O modernismo brasileiro teve participação ativa das mulheres: Anita Malfatti e Tarsila do Amaral são nomes de ponta do movimento, elas integraram o "grupo dos cinco", núcleo modernista, ao lado de Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Menotti Del Picchia, mas isso não é tudo.

Tarsila do Amaral, ícone feminino do movimento, não estava presente no evento que deflagrou o modernismo no Theatro Municipal de São Paulo, em 1922. Como é amplamente divulgado, ela estava em Paris na ocasião, estudando pintura, e através de Anita Malfatti, com quem trocava cartas, soube do "escândalo" que cercou a Semana de 22, e veio depois para integrar-se ao movimento.

Outras mulheres participaram do modernismo em momentos e lugares diferentes. Além de Anita e Tarsila - inseparáveis na vida e na arte para mostrar o Brasil de cara nova - a poeta, jornalista e ativista política Pagu (Patrícia Galvão), a cantora Elsie Houston, filha de um norte-americano e uma brasileira, e a jornalista e atriz Eugenia Álvaro Moreyra, entre outras, também precisam ser lembradas no "modernismo de saias".

Eugênia Álvaro Moreyra: considerada a primeira repórter brasileira, chamada de "reportisa"
Eugênia Álvaro Moreyra: considerada a primeira repórter brasileira, chamada de "reportisa" | Foto: Autor desconhecido/ Arquivo Nacional/ Domínio Público

A mineira Eugenia Álvaro Moreyra tem uma história interessante. Nascida em Juiz de Fora, em 1898, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1910, onde se tornaria a primeira repórter do País. A moça que teve uma família abastada, era neta do Barão de Pitangui e aos poucos viu sua família perder a fortuna, mas era autodidata, alfabetizada em português e francês por conta da leitura de jornais , livros e dicionários, e foi à luta.

Com esse perfil, se interessou pelo jornalismo, embora também tenha sido ligada ao teatro, saiu à procura de emprego e foi contratada pelo jornal carioca A Rua (1914 - 1927), não como cronista ou como ensaísta - o que era mais comum - mas como repórter. Até por isso, na época, foi criada a expressão "reportisa", por ter sido ela a primeira mulher a integrar a reportagem. Entre suas matérias, consta uma que ficou famosa, quando a jornalista foi morar num internato de moças para tentar entrevistar a irmã de uma mulher que tinha sido assassinada, num caso que ficou conhecido como "a tragédia da rua Dr. Januzzi."

Mas esse não seria um fato isolado para seu reconhecimento como mulher de vanguarda, amiga dos modernistas e de esquerda, ela chegou a ser presa por ser filiada ao PCB - Partido Comunista Brasileiro, fundado também em 1922.

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Outras mulheres, além de Anita Malfatti, participaram dos eventos da Semana de 22: as pintoras Regina Graz e Zina Aita. A pianista Guiomar Novaes foi convidada e também se apresentou no Municipal, mas não fazia parte do movimento e ainda era muito atrelada à música clássica.

Muita coisa precisa ser dita sobre as modenistas brasileiras, mulheres à frente de seu tempo inseridas num contexto conservador no qual, em muitos lugares, não era permitido que elas entrassem sozinhas. Mas algumas, como Eugênia Álvaro Moreyra, chegaram com vestidos mais curtos ou de terno e gravata, fumando cigarrilhas e com ideias que decerto espantaram nossas avós. Afinal, estamos falando dos anos 1920, início de um século que derrubou barreiras artísticas, culturais e de comportamento.

Na luta pela emancipação da arte, da mulher e pelo direito ao voto feminino, muitas devem ser lembradas como aquelas que desafiaram costumes. Há muito que avançar ainda, mas sem elas, eu mesma não seria uma "reportisa".

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