A entrega da Medalha Biblioteca Nacional – Ordem do Mérito do Livro ao deputado federal Daniel Silveira (PTB/RJ) realizada na última sexta-feira (1º) causou uma onda de repúdio em todo o país. Escritores, intelectuais e diversas entidades ligadas ao setor cultural se manifestaram contrárias à honraria concedida ao parlamentar bolsonarista. A diretoria da Academia Paranaense de Letras classificou o episódio como “um atentado contra a cultura nacional, àqueles que a produzem e a respeitam”.

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Em nota, a entidade paranaense destacou que "parece que não podemos esperar dos atuais governantes do país senão mais um gesto como este, de premeditado desprezo pela cultura brasileira e pelo povo brasileiro. Um ato proposital para ofender a história da nossa literatura, um escárnio a intelectuais e escritores homenageados com a mesma honraria em outros períodos de nosso país. Não há argumento que possa defender tamanha falta de respeito. Um absurdo que merece o nosso mais veemente repúdio”.

Integrante da Academia Paranaense de Letras, o jornalista e escritor Nilson Monteiro comentou em nome da entidade que a entrega da medalha a Silveira se assemelha ao ato de Calígola, terceiro imperador de Roma, que nomeou seu cavalo ao cargo de Senador. “Acho que até mesmo os bolsonaristas se sentiram envergonhados ao ver que uma medalha que já foi condedida a ninguém menos de Carlos Drummond de Andrade tenha sido entregue a um cara às voltas com a justiça”, declarou o autor que ocupa o cargo de 1º secretário da instituição.

Nilson Monteiro, escritor e membro da Academia Paranaense de Letras: "Uma medalha que já foi entregue a Carlos Drummond de Andrade foi concedida a uma cara às voltas com a justiça"
Nilson Monteiro, escritor e membro da Academia Paranaense de Letras: "Uma medalha que já foi entregue a Carlos Drummond de Andrade foi concedida a uma cara às voltas com a justiça" | Foto: Divulgação

Vários membros da Academia Brasileira de Letras (ABL) recusaram a medalha ao tomar conhecimento da entrega a Silveira, dentre eles o escritor, poeta e tradutor Marco Lucchesi, ex-presidente da entidade. A família de Carlos Drummond de Andrade também se manifestou publicamente afirmando que o poeta mineiro devolveria a condecoração.

Nesta semana, em um requerimento de informação protocolado na Câmara o deputado federal Marcelo Calero (PSD-RJ) cobrou oficialmente do governo uma explicação sobre o caso. O parlamentar carioca solicitou explicações sobre o que teria levado o Ministério da Cidadania, ao qual a Biblioteca Nacional está vinculada, a escolher o deputado que não tem nenhuma ligação com a literatura para receber a medalha concedida a escritores e intelectuais.

Marcelo Calero, deputado pelo PSD/ RJ, pediu explicações ao governo sobre o que teria levado o Ministério da Cidadania a dar a medalha a alguém sem nenhuma ligação com a literatura
Marcelo Calero, deputado pelo PSD/ RJ, pediu explicações ao governo sobre o que teria levado o Ministério da Cidadania a dar a medalha a alguém sem nenhuma ligação com a literatura | Foto: Paulo Sérgio/ Câmara dos Depuitados

A listagem com o nome dos 200 homenageados que receberão a medalha Honra do Mérito ao Livro em 2022 não foi divulgada antecipadamente pela diretoria da Biblioteca Nacional. A escolha dos medalhistas teria sido feita pelo presidente da instituição, Luiz Carlos Ramiro Júnior, e pelo secretário especial da Cultura, Hélio Ferraz de Oliveira. Em nota, a Associação dos Servidores da Biblioteca Nacional (ASBN) afirmou que durante a cerimônia de entrega da medalha a Silveira na última sexta-feira (1º), o prédio da Biblioteca Nacional foi fechado e que ficaram sabendo da condecoração ao deputado somente pela imprensa.

A ASBN criticou a presidência da instituição e afirmou que a homenagem foi entregue "a um político completamente desvinculado da causa do livro, da leitura e da cultura, e infame por seus seguidos ataques às instituições democráticas". Outras associações também repudiaram a homenagem, incluindo a Associação dos Servidores da Funarte (Asserte), a Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários, Cientistas da Informação e Instituições (Febab) e o Conselho Federal de Biblioteconomia (CFB).

Ex-policial militar, Daniel Silveira foi eleito para o cargo de deputado federal pelo Rio de Janeiro em 2018. O político ganhou projeção depois aparecer em um vídeo quebrando uma placa que homenageava Marielle Franco, vereadora assassinada em março de 2018. Após vários episódios em que proferiu agressões verbais a ministros do Supremo Tribunal Federal, o político foi condenado em abril deste ano a 8 anos e 9 meses de prisão por tentar impedir o livre exercício dos Poderes. No dia seguinte à condenação, o presidente da república perdoou a pena do parlamentar por meio de um indulto presidencial.

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