Ninguém melhor do que um grupo de prisioneiros para mergulhar na peça “Esperando Godot”, do irlandês Samuel Becket, a obra literária definitiva sobre a espera. Foi exatamente por isso que o dramaturgo sueco Jan Jönson a escolheu para sua

experiência com atores não profissionais, condenados por crimes diversos na Suécia na década de 1980, para o deleite do próprio Beckett, que já no fim da vida acompanhou este processo criativo. É por isso que “Godot” funciona tão bem como teatro dentro do filme na comédia dramática francesa “A Noite do Triunfo”, adaptação livre desse caso real dirigida em 2020 por Emmanuel Courcol, ainda em exibição no Ouro Verde, na segunda (13) e na terça-feira (14). Não poderia haver aquecimento mais alto astral para o FILO - Festival Internacional de Londrina - que abre nesta quarta-feira (15).

História sobre a relatividade do sucesso e do fracasso, “Un Triomphe” surge como um filme coral, liderado pelo impecável ator franco-argelino Kad Merad. Ele consegue transmitir tanto a raiva criativa de seu personagem, suas frustrações de ator reduzidas a trabalhos paralelos (como dar aulas de dança Haka Maori…) e seus sonhos de sucesso, que ele tenta transferir para alunos amadores. Como na oficina de atores que ele leva para dentro da prisão. Esta história tragicômica profundamente humana consegue dar alma a cada um de seus personagens, ricos nas suas feridas, nas suas viagens interiores e o seu desejo de liberdade; mas à mercê, como todos, do desânimo, dos lampejos, dos impulsos coletivos e dos desafios individuais.

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Dentro de um lugar que limita a liberdade, aprender a brincar e interagir com os outros é aqui considerado como fonte de realização pessoal, dentro de uma instituição que anula personalidades. Dotado de diálogos mais reais que a vida, “A Noite do Triunfo” consegue surpreender pela jornada de cada um dos personagens (a história só

revela aos poucos as motivações de cada um), bem como pelo seu desfecho.

O diretor Emmanuel Courcol aposta todas suas fichas em sua trupe de atores extremamente talentosos, que dão vida e expectativas a um grupo de carismaticos prisioneiros – atores amadores interpretados por atores profissionais, o duplo desafio de torná-los críveis – como forma possível de reintegração artística ao representar a obra mais famosa do Prêmio Nobel Beckett.

Ao mesmo tempo a celebração do Teatro como imortal expressão de arte e uma celebração do humanismo, “A Noite do Triunfo” coloca a câmera para imprimir, com austeridade mas também com “joie de vivre”, a importância da espera.

(Confira programação de cinema no site da FOLHA)

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