A invasão da Ucrânia pelas tropas russas pode reverberar em breve na mesa do café da manhã dos brasileiros. Os dois países em guerra são grandes exportadores de trigo, responsáveis por 30% de todo o grão consumido no mundo, e com o conflito armado, há o risco do desabastecimento. A consequência da falta ou escassez do produto no mercado será a alta do preço dos itens de panificação, incluindo o pão francês, o campeão de vendas nas padarias do país.

Imagem ilustrativa da imagem Guerra no Leste Europeu pode elevar preço do pãozinho
| Foto: iStock

Desde o ano passado, o trigo no Brasil vem subindo acima da média inflacionária em razão da lei da oferta e da procura. Em 2021, a alta acumulada ficou perto dos 40%. Neste ano, com a guerra instalada em uma região que desempenha o papel de celeiro da Europa, os países que costumam importar trigo da Ucrânia terão de buscar outros mercados, como Canadá, Estados Unidos e Argentina, entrando na disputa por matéria prima com o Brasil e empurrando os preços para cima.

“A previsão que nós temos sobre essa guerra é que vai nos afetar muito. Estamos em uma situação bem delicada”, avaliou o presidente do Sipcep (Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria do Estado do Paraná), Vilson Felipe Borgmann. “O período do plantio do trigo no Leste Europeu vai começar e eles não sabem se vão plantar ou não. Nosso dilema é esse.”

Se a guerra entre Rússia e Ucrânia se estender, é certo que os reflexos na economia mundial terão um efeito cascata que começa na Bolsa de Chicago e termina no orçamento das donas de casa. No setor da panificação, que sofre com a queda no faturamento nos pequenos comércios de bairro desde o início da pandemia, em 2020, o cenário que se desenha é bastante preocupante.

Enquanto as grandes indústrias do setor elevaram seu faturamento em 35% durante a pandemia, a panificação no Paraná faturou 30% a menos no período. Para tentar segurar os clientes, os donos de padarias repassaram o mínimo possível do aumento dos seus custos aos consumidores. “Na pandemia, nossos clientes saíam de casa uma vez por semana para ir ao supermercado e passaram a comprar pães industrializados. Nessa brincadeira, a panificação no Paraná perdeu quase um terço do seu faturamento e não recuperou até hoje. Temos que fazer um trabalho muito forte para que os consumidores voltem a valorizar os pequenos comércios nos bairros.”

Borgmann lembra que além da alta no trigo, os empresários do setor viram disparar os preços de outros insumos, como margarina, óleo de soja e ovos, além dos custos com energia, que tiveram uma alta expressiva devido à escassez hídrica. “Nosso custo de produção está estrangulado. Na minha padaria, eu repassei 5% de alta em 2021 por causa da alta no preço da energia. A minha conta de luz que era de R$ 6 mil, ficou em R$ 9 mil. E não foi pelo aumento no consumo.”

O presidente do Sipcep destacou que os moinhos trabalham com estoque regulador, suficiente para garantir o abastecimento por um período de 30 a 60 dias. Quando ocorre uma alta repentina no preço da matéria prima, como agora, as compras ficam suspensas até que se consiga avaliar se o aumento é efeito de uma bolha ou se é algo real. “Se mantiver o patamar de alta, aí começam a escalonar a alta que vai vir para a gente e em 15 dias essa alta já começa a aparecer. Não repassam 100% para não gerar estrangulamento na indústria, mas os reajustes vão acontecer”, explicou Borgmann. “Aí, as padarias fazem toda a revisão da planilha de custo para saber se vai ter de fazer reajuste no preço dos produtos e de quanto vai ser o reajuste.”

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DEPENDÊNCIA

Um dos maiores importadores globais de trigo, o Brasil compra no mercado externo 60% de todo o grão consumido internamente, segundo dados da Abitrigo (Associação Brasileira das Indústrias de Trigo). Do total das importações brasileiras do cereal, 85% vêm da vizinha Argentina, mas qualquer impacto no mercado mundial produz reflexos no país e pressiona os preços para todos os compradores.

Os reflexos econômicos da guerra deflagrada no Leste Europeu foram imediatos no Ocidente. Desde o último dia 24, quando as tropas russas invadiram a Ucrânia, o trigo acumula altas diárias. No primeiro dia da guerra, o grão subiu 5,7% em relação à véspera, cotado a US$ 9,26 por bushel (27,2 quilos) na Bolsa de Chicago. E na última terça-feira (1), a alta chegou a 7,54% com o bushel negociado a US$ 9,98 nos contratos para maio, o maior valor registrado em 14 anos. Especialistas creditam o aumento ao temor de uma interrupção prolongada no fornecimento.

A Abitrigo projeta que os preços continuem em alta nos próximos quatro ou cinco meses. O presidente da entidade, Rubens Barbosa, afirma que a evolução dos preços dependerá da extensão da guerra. A Rússia é o primeiro exportador mundial e a Ucrânia, o quarto.

Além do aumento do trigo propriamente dito, outros fatores podem provocar a alta nas cotações em reais, como o dólar e a incerteza em relação aos fertilizantes, dos quais o Brasil é altamente dependente de importações. A Rússia está entre os maiores produtores de cloreto de potássio e outros produtos nitrogenados para fertilizantes.(Com Folhapress)

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