias que retratam, simbolicamente, o momento do fim da infância e o começo da adolescência. Nas palavras de Pellegrini, o tempo mais florido da vida: “É nossa época mais marcante e mais lembrada, porque é quando acabamos de crescer para ser o que somos”.

A seguir Domingos Pellegrini fala sobre “Tempo de Crescer”.

As histórias de “Tempo de Crescer” narram situações simbólicas que marcam o fim da infância e o início da juventude. Por que você escolheu retratar esse marco de passagem?

Não escolho, contos e poemas são de geração instantânea, nunca pensei “vou escrever um conto sobre tal assunto”, as situações e personagens surgem na cabeça sem pedir licença, mas, no meu caso, repercutindo fatos marcantes da vida. Viajei de carro para a praia com os pais, como no conto “Nossa Estação de Mar”, depois eles se separaram como acontece com o menino em “Quadrondo”, e “Homem ao Mar” vem de quando com o filho Leônidas, ainda menino, enfrentamos juntos o velho mar. Os contos se passam, sim, no tempo mais importante e mais florido da nossa vida, quando se formam o corpo e o caráter enquanto florem vocações, dons e talentos. É nossa época mais marcante e mais lembrada, porque é quando acabamos de crescer para ser o que somos.

Os contos de “Tempo de Crescer” retratam meninos e meninas vivendo experiências marcantes dentro do ambiente familiar. O que a vivência familiar pode ensinar para meninos e meninas?

Desde a Antiguidade fracassaram todos os regimes que quiseram separar a família, com o Estado como tutor das crianças e adolescentes, como em Esparta ou na Alemanha nazista. A família é a fonte da sociedade e sua maior professora, e não é à toa que as melhores escolas públicas são as com associações de pais e mestres atuantes. Tive a graça de conviver com os avós, e deles guardo lembranças símbolos de seus modos de ser, que muito me inspiraram na vida e na literatura. Com eles vivi situações marcantes, como acontece com a menina do conto “Aprendendo a Pescar”, que vai pescar com o avô e tem de cuidar dele depois que é mordido por escorpião. A escola nos ensina a ser gente, o ser social, e a família nos ensina a ser humanos, o ser pessoal.

As histórias de “Tempo de Crescer” são ambientados em uma infância com referências de décadas atrás. Você considera que a experiência da infância presente nas histórias narradas continua a mesma de meninas e meninas dos dias atuais?

Não existem mais tílburis, entretanto continuam a ser lidas as histórias de Machado de Assis e José de Alencar cheias de tílburis, como “Os Três Mosqueteiros” que nos fascinam mesmo num mundo sem espadachins. Ao reescrever esses contos, a primeira intenção foi melhorar a linguagem, coerente com o desenvolvimento posterior de meu estilo, com mais simplicidade e mais graça, no melhor sentido da palavra. A segunda intenção foi melhorar a visão de mundo, que se mostra nas ações dos personagens, a assim aprimorei os roteiros com base nas minhas experiências de vida e na nossa cultura de cidadania. As ações e decisões que a vida pede aos personagens estão em todas as gerações desde sempre. E sabendo que houve um tempo em que telefonemas eram feitos por telefonista, o jovem de hoje pode valorizar mais seu celular.

Você vem desenvolvendo o trabalho de reescrever os contos de seus primeiros livros das décadas 1970 e 1980 e “Tempo de Crescer” representa o primeiro volume de uma tetralogia. Qual seu intenção nesse trabalho de reescritura?

A pandemia me deu tempo para fazer o que protelava há muito, selecionar o que escrevi de melhor em contos, e reescrever, pois em vários livros cometi o erro da publicação ansiosa e apressada. Assim tive livros até com contos que não deveriam ser incluídos, como o primeiro livro, “O Homem Vermelho”, que ganhou Prêmio Jabuti, mas eu não quis republicar sem reescrever, o que fui adiando por décadas, e, agora, selecionei só quatro de seus dez contos. Reescrevendo e republicando, melhoro o que tinha de melhor em contos, e descarto para o esquecimento o restante, como o processo cultural faz normalmente, em permanente desgaste e seleção das obras de arte, então só estou ajudando nisso.

“Tempo de Crescer” está sendo lançado em edição paradidática voltada ao leitor juvenil, mas originalmente alguns os contos foram publicados em edições voltadas ao leitor adulto. Quando você criou as histórias, décadas atrás, você imaginou que elas poderiam se transformar em literatura juvenil?

Minha linguagem, embora sempre procurando ser envolvente, é também simples e clara, de modo que os contos possam ser lidos por jovens e adultos indistintamente. Tanto que haverá uma edição integral, com o mesmo título e mais contos, para completar a tetralogia formada por “Do Barro à Luz”, contos com protagonistas homens, “Rodando a Saia”, com protagonistas mulheres, e “Tanto Coração”, com histórias de amor. A pandemia acabou e ainda estou reescrevendo contos, para deixar, como disse Manoel Bandeira, a casa em ordem. Como o tema profundo de toda minha literatura é cidadania, creio que estou investindo bem.

Imagem ilustrativa da imagem Pellegrini relança contos com histórias de descobertas
| Foto: Divulgação

Serviço:

“Tempo de Crescer – Histórias de Meninas e Meninos”

Autor – Domingos Pellegrini

Editora – Moderna

Páginas – 125

Quanto – R$ 47

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