O governo do Paraná determinou na terça-feira (10) a retirada de mais de 60 mil produtos do setor de alimentos do regime de ST (Substituição Tributária), que implicava na antecipação do pagamento do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e era alvo de reclamações de agentes do setor produtivo. A medida entrará em vigor em 1º de novembro deste ano e visa restabelecer a competitividade de empresas paranaenses, já que Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo, entre outros, começam a implementar ou já concretizaram a mesma política.

 Expectativa do governo é que a medida, que atinge produtos como massas e bolachas, leve à redução de preços
Expectativa do governo é que a medida, que atinge produtos como massas e bolachas, leve à redução de preços | Foto: iStock

O decreto estadual atinge produtos como biscoitos, bolachas, massas, waffles, pizzas, azeites de oliva, margarinas, óleos refinados, frutas e vegetais congelados, conservas de produtos hortícolas, doces e geleias. Os vinhos também entraram na revisão para acompanhar a decisão de Rio Grande do Sul e Santa Catarina, e evitar a perda de competitividade frente aos vizinhos. O volume de operações abrangidas é de R$ 4,4 bilhões anuais e há estudos para ampliar a medida para outros itens, segundo a Sefa (Secretaria de Estado da Fazenda).

Na assinatura do decreto, no Palácio Iguaçu, o governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) afirmou que espera que a medida leve à redução de preços, aumento das vendas e consequente geração de empregos. Ainda, citou que o fim do pagamento antecipado do imposto implica em liberação do mesmo valor em capital de giro, que antes ficava preso até o momento em que a venda era efetivada. “Essa decisão vem atender o pequeno e microempresário, quem tem comércio, uma venda, um mercado de bairro. Agora, ele não vai ter de pagar o imposto antes de vender o seu produto”, disse.

Houve aumento significativo do número de artigos que passaram para o regime de ST nos últimos quatro anos, período em que o Estado se antecipou para tentar uma recuperação fiscal frente à crise econômica nacional que se desenhava. A proposta sempre foi criticada pelo setor produtivo e gerou inúmeras batalhas judiciais, como quando a Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina) obteve em maio de 2016 uma liminar que impedia a antecipação no pagamento do ICMS para venda de cerca de 280 produtos, que entraram na norma mediante decreto do governo estadual em janeiro do mesmo ano.

Com a revisão da ST, o superintendente de Governança da Casa Civil, Phelipe Mansur, afirmou que o governo busca reverter alterações que se mostraram pouco efetivas e de alto custo à sociedade. “A Substituição Tributária, quando foi instituída, onerou parte da cadeia produtiva. Um pedaço da cadeia produtiva pagava pelo resto da cadeia toda. A retirada é uma mudança na forma de calcular o imposto. O pagamento será fracionado, cada produto, comerciante ou distribuidor vai pagar somente a sua parte”, disse, em nota.

CAPITAL DE GIRO

Para o presidente da Fiep (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), Edson Campagnolo, a decisão do governo favorece as finanças das empresas. “A retirada torna a tributação mais justa, com base no efetivo valor agregado aos produtos, sem suposições imprecisas e que muitas vezes oneram também o consumidor. A substituição tributária era mais um dos fatores que vinha comprometendo a competitividade dos produtos paranaenses em relação a seus concorrentes de outros estados e, agora, vislumbramos um panorama melhor para o nosso setor produtivo.”

No regime de ST do ICMS é usada uma MVA (Margem de Valor Agregado) como base de cálculo do imposto. O problema é que esse valor nem sempre é obtido com a venda e gerava um tipo de tabelamento na cadeia, que dificultava a livre concorrência.

O diretor do Sescap (Sindicato das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações, Pesquisas e de Serviços Contábeis) de Londrina e Região, Júnior Mafra, explicou que a produção de bolachas industrializadas, por exemplo, trabalha com 33,47% de MVA. “Hoje ninguém consegue trabalhar com esse índice”, citou. Ele fez a ressalva de que somente teve acesso à notícia sobre a decisão, sem ter acesso ao decreto que será publicado nesta quarta-feira (11).

Mafra contou que o fim do uso da ST para bolachas implica em uma redução do custo de aquisição para o varejista de quase 11,00%, uma boa margem para que ele trabalhe o próprio lucro, ofereça produtos mais baratos e venda mais. Esse mesmo percentual também voltará à mão do comerciante como capital de giro. “Existia um desencaixe, porque se pagava o valor do imposto antecipadamente e, se demorasse seis meses para rodar o estoque, só recuperaria esse valor um semestre depois”, disse.

Outra questão é que a ST prejudicava as empresas menores, que se enquadram no Simples Nacional. O governo oferece isenção de ICMS para empreendedores com até R$ 360 mil ao ano, mas, pelo regime anterior, havia o pagamento do imposto na aquisição, explicou o diretor do Sescap.

Risco de sonegação

ainda será avaliado

Se gerava complicações para os empresários, a ST (Substituição Tributária) facilitava o trabalho da Receita Estadual na arrecadação de impostos, por reduzir o número de elos da cadeia produtiva que precisavam ser fiscalizados. Com a mudança, há risco maior de sonegação e a possibilidade de reduzir o valor que entra nos cofres públicos, o que a Sefa (Secretaria de Estado da Fazenda) pretende observar nos próximos meses.

Segundo a pasta, haverá maior necessidade de fiscalização. “Com as mudanças há algumas possíveis perdas com sonegação, inadimplência e produtos comercializados pelas empresas do Simples Nacional, entre outros. Poderá haver, também, um aumento do valor do imposto a pagar em determinados produtos e contribuintes, nos casos em que a base de cálculo que era utilizada para o cálculo do imposto devido por ST estar abaixo do valor efetivamente comercializado com o consumidor final”, informou, via nota.

Para o consultor econômico da Acil, Marcos Rambalducci, se os estados vizinhos tomaram a medida, o Paraná não podia ficar atrás. Porém, ele teme pelo risco de sonegação. “O Estado pode ter uma perda de arrecadação não somente pela sonegação, mas porque aumentará o custo para fiscalizar todos os players do mercado e abre a chance de alguém tentar ser mais competitivo ao não pagar os impostos”, disse.

O diretor do Sescap (Sindicato das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações, Pesquisas e de Serviços Contábeis) de Londrina e Região, Júnior Mafra, considerou que o Estado abre, assim, mão de uma situação “mais cômoda”. “A busca por competitividade impulsiona uma tendência a deixar o regime de Substituição Tributária, de olho no comércio eletrônico e na competição com outros estados”, disse, ao lembrar que empresas de eletrônicos e informática migraram ou abriram filiais em Santa Catarina nos últimos anos por questões como essa.

Mafra acredita que a decisão de abolir a ST primeiro sobre alimentos, que são produtos de primeira necessidade, servirá para agilizar a compreensão sobre eventuais perdas antes de estender a medida a outros setores. (F.G.)