Exercitando uma estratégia visual ambiciosa e comentários políticos voláteis, “Athena” explode, mas depois se debilita um pouco. Suas imagens muitas vezes cativantes vão lentamente sendo desfeitas por ideias difusas e um ar impostado de auto-importância. Em seu terceiro longa-metragem, o cineasta francês Romain Gavras (filho do lendário grego Costa Gavras) ataca questões polêmicas em sua Paris natal, como brutalidade policial e desigualdade sistêmica, com a força contundente de um coquetel molotov – apenas uma das armas em ação neste thriller cativante e simultaneamene um tanto frustrante . Com muitas cenas deslumbrantemente coreografadas, filmadas em um unico take ou plano, as imagens se anunciam como um boletim urgente sobre os males sociais modernos, embora sua pirotecnia emocional seja menos persuasiva do que sua contrapartida técnica.

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“Athena” esteve em competição no recente Festival de Veneza, onde provocou alguma polêmica. O filme é uma espécie de drama de guerra urbana, e o público ficará impressionado com a habilidade que apresenta em suas sequências estendidas e frenéticas feitas em plano sequência. “Athena” é filme que não será visto nas salas, o que é uma pena, já que poderia ser transmitido em imagem amplificada via IMAX. Mas mesmo em tela bem menor (ele está sendo transmitido mundialmente pela Netflix), deve ser visto como cinema de ação reflexiva.

Quando a história começa, a tragédia atinge novamente a França: mais um jovem foi assassinado sem sentido pela polícia local. A cena de abertura estabelece a abordagem de “Athena”, bem como seu conflito central: o leal militar Abdel (Dali Benssalah), irmão da vítima Idir, está participando de uma entrevista coletiva, que é interrompida com violência por manifestantes liderados pelo irmão mais novo de Abdel, Karim (o estreante Sami Slimane) , desencadeando primeiro o tumulto e depois uma fuga vertiginosa de van por Karim e seus companheiros, tudo filmado em uma única tomada. A agitação logo transforma um conjunto habitacional fora da cidade (o Athena do título) em zona de guerra, colocando irmão contra irmão nas próximas horas angustiantes.

'Athena': filme é uma espécie de drama de guerra urbana
'Athena': filme é uma espécie de drama de guerra urbana | Foto: Netflix/ Divulgação

De “Birdman” a “1917”, houve exemplos recentes e memoráveis da estética one-take. E, à medida que o público se familiariza com a técnica que aqui se repete, há a tentação de se distrair tentando descobrir como foram feitas essas sequências vertiginosas. É justo reconhecer que “Athena” é abastecido com energia sem fôlego, e a partitura operística da trilha assinada pelo artista muiltimidia Surkin aumenta a sensação de Armageddon à medida que perseguições de carros e confrontos febris entre manifestantes e policiais se desenrolam com imprevisibilidade aparentemente caótica.

Gavras mostra controle firme sobre seu caos orquestrado, sobre a erupção de cores, sons e movimentos quase sempre impressionantes. Mas apesar de sua flexível habilidade cinematográfica, no entanto, “Athena” começa a perder força quando a corrida inicial dá lugar à narrativa real. Abdel está devastado com o assassinato do irmão, mas está determinado a seguir os protocolos legais para que os autores sejam levados à justiça – enquanto o mais feroz Karim simplesmente quer incendiar tudo. (Eles têm um terceiro irmão, um criminoso chamado Moktar, traficante de armas e drogas que está mais alinhado com a ação radical de Karim.)

O filme sugere uma possível reviravolta na história e se inclina para a confusa didática em sua exploração da melhor forma de enfrentar a desigualdade, e os irmãos se tornam porta-vozes de pontos de vista políticos conflitantes em vez de indivíduos com nuances. O filme funciona bem melhor como impetuoso e imersivo espetáculo de ação do que um thriller político instigante. Não há como questionar a seriedade de propósitos do diretor Gavras – nem a ansiedade apocalíptica de um cineasta que vê a França como um barril de pólvora pronto para explodir por causa de divisões raciais e de classe.

Mas como “Athena” é construido num moto contínuo de alta frequência, o filme tende a parecer caricatural, em vez de servir como um fervoroso alerta. Gavras se esforça para solidificar a provocação em seu final. Mas, por mais arrebatadora que “Athena” seja em sua ferocidade demolidora, é uma pena que seus temas subjacentes não sejam executados com a mesma perfeição.

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